Anulada ação de GCMs de Limeira que deixaram UBS para investigar suspeito de tráfico

Em julgamento na última sexta-feira (14/04), o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu ordem em habeas corpus, de ofício, para trancar ação penal contra um jovem detido por tráfico de drogas. Os desembargadores consideraram ilícita a atuação da Guarda Civil Municipal (GCM) por ter exercido atividade típica de outras polícias, entre elas ter deixado a vigilância de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) para investigar e prender o suspeito.

O caso aconteceu em 1º de novembro de 2022. Em primeira instância, o Ministério Público (MP) já tinha oferecido a denúncia pelo crime de tráfico. Em março, a Defensoria Pública obteve liminar, em HC, para soltar o acusado. A ação penal aguardava o recebimento por parte do juiz da 3ª Vara Criminal de Limeira, Rafael da Cruz Gouveia Linardi. Com a decisão do TJ, o processo será extinto.

O TJ tomou a decisão com base no relato dos próprios GCMs no boletim de ocorrência. Um deles afirmou que estava na UBS do Jd. Novo Horizonte quando pessoas o procuraram e alegaram que estavam cansados de denunciar o tráfico na região e o resultado não era o esperado. Naquele dia, véspera de feriado, foram passadas as características físicas do jovem que estaria traficando numa esquina do bairro.

Os GCMs decidiram ir até o local para averiguação e, simultaneamente, uma viatura da Polícia Civil, descaracterizada, também passava pelo local em sentido contrário. O jovem dispensou os entorpecentes no chão e entrou num bar, onde foi detido. As drogas dispensadas foram recolhidas pelo GCM antes da detenção. Na revista, os guardas encontraram R$ 150 e um celular. Segundo o guarda, o jovem teria confessado informalmente o tráfico, dizendo que vendia de 100 a 110 porções por dia, com ganho de R$ 400. À polícia, o jovem negou a acusação, mas acabou preso.

Partiram em investigação

Ao analisar o pedido da Defensoria, o relator do caso no TJ, Heitor Donizete de Oliveira, entendeu que os guardas municipais partiram em averiguação, abordagem e detiveram o jovem sem que a situação configurasse flagrante, circunstância que autorizaria a ação dos agentes.

“[Os GCMs] saíram da UBS em que estavam, ou seja, estavam cuidando do patrimônio público em averiguação em outro local, na busca de indivíduo suspeito da prática do tráfico de drogas, em verdadeiro trabalho de policiamento ostensivo e investigativo, em atuação típica da polícia militar e da polícia civil, diligenciaram, procuraram, perseguiram, abordaram, revistaram e indagaram o paciente, sem terem presenciado ou visualizado uma anterior atitude efetivamente suspeita do paciente, salvo melhor juízo”, apontou o magistrado.

Segundo o relator, a diligência correta da GCM seria comunicar a polícia responsável pela vigilância ostensiva para que realizasse a abordagem e consequente prisão, em caso da confirmação da suspeita. “Ora, se havia uma viatura da Polícia Civil passando pelo local, não seria óbvio chamá-los para efetuar ou auxiliar a diligência? Mas isso não foi feito, ao que parece”, complementou.

Na decisão que prevaleceu, o TJ cita que o policiamento ostensivo cabe à PM e a função investigativa, à Polícia Civil, enquanto os municípios podem criar a Guarda Civil para proteção de bens, serviços e instalações, conforme a previsão da Constituição Federal. “Os Guardas Municipais estavam em uma UBS [Unidade Básica de Saúde], certamente na função que lhes é cabida e legal, mas de lá saíram para ‘averiguar’, investigar um suposto delito […] Não havia prévia e visível situação de flagrante delito que permitisse a atuação da Guarda Civil Municipal, visto que não foi visualizado pelos Guardas o crime sendo cometido, tendo ocorrido diligências, averiguações, busca pessoal, perseguição e abordagem, assim como indagações ao paciente [acusado]”, diz.

Com a invalidação da prisão em flagrante, todas as provas e atos processuais decorrentes da abordagem ilícita da GCM também ficam invalidados. Com esse afastamento, o TJ determinou o trancamento da ação pela falta de justa causa na persecução penal.

A 3ª Vara Criminal de Limeira será comunicada nesta semana para que a ação penal seja interrompida. O MP pode recorrer contra a decisão nos tribunais superiores.

Foto: Pixabay

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