O teletrabalho pós reforma trabalhista e durante a pandemia

Por Jano Freire

A partir da vigência da Lei 13.467/2017, popularmente conhecida como “Reforma Trabalhista”, o trabalho preponderantemente fora das dependências da empresa e que não se enquadra como trabalho externo, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação, passou a ser regulamentado.

O teletrabalho deve necessariamente constar expressamente no contrato de trabalho, especificando as atividades que serão realizadas pelo empregado, podendo ser realizada a alteração do regime presencial para o teletrabalho, desde que haja mútuo acordo entre as partes e seja registrado aditivo contratual.

Esta modalidade de contrato de trabalho não está sujeita ao controle de jornada pelas empresas, razão pela qual se encontra nas exceções previstas no artigo 62 da CLT.

No aditivo ao contrato de trabalho, deverá constar inclusive as disposições relativas aos equipamentos tecnológicos, tais como a responsabilidade pela aquisição, manutenção, fornecimento, infraestrutura necessária e adequada para a prestação do trabalho e eventuais reembolsos de despesas.

Além disso, cabe ao empregador instruir o empregado de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho, principalmente os aspectos quanto à ergonomia, devendo a empresa providenciar um termo de responsabilidade para o empregado assinar.    

Caso tenha sido realizada a alteração do regime presencial para o teletrabalho, poderá ser realizada a alteração para o presencial por ato unilateral do empregador, devendo ser observado o prazo de transição mínimo de 15 dias, também com o devido aditivo contratual.

O home office (trabalho prestado em casa), é uma modalidade de teletrabalho, havendo outras modalidades, como o teletrabalho em telecentros, o teletrabalho nômade ou itinerante e o teletrabalho em equipes transacionais.

Neste ano, em razão da pandemia do Covid-19, o governo federal editou a Medida Provisória 927/2020, a qual trouxe medidas trabalhistas para o enfrentamento do coronavírus, dentre elas, a facilitação do teletrabalho, permitindo a alteração do regime presencial para o teletrabalho, independentemente de acordo individual ou coletivo, ficando a critério do empregador a alteração e o retorno ao regime presencial.

Para a alteração, bastaria o empregado ser notificado do regime remoto com no mínimo 48 horas de antecedência, por escrito ou por meio eletrônico, e poderia ser aplicada para empregados, aprendizes e estagiários.

Cabe ressaltar que a MP 927/2020 teve sua vigência encerrada em 19/07/2020, não sendo mais possível a partir de então, a utilização das normas de flexibilização do teletrabalho, devendo ser observados os dispositivos da CLT.

Passados 9 meses desde o início da pandemia, verifica-se que a maior parte das empresas adotou o home office, houve a necessidade de adaptação tanto para trabalhadores quanto empregadores, diante da nova modalidade de trabalho e de todas as dificuldades advindas, mas ao que parece, ambas as partes conseguiram se adaptar.

Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada pelo IBGE, mais de 8,7 milhões de pessoas ficaram em trabalho remoto no Brasil desde o início da pandemia, o que representa 13,3% das pessoas ocupadas, e diante das características do mercado de trabalho do país, possuímos potencial de teletrabalho em cerca de 22,7%, o que representa 20,8 milhões de pessoas.

O trabalho remoto trouxe vantagens para empregados e empregadores, dentre elas podemos citar: tempo (economia de tempo e gastos para deslocamento ao trabalho); flexibilidade de horários (em muitos casos o trabalhador pode definir sua rotina); conforto (empregado pode escolher o ambiente que vai trabalhar) e aumento de produtividade (maior concentração, eliminação de distrações e estresse do trânsito). A redução de custos com estrutura física, com benefícios (vale-transporte e auxílio-combustível) e a redução do absenteísmo, sem dúvidas são as principais vantagens para as empresas. 

Por outro lado, há algumas desvantagens, como a interrupção de familiares; a falta de socialização com os colegas de trabalho; a sobrecarga de trabalho em razão da falta de regras de teletrabalho bem definidas; o distanciamento das regras de saúde e segurança do trabalho / ergonomia (muitos empregados não possuem estrutura adequada em suas casas) e ainda, mais gastos para o empregado com energia elétrica, água, equipamentos tecnológicos, internet e infraestrutura.

A propósito, é bem polêmica a possibilidade do empregado assumir os custos com os equipamentos tecnológicos, com a manutenção e a infraestrutura necessária para o home office, sendo certo que a matéria vem sendo submetida ao Judiciário Trabalhista.

Recentemente a 8ª Turma do TRT da 04ª Região, manteve a condenação de primeira instância, a título de aluguel de notebook de determinada empresa que não forneceu equipamento telemático para o desempenho do teletrabalho, fazendo com que o trabalhador tivesse de utilizar o próprio notebook para o seu desempenho. Na sentença, o juiz fundamentou que o autor fez uso de seu notebook sem a devida contraprestação por parte da reclamada, não havendo dúvida de que a utilização do equipamento se mostrava indispensável à realização do trabalho, e com fulcro na vedação legal de repasse dos riscos do empreendimento ao empregado, fixou o aluguel no valor único de R$ 1.500,00, por quase três anos de uso do computador por parte do empregado em prol do empregador.

Cabe destacar trecho de um outro julgado, proferido pelo Ministro do TST, Maurício Godinho Delgado, no ano de 2010:

“Por outro lado, a possibilidade de indenização empresarial pelos gastos pessoais e residenciais efetivados pelo empregado no exercício de suas funções empregatícias no interior de seu home office supõe a precisa comprovação da existência de despesas adicionais realizadas em estrito benefício do cumprimento do contrato, não sendo bastante, em princípio, regra geral, a evidência de certa mistura, concorrência, concomitância e paralelismo entre atos, circunstâncias e despesas, uma vez que tais peculiaridades são inerentes e inevitáveis ao labor em domicílio e ao teletrabalho…”. Agravo de Instrumento desprovido (AIRR – 62141-19.2003.5.100011, Rel. Min. Maurício Godinho Delgado, 16/04/2010)

Desta forma, diante da regulamentação do teletrabalho pela CLT e do cenário de pandemia que não irá acabar tão cedo, podemos concluir que o trabalho remoto veio para ficar, havendo a tendência de um maior número de empregados trabalhando em casa em 2021, conforme previsão do IBGE, cabendo aos empregados, empregadores e operadores do direito, aguardar o posicionamento da Justiça do Trabalho quanto aos casos sub judice, principalmente quanto ao ônus dos custos com equipamentos tecnológicos, manutenção e infraestrutura, bem como das questões relacionadas à saúde e segurança no trabalho.


Jano Freire é advogado Trabalhista Empresarial, especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho e Gestão de Pessoas e Compliance Trabalhista. Também atua como professor nos cursos de Direito e Serviço Social do ISCA Faculdades e é membro do NJE – Núcleo dos Jovens Empreendedores da ACIL – Associação Comercial e Industrial de Limeira.

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