Banco terá de indenizar limeirense que caiu no “golpe do motoboy”, confirma TJ

O Banco do Brasil tentou se eximir da responsabilidade por uma cliente limeirense ter entregado seu cartão a um motoboy, que se apresentou como representante da instituição após contato telefônico que a ludibriou e ela caiu no que ficou conhecido como “golpe do motoboy”. Empréstimos e saques somaram prejuízo em 2020 de R$ 91.810,74. No ano passado, a Justiça de Limeira condenou o banco por falhas na prestação de serviço.

A instituição apelou ao Tribunal de Justiça (TJ). Pediu a reforma da sentença e a suspensão do feito, diante do determinado em incidente de resolução de demandas repetitivas, referente ao golpe do motoboy, em trâmite no Distrito Federal, o que foi rejeitado pela 22ª Câmara de Direito Privado do TJ, que julgou o recurso, porque não tem abrangência nacional.

O banco também alegou que as compras e empréstimos questionados foram realizados mediante uso de cartão com chip e aposição de senha, pessoal e intransferível. Também também citou precedentes e discorreu sobre o dever de guarda e sigilo de cartões e senhas, previsto contratualmente, e sobre a segurança do sistema bancário.

A limeirense foi defendida pelo advogado Renato Silva, do escritório Reginaldo Costa Advogados Associados.

Responsabilidade fora das dependências do banco

O relator do caso no TJ, o desembargador Edgar Rosa, expôs que o fato de a autora ter sido vítima de ilícito penal fora das dependências físicas da ré não pode afastar, de pronto, a responsabilidade pelos danos resultantes da fraude, “pois eventual violação do dever de segurança assumido em relação aos seus clientes também pode ser aferida à luz dos desdobramentos posteriores, lembrando-se, a respeito, o conteúdo da Súmula nº 479, do STJ, segundo o qual: ‘As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias'”.

Sob este viés, portanto, coube ao TJ definir se, diante das particularidades do caso concreto, concorreria responsabilidade à ré pelos 3 empréstimos impugnados realizados em nome da limeirense, além de 3 saques, pagamento de impostos e 3 transferências bancárias realizadas a partir do uso do cartão de titularidade dela mediante fraude.

O acórdão expõe que em casos como este, “há uma encenação premeditada, mui convincente, em que o consumidor é invariavelmente levado a acreditar que, de fato, está a receber contato telefônico oficial da instituição financeira/administradora do cartão, pois se depara com pessoa que, identificando-se como funcionário desta última, demonstra conhecer os dados pessoais, e sabe da existência do cartão, ou seja, revela informações protegidas por sigilo, vindo a entregar o cartão ao motoboy somente porque as circunstâncias fáticas descritas conferem inequívoca verossimilhança ao telefonema, aspecto fundamental para legitimar a confiança nas condutas supervenientes”.

Os criminosos demonstram deter conhecimento de dados sensíveis, que conforme o desmbargador, deveriam ser bem guardados pela instituição financeira. “É por isso que a vítima passa a a confiar que está a conversar com prepostos do banco, e assim, de boa-fé, é ludibriada”.

Lei Geral de Proteção de Dados

E cita a Lei Geral de Proteção de Dados, que entrou em vigor 3 dias antes dos fatos tratados nos autos, que visa a proteger os direitos fundamentais da liberdade e privacidade,
tutelados pelo art. 5º, X da Carta Magna, e expressamente consagra a responsabilidade civil pelo vazamento de banco de dados com valiosas informações a respeito dos clientes de instituições financeiras.

O TJ afastou a culpa da vítima, apontou a participação culposa (sem intenção) do banco, ao permitir o vazamento de dados críticos de sua cliente e, posteriormente, ao tomar contato com a natureza das operações realizadas, em expressivo valor e em abreviado intervalo de tempo, quando deveria então adotar as medidas necessárias para obstar as compras destoavam por completo do perfil de uso da autora.

Foram verificadas falhas bancárias que propiciaram o início do golpe, “pois o consumidor é enganado diante do conhecimento que os estelionatários demonstram possuir a respeito de dados sigilosos, e, depois, na consumação do crime, pois os mecanismos de segurança não foram capazes de detectar e evitar as operações realizadas”.

A apelação do banco foi contra sentença do juiz Marcelo Ielo Amaro, da 4ª Vara Cível de Limeira, que declarou nulos os débitos havidos nas contas bancárias da mulher e empréstimos realizados em nome dela, decorrentes das operações realizadas com seu cartão. Ele condenou também ao pagamento da quantia de R$ 47.086,20 a título de danos materiais, e à devolução do quanto descontado da conta e do benefício da autora a título dos três empréstimos mencionados na ação, e a pagar R$ 12 mil, a título de danos morais.

Foi dado parcial provimento à apelação com a revisão da condenação ao pagamento de indenização por danos morais, pois a instituição financeira, conforme o TJ, também foi vítima da ação de criminosos não identificados e a sua obrigação de reparar os danos materiais sofridos pela cliente decorrerá por força do risco da atividade.

O restante das sanções foi mantido.

Veja como a limeirense caiu no golpe do motoboy

As operações foram feitas em 2020, mediante uso fraudulento do seu cartão por terceiros, que, munidos de informações sigilosas, simularam ser representantes das instituições financeiras e, nessa condição, conseguiram obter as senhas e o plástico em si, causando prejuízo no valor de R$ 91.810,74.

Houve contato telefônico realizado por pessoa que se identificou representante do bando. A mulhre foi avisada sobre a ocorrência de suposta fraude detectada no uso do seu cartão. Mais tarde, um motoboy, indicado como representante da instituição financeira, compareceu à residência e recebeu o cartão de da autora para suposta análise, além das respectivas senhas após confirmação do código de validação anteriormente informado pelos próprios estelionatários.

A partir daí ocorreram as transações fraudulentas, assim como em outros tantos casos análogos, mediante crime que se tornou conhecido como “golpe do motoboy”.

Foto: Pixabay

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