MP do Teletrabalho: avanço e retrocesso?

por Ricardo Della Torre

Como o direito é uma ciência dinâmica já a algum tempo foi exigido dos legisladores novas formas trabalho, tendo a Lei 13.6498/2017 (reforma trabalhista), regulamentado o teletrabalho.

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT) o teletrabalho consubstancia-se na forma de trabalho realizada em lugar distante do escritório e/ou centro de produção, que permita a separação física e que implique o uso de uma nova tecnologia facilitadora de comunicação.

No mais, segundo preceituava o artigo 75-B da CLT, o teletrabalho era aquele realizado preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.

Neste contexto, começaram a surgir algumas críticas, pois o trabalho realizado a distância realizado com preponderância dentro da empresa, o que muitos chamavam de home office, careceu de regulamentação específica.

Existiu, assim, uma lacuna que somente foi preenchida com a publicação da MP 1108/2022 no dia 29.03.2022, que acabou regulamentando o teletrabalho realizado com preponderância nas dependências do empregador.

Neste aspecto a MP caminhou bem, suprindo lacuna deixado pelo legislador ao afirmar que para fins de teletrabalho pouco importa se a preponderância do trabalho se dá dentro ou fora da empresa, contanto que seja adotado um modelo híbrido e com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação.

Nessa mesma esteira de assertividade, a MP possibilitou o teletrabalho para aprendizes e estagiários, previu que trabalhadores com deficiência ou com filhos de até quatro anos passassem a ter prioridade para vagas de teletrabalho e consolidou entendimento sobre a competência territorial, determinando que sejam aplicadas as disposições previstas na legislação local e nas convenções e acordos coletivos de trabalho relativos à base do estabelecimento de lotação do empregado.

Mas como em terras tupiniquins nem tudo sai como o planejado, ousamos criticar a MP em alguns pontos que estão gerando muita polêmica desde a primeira leitura do seu texto.

O primeiro diz respeito a previsão do empregado em poder ser submetido ao regime de teletrabalho para prestar serviços por jornada, por produção ou tarefa, onde observamos que houve uma divisão dentro destas formas de prestação de serviços quanto a necessidade ou não de implantar controle de jornada.

Isto porque o teletrabalho por produção e por tarefa, foram excluídos do capítulo atinente a duração do trabalho, ou seja, nestas modalidades de prestação de serviços não será necessário ter controle de jornada pelo fato dos empregados não terem o direito de receber por eventuais horas extras realizadas.

Lado outro, no regime de teletrabalho por jornada, que é a forma mais utilizada pelas empresas e que leva em consideração para fins de cálculo o tempo de serviço em que o empregado está à disposição do empregador, será necessário a implantação de um controle de jornada pois os empregados terão o direito de receber pelas horas extras realizadas.

Como a contratação por jornada é a forma mais comum nas empresas, ao nosso ver, houve um engessamento, levando em consideração que um dos fatores mais benéficos do teletrabalho sempre foi a ausência de necessidade de estabelecer controle de jornada.

Na prática, isso poderá fazer com que algumas empresas tentem mascarar o trabalho por jornada em trabalhado por produção ou tarefa, para tentar fugir da implantação de um controle de jornada e consequentemente das horas extras.

Parece que neste aspecto a MP não trouxe a flexibilidade esperada a fim de facilitar para as empresas a colocação de empregados em regime de teletrabalho.

Outro ponto de crítica diz respeito a omissão por parte da MP em regulamentar o fornecimento de algum tipo de auxílio ou ajuda de custo ao empregado, o que era muito aguardado por ser um tema que gera muita dúvida e interpretações conflitantes.

Por fim, importante deixar a reflexão de que o tema teletrabalho deveria ter sido regulamentado por meio de lei e não por meio de medida provisória, uma vez que tivemos ao longo do governo atual uma série de medidas provisórias que não foram convertidas em lei, o que leva a uma grande insegurança jurídica.

O caminho correto a ser seguido ao nosso ver, seria discutir o tema no Congresso Nacional onde existem projetos de lei em andamento com textos mais complexos e técnicos do que o da MP.

Uma coisa é certa, os advogados militantes na área trabalhista já conseguem enxergar muito trabalho pela frente.

Ricardo Della Torre (ricardo@zalaflimeira.com.br) é advogado e coordenador trabalhista no escritório Cláudio Zalaf Advogados Associados

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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