Até quando uma mulher precisará morrer para a legislação ser levada a sério?

por Brenda Lombardi

A violência doméstica e familiar contra a mulher é título de discussão desde os primórdios, todavia os mecanismos para coibição são extremamente recentes, visto o aumento das denúncias e o tratamento enraizado perante a sociedade.

A importância do texto legal é debatida, assistida e publicada, quiçá muitas destas vezes somente são veiculados em discussões provenientes de casos concretos. Mas com sinceridade, tão somente quem vivencia o trabalho em uma delegacia de defesa da mulher, ou um profissional combativo na área e as vítimas desta violência saberão declinar com profundidade e precisão a importância que DEVERIA ser dada aos mecanismos dispostos na legislação.

Utilizo a palavra DEVERIA sim, infelizmente. Isto porque a realidade fática é, em muitos casos, desprezível. Mesmo após anos como estagiária em uma delegacia de defesa da mulher, seja atualmente advogando, ainda assim não sei declinar até que ponto será necessário para que as medidas tomem a proporção abrangida pela lei. Até que ponto um agressor poderá desrespeitar as medidas protetivas de urgência e, ainda assim, não ser considerado “perigoso” perante os operadores do direito? Ah, claro, até o ponto de uma vítima ou de várias vítimas tornarem-se meramente números, estatísticas. Quanto vale a vida de uma vítima de violência doméstica?

Quanto vale as sequelas causadas por essas violências? As vidas importam, pois são mães, filhas, irmãs, tias, avós, cunhadas. A lei fora criada e posteriormente sancionada para a aplicação e suas cautelares são deferidas para serem respeitadas e não engavetadas. Os mecanismos foram criados para além de combater, proteger nossas mulheres e, não esperar que o agressor tome medidas irreparáveis e irreversíveis. Os brados somente surtem efeitos quando a tragédia está instaurada. Se há espera, por que da legislação? Somente para mostrar que não há efetividade?

Todavia, a efetivada depende de decisões, testemunhas, provas e afins. O amparo e a proteção das mulheres deveriam vigorar e ser rigorosos, como a própria legislação prevê e não esperar que diariamente as vítimas tornem-se estatísticas e manchetes. O Código de Processo Penal é levado em consideração em todos os crimes do ordenamento jurídico, as prisões são efetivamente fundamentadas mediante as justificativas de perigo, fuga ou até mesmo conveniência da instrução criminal, mas nos casos previstos na legislação de amparo as mulheres sempre precisarão de algo mais, de comprovação maior, de perigo mais evidente.

Minha pergunta é, até quando uma mulher precisará morrer para a legislação ser levada a sério? Quantas medidas protetivas de urgência deverão ser descumpridas? Quantas ocorrências deverão ser registradas?

É lamentável você ficar de mãos atadas e não poder ajudar. A legislação nunca poderá ser materializada em uma pessoa que cumpra, sozinha, o que nela está previsto. Sempre precisará de interlocutores. O grito de socorro é, em muitos casos, as ligações ao 180, as denúncias, as chamadas ao policiamento, SAMU, corpo de bombeiros, mas, enquanto não houver unanimidade e a imposição das medidas mais gravosas previstas na legislação, a Lei Maria da Penha continuará, muitas vezes, sendo recordada após grandes tragédias, por falta de exacerbar a penalidade.

Brenda Lombardi é advogada criminalista

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