A partir de caso que envolve Limeira, Justiça determina que CADE considere impactos sociais em processos de fusão

O Ministério Público do Trabalho (MPT) obteve decisão judicial contra o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), autarquia federal responsável pela promoção da livre concorrência e defesa da ordem econômica em caso que envolve Limeira. Os desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15) deram provimento parcial aos pedidos do órgão ministerial, feitos em ação civil pública, determinando que o CADE fundamente suas decisões considerando o impacto social decorrente de fusões e aquisições empresariais.

A autarquia foi processada em 2014 pelo MPT em Araraquara, que investigou um caso de dispensa em massa de trabalhadores após a fusão das empresas Citrosuco e Citrovita em dezembro de 2011. Aprovada pelo CADE, a operação permitiu a criação da maior empresa de processamento de suco de laranja do mundo. Poucas semanas depois, as empresas envolvidas começaram a demitir em massa funcionários, principalmente nas cidades de Matão e Limeira, e a realizar o fechamento de fábricas.

Como apurou o procurador Rafael de Araújo Gomes, muitos trabalhadores da Citrovita (que deixou de existir) foram demitidos e recontratados pela Citrosuco, mas com redução salarial. Chamou a atenção que muitos dos trabalhadores possuíam vínculo com a empresa há muitos anos (10, 15, 20 ou mais anos de contrato), e exerciam atividades que demandam boa qualificação profissional (operadores de colheitadeira, operadores de sistema de irrigação, economista industrial, eletricista, etc.). Foram dispensados, portanto, trabalhadores qualificados e com larga experiência profissional no setor.

“O impacto social negativo de tais dispensas coletivas foi muito significativo, atingindo diretamente não apenas centenas de trabalhadores e, portanto, milhares de pessoas, com a inclusão dos seus familiares, como também todos os municípios envolvidos e a economia local, sensivelmente abalada pela súbita redução da atividade econômica”, explica o procurador.

Na instrução do inquérito, o CADE se negou a apresentar documentos requisitados pelo MPT, levando o órgão ministerial a ingressar com ação cautelar para obter as informações ligadas ao processo de fusão.

“A análise dos documentos revelou que o CADE não apenas tinha pleno conhecimento da intenção das empresas envolvidas em demitir em massa, como também desconsiderou por inteiro os impactos sociais lesivos relacionados ao desaparecimento em massa de empregos e fechamento de fábricas. Foi informado à autarquia que as duas concorrentes possuíam duas fábricas na mesma cidade. Era óbvio e muito evidente que, em caso de aprovação do ato de concentração, uma das fábricas localizadas em Matão seria fechada, pois não faria qualquer sentido, inclusive do ponto de vista econômico e logístico, a manutenção pela mesma empresa de duas fábricas que produzem idêntico produto na mesma cidade. Era também patente que poderia haver uma opção entre as fábricas de Limeira e Araras, distantes apenas 35 quilômetros uma da outra. Tais circunstâncias, entretanto, não mereceram qualquer comentário por parte do CADE em seu acórdão legitimador da fusão”, afirma Gomes.

O risco concreto de desaparecimento em massa de empregos foi especificamente alertado ao CADE pela Associação Brasileira de Citrocultores (Associtrus), em parecer da Secretaria de Acompanhamento Econômico, elaborado previamente ao julgamento. Embora o CADE tenha encaminhado ofícios com pedidos de informações a inúmeras empresas e entidades, nenhuma consulta foi feita a sindicatos de trabalhadores.

“Ou seja, o CADE não pontuou positivamente as demissões em massa previstas, reconhecendo-as como eficiências econômicas capazes de contribuir à aprovação da fusão, apenas por não estarem previstas para ocorrer já nos dois primeiros anos da fusão. Quer dizer, se Citrovita e Citrosuco tivessem anunciado a intenção de realizar imediatamente as demissões, o CADE teria reconhecido a economia e lucro assim obtido, travestido de ‘adicional eficiência econômica’, como um fator positivo a mais a recomendar a aprovação da fusão. Percebe-se que a postura do CADE diante do ato de concentração não é verdadeiramente a de completa desconsideração ao impacto social negativo provocado pela eliminação massiva de empregos, ou a de se omitir em reconhecer ou reputar merecedores de sua atenção os prejuízos coletivos aos trabalhadores e às comunidades envolvidas. Não, a postura é de franco encorajamento à obtenção de superiores ‘eficiências econômicas’ mediante reduções de custos proporcionadas pelas dispensas em massa”, finaliza o procurador.

O acórdão de relatoria da desembargadora Maria da Graça Bonança Barbosa também determina ao CADE que consulte os sindicatos de trabalhadores durante a instrução de casos de investigação de concentração econômica, solicitando informações às entidades. Por fim, a decisão impõe ao CADE a obrigação de sempre cumprir requisições de informações e documentos solicitadas pelo MPT. Cabe recurso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Foto: Divulgação/CADE

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