Veto a transexuais em equipe esportiva do sexo oposto em Limeira é inconstitucional, diz jurídico

Dois projetos apresentados pelo vereador Anderson Pereira (PSDB), ligados à pauta de costumes, enfrentam dificuldades para prosperar na Câmara Municipal. A propositura que quer estabelecer, em Limeira, o sexo biológico como o único critério para definição do gênero de competidores em eventos e disputas de modalidades esportivas e o projeto para vetar a utilização de verba pública em eventos e serviços que promovam a sexualidade de crianças e adolescentes, receberam pareceres pela inconstitucionalidade.

A propositura ligada ao esporte, na prática, quer proibir a atuação de transexuais em equipes que correspondam ao sexo oposto ao de nascimento. Na justificativa, o parlamentar aponta a participação de pessoas transexuais em equipes femininas. “Nos últimos dias tem sido público e notório que os transexuais estão buscando por vagas em equipes e times esportivos composto por membros de sexo biológico diverso. Tal situação vem se repetindo em diversas modalidades esportivas, em que pessoas do sexo biológico masculino, após cirurgias de redesignação sexual, alteração do nome social, implantes mamários, gluteoplastias de aumento, e ininterruptos tratamentos hormonais, passam a integrar equipes femininas. Pelo fato de terem nascido homens, o corpo foi moldado com auxílio do hormônio masculino testosterona. Já as mulheres atletas, não têm esse direito de uso do referido hormônio masculino para aumento de capacidade corporal, pois são monitoradas constantemente por exames antidoping”, menciona.

No último dia 6 de novembro, o procurador legislativo José Carlos Evangelista de Araújo apresentou o estudo jurídico à CCJ. Conforme o documento, a proposta de Anderson versa sobre direito desportivo e, sobre esta temática, a competência legislativa cabe à União e aos Estados. No caso, também não atende à competência suplementar dos municípios.

“A matéria referente à participação de mulheres trans em competições esportivas não tem como ser classificado como de interesse local – visto tratar-se de uma questão hoje discutida e normatizada em âmbito internacional, incidindo sobre a matéria disposições de importantes tratados internacionais – a maioria dos quais a República Federativa do Brasil faz parte. Por seu turno, o inciso IX, do art. 24, não faz referência ao direito desportivo, mas simplesmente ao desporto – sendo evidente que o que se apregoa ali aos entes federados é a autorização para o desenvolvimento de políticas públicas naqueles respectivos âmbitos”, explicou Evangelista.

Noutro trecho, o parecer aponta que o projeto “restringe, de modo substancial, direitos [especialmente no plano da igualdade e/ou isonomia] dos cidadãos que adotam uma identidade social fundamentada em uma identidade de gênero ou de orientação sexual, privando-lhes da possibilidade de atuarem de forma ativa e legítima em um aspecto especificamente tutelado da ordem jurídico-constitucional, pertinente ao lazer e ao desporto”.

Verba pública

O outro projeto de Anderson estabelece que os serviços públicos e os eventos patrocinados pelo poder público devem respeitar as normas que proíbem a divulgação ou acesso de crianças e adolescentes a apresentações de imagens, músicas ou textos pornográficos ou obscenos. O vereador elenca o alcance da proibição: qualquer material impresso ou digital, cartilha, folder, outdoor, produção cinematográfica, peça teatral, editais, chamadas públicas, prêmios, aquisição de bens e serviços vinculado ao setor cultural, manifestações culturais e atividades artísticas, espaços culturais, organizações culturais, entre outros.

O parecer jurídico, também assinado por Evangelista, vê problemas de inconstitucionalidade. Além de reconhecer que o tema não se adequa ao interesse local que poderia, em tese, dar competência ao Município para legislar de forma supletiva, o documento cita outros vícios. “Uma propositura que crie embaraços para que algum dos segmentos que tenham uma visão específica sobre a matéria [sexualidade de crianças e adolescentes], impedindo-os de receber qualquer modalidade de benefício ou incentivo do Poder Público pela interdição legal do debate e exposição sobre o respectivo tema é contrária ao pleno desenvolvimento da cidadania, com violação ao âmbito jurídico normativo regulado pelo inciso II [princípio da cidadania], do art. 1º, da CF/88”.

Na última semana, a vereadora Mariana Calsa (PL), relatora, apresentou pareceres pela rejeição das duas propostas em razão das institucionalidades apontadas pelo jurídico da Casa. A CCJ ainda vai deliberar sobre os pareceres da relatora.

Foto: Câmara Municipal de Limeira

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