Por João Geraldo Lopes Gonçalves
“Onde há grande propriedade, há grande desigualdade. Para um muito rico, há no mínimo quinhentos pobres, e a riqueza de poucos presume da indigência de muitos” (Adam Smith, filósofo e economista britânico)
Até o ano de 2016, poucas pessoas no Brasil conheciam de fato Michel Temer, o então vice-presidente da República na chapa de Dilma Rousseff. O descendente de libanês começou sua carreira na política ainda nos anos 70 como Procurador do Estado de São Paulo e, nos anos de 1983 e 1984, foi o Geral da Procuradoria indicado por Franco Montoro, primeiro governador eleito por voto direto desde 1964.
Vira secretário de Segurança Pública ainda com Montoro e nos anos 90 novamente com Fleury no Governo de São Paulo. Deputado federal várias vezes, assumiu a Presidência da Câmara dos Deputados por duas oportunidades. Em 2010 assume a Presidência do PMDB nacional e, com isto, é indicado a vice com Dilma nas eleições daquele ano.
O advogado, ex-docente do curso de direito da USP, sempre foi uma iminência parda na política. Sempre teve um papel de ficar nos bastidores, nunca na linha de frente nos embates que fazia. Mesmo na Presidência da Câmara ou do PMDB, sempre foi encarado como um grande articulador, moderado às vezes, conservador sempre, e pragmático por toda a vida.
Pragmático a ponto de tirar o PMDB da posição de fiel da balança e sem responsabilidade de assumir as broncas de um governo, para se aliar como se fossem amigos desde crianças com o PT e as esquerdas.
Michel Temer sai da condição de um completo desconhecido do grande público para a vice-presidência, mesmo que durante os seis anos de Governo Dilma sua participação tenha sido pífia. Agia ainda nos bastidores, garantindo os votos do governo no Congresso e segurando o ímpeto de cargos do sempre guloso PMDB, hoje MDB.
Mas Temer passa a ser temido quando Aécio Neves, derrotado nas urnas por Dilma Rousseff, levanta a poeira dizendo que o pleito teria sido fraudado. A tese do ex-governador de Minas, o playboy Aécio, não vingou, mas levantou outra das supostas pedaladas fiscais, que vai mobilizar de FHC a Gilmar Mendes, da FIESP e seu pato amarelo, a extrema direita, até então adormecida no Brasil desde o início da redemocratização.
E Michel? O que faz? Saía das catacumbas das articulações de quatro paredes, e começa a dizer se sentir desprivilegiado por Dilma e o PT, jogado para escanteio, submetido a segundo plano. E a partir daí, publicamente defende o impeachment da presidenta. Toma posse e em dois anos prepara o terreno para outros vampiros.
O desmonte do Estado de Bem-Estar Social
Com o impeachment de Dilma Rousseff, os 14 anos do PT e das esquerdas terminam e se inicia uma transição que nos custará caro nos próximos seis anos.
Termina em outubro de 2016, anos de manutenção da estabilidade da moeda, uma relativa, mas eficiente distribuição de renda nos tirando do mapa da fome, uma taxa de juros tolerável e apta a investimentos, e nenhuma interferência do Estado na economia. Nunca banqueiro e especulador de renda ganharam tanto dinheiro como nos 14 anos de PT no governo.
Exceto o último item citado por nós, o restante das conquistas, derivadas de um pacto das esquerdas com as elites e da popularidade de Lula, foi desfeito num passe de mágica, destruídas por Michel, Lava Jato e a imprensa corporativa (parte dela).
Os anos Temer, como já dissemos, serviu para uma transição onde a direita e o centro acreditavam que poderia alçá-los ao poder nas eleições de 2018. Tanto que o PSDB, pivô até então da polarização com as esquerdas, adere ao Temerismo que, por sua vez, puxa a extrema direita para seu colo, abrindo portas e comportas para pautas de costumes e a violência do Estado contra as populações mais pobres.
A intervenção militar nos morros cariocas que o dizem. Na outra ponta desta transição, estavam Sergio Moro e a República “Justicialista” de Curitiba, com o suposto combate a corrupção. As mídias corporativas agarram o time Moro e, como uma cruzada, enche seus noticiários com os feitos da Operação Lava Jato contra o “Petê”, aquele que “destruiu” o Brasil.
Enquanto isto, sem muito destaque ou passando até despercebido, Temer fazia a lição de casa que o mercado rentista e especulador esperava, bem como as elites milionárias do País. Sem esquecer do capital internacional, louco para botar as mãos em nossa economia.
Quatro medidas foram fundamentais para a transição de uma política distributiva e crescimento uniforme das classes trabalhadoras, para um retorno à concentração e à diminuição de direitos. Se houve uma diminuição das taxas de juros, deixou-se de incentivar a produção, reduzindo a zero financiamentos e políticas de fomento a industrialização.
O primeiro ponto é o cruel teto de gastos públicos. Michel Temer congela por vinte anos investimentos em especial na Educação e na Saúde, bem como reduz programas de renda como o Bolsa Família, o Minha Casa, Minha Vida e outros.
O segundo ponto, a tal Reforma do Ensino Médio, ou novo Ensino Médio, é a sequência da redução de gastos e de política de teto, bem como sucatear o ensino público, retirando opções e conhecimento da grade, em especial de ciências humanas e privilegiando o ensino técnico e de formação para o mercado rentista.
O terceiro ponto, a Reforma da Previdência, sonho antigo das elites financeiras e nada produtivas, começa com Temer, que tenta apresentar um texto que dificultaria em muito para se aposentar, bem como retiraria direitos e benefícios. No entanto, a pressão da sociedade naquele momento funcionou e houve um recuo, mesmo assim a principal medida da proposta de cálculo, a partir da idade mínima, foi aprovada.
O quarto ponto, outro sonho das elites e da FIESP do Pato, foi a Reforma Trabalhista. Ela privilegia o trabalho precarizado e terceirizado, retira direitos de carteira assinada e reduz o poder dos sindicatos nas negociações coletivas. Aqui Michel Temer dizia ser necessário, pois reduzia os compromissos do patrão com o custo da folha de pagamento e aumentaria a oferta de emprego.
Uma falácia, pois a taxa de desemprego aumentou em 13,1% em relação a 2016, quando o Vampirão, como foi apelidado, assumiu a Presidência. Estas medidas atravancaram a retomada da industrialização, beneficiando ainda mais a especulação. Michel Temer cumpria o processo de transição citado aqui.
No entanto, o pior viria com a vitória eleitoral de um ex-capitão do Exército. Mas este é assunto para o próximo capítulo.
Dica cultural
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A todas e a todos, um belíssimo carnaval.
João Geraldo Lopes Gonçalves, o Janjão, é escritor e consultor político e cultural.
Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar
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