Educação é liberdade de saberes

Por João Geraldo Lopes Gonçalves

“Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor” (Paulo Freire)

No último domingo, dia 19 de setembro, o professor, escritor e educador Paulo Freire estaria fazendo seu centenário se ainda estivesse conosco. As redes sociais foram ocupadas por textos, frases e homenagens justíssimas a uma das figuras mais importantes do século passado, bem como para a História do Brasil. Até o Google em seu status inicial colocou a foto do educador que correu o mundo.

Após o fatídico golpe de estado de 2016, os ataques ao educador que mora nos céus se intensificaram. Vindas de setores conservadores, fundamentalistas e fascistas, frases ofensivas como estas invadiram nossas timelines e contas de Whatsapp:

“Chega de doutrinação marxista. Basta de Paulo Freire”. “É preciso colocar Paulo Freire em seu devido lugar, que é o lixo da história”.

Graças aos deuses e deusas, Paulo Freire não está na lata do lixo da história e muito menos esquecido na memória popular. A comemoração iniciada no ultimo final de semana e que prossegue esta semana é exemplo disto.

Este escriba nunca conheceu pessoalmente o professor, mas o leu e foi contemporâneo de seus ensinamentos. 1990 foi o início de minha relação com Paulo Freire. Fui contratado para assessorar a diretoria do Sindicato dos Trabalhadores nas Industrias de Construção Civil e Mobiliário de Campinas e Região, uma categoria com mais de 50 mil trabalhadores em sua base territorial.

Aconselhado pelo educador popular Luís Carlos Scapi, do então Centro de Formação 13 de Maio, iniciei o trabalho naquele sindicato com duas atividades: observar e pesquisar. Assim percorri ao lado dos diretores, canteiros de obras e empresas do setor. Levantamos um diagnostico da categoria que serviu para que pudéssemos discutir ações a partir da realidade levantada.

A maioria dos trabalhadores eram migrantes ou, como chamávamos, de peão de trecho, que vinha de sua cidade de origem para trabalhar em uma obra. Terminou, voltava pra casa. A maior parte dos problemas da categoria, como falta de carteira assinada, acidentes e mortes no trabalho, não cumprimento da legislação trabalhista, tinha origem no grau de estudo dos trabalhadores.

Grande parte não sabia nem ler, nem escrever. Isto dificultava a vida das pessoas no trabalho. A exploração era enorme. Apresentamos à diretoria a proposta de criar um Programa de Alfabetização de Adultos. Fomos buscar conhecimento e informação com o Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA) da capital, São Paulo. Na época, o município estava sendo administrado pela prefeita Luiza Erundina e seu secretário de Educação era nada mais, nada menos, que o mestre Paulo Freire.

Em um convenio com o MOVA, desenvolvemos a escola em Campinas, onde os resultados foram espetaculares. O aumento da sindicalização e participação no sindicato foi uma das primeiras vitórias. A segunda, e talvez a mais importante, é que diversos trabalhadores, ao aprenderem a ler e a escrever, entenderam que precisavam lutar por seus direitos.

A primeira aula já mostrava a todos que a educação tem que ser inclusiva, plural e necessária para educar cidadãos que sejam sujeitos de sua história, e não objetos ou máquinas a serviço de um opressor. A partir da palavra-chave TIJOLO, os trabalhadores descobriam a origem daquele material, quem o construía e quem se beneficiava com o seu uso. Toda a história das pessoas é trabalhada a partir do ensino de como escrever a palavra.

Ao pensar no texto de hoje, minhas lembranças remeteram aqueles anos e me fazem crer do porquê endinheirados e setores bolsonaristas, por exemplo, detestam Paulo Freire. O cartunista Ziraldo sempre afirma que ler e escrever é sinônimo de mudança, revolução. Quem sabe mais, faz a luta, dizia uma frase popularizada nos cursos de formação politica dos anos 70 e 80 do século XX.

É isto que determinados setores, que apostam no atraso e dificultam ao máximo que podem o acesso dos pobres ao conhecimento, temem. Trabalhador organizado, jamais será explorado. Outra frase dita no seio dos movimentos populares. E para se organizar, é necessário buscar conhecimento.

Bolsonaro e seu ministro da Educação, com frases como “Universidade é para poucos”, “temos professores demais na rede”, demonstram que gostariam que o povo, em especial pobres, negros, mulheres, crianças deficientes e outros, vivam na ignorância. Pois assim é mais fácil acreditar que a Terra é plana e outras afirmações.

Mas a sociedade tem demonstrado nos últimos dias que Paulo Freire é mais importante que Bolsonaro e sua trupe de negativistas e fundamentalistas.

VIVA PAULO FREIRE.

João Geraldo Lopes Gonçalves é escritor e consultor político e cultural

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