Desmatamento em Limeira – Parte 2: Desafios

Por Thomaz Almeida
@almeidatcgeo

O objetivo em trazer dados inéditos sobre o desmatamento da Mata Atlântica em Limeira não é para apresentar um problema ao mesmo tempo em que eu ofereço uma solução para resolvê-lo, tal como fazem os governos, políticos do lobby (imobiliário, ruralista ou ambientalista) e grandes ONG’s. Os problemas ambientais parecem estar tão fora de nosso alcance que ficamos à deriva, perdidos entre opiniões e políticas concorrentes. O objetivo aqui é mais simples, mas não é fácil: propor uma outra perspectiva sobre o problema.

Sou e sempre fui conservador. Mas o que é ser conservador? Titus Burckhardt – filósofo das religiões e historiador da arte tradicional – explica (1): “Deixando de lado quaisquer matizes políticos que a palavra possa ter, o conservador é alguém que procura conservar. E para dizer se ele está certo ou errado deveria ser suficiente analisar o que é que ele quer conservar”. O conservador, seguindo o sentido etimológico da palavra, é alguém que tem um olhar de prudência na análise de inter-relações complexas, sejam elas na natureza ou na vida social humana.

A prudência traz algumas ferramentas úteis na avaliação de cenários: se uma determinada situação apresenta traços negativos, convém compará-la a outras situações possíveis, que podem ainda ser piores. Comparar cenários é um recurso comum no pensamento conservador. É necessário comparar cenários porque algumas coisas podem ficar ainda piores do que já são.

É importante ressaltar aqui que a modelagem de cenários é muito utilizada na análise de políticas públicas ambientais, tal como em projetos da iniciativa privada que tenham algum grau de impacto ambiental envolvido, pois busca ponderar sobre decisões que alterarão circunstâncias frequentemente abertas a consequências imprevistas. Curiosamente, mas não por acaso, nas análises de políticas públicas sociais – políticas voltadas para a oferta de bens e serviços básicos à população, compreendendo às áreas da educação, saúde, moradia, transporte, etc. – praticamente não há avaliação de cenários. Uma vez eu ouvi de um pequeno agricultor: “Já percebeu que sempre que o governo tenta resolver um problema ele cria vários outros que não existiam antes?”.

Sei bem que os ambientalistas olham para os conservadores com uma grande desconfiança – ignorando inclusive a conexão semântica entre o “conservadorismo” e a “conservação” que defendem – porque estão habituados a ver, não totalmente sem razão, o conservadorismo como uma ideologia da livre-iniciativa, e esta como um assalto aos recursos naturais do planeta, sem outra motivação a não ser o desenho de ganho imediato. Se o mercado é a causa dos problemas ambientais, a solução deve vir de outro lugar. O que os ambientalistas – comumente identificados como progressistas de esquerda – propõem? Normalmente são políticas centralizadoras, através de comando e controle pelo Estado. Mas será que funciona?

Política baseada no fracasso

Preciso retomar aqui uma questão do que já foi tratado anteriormente: nós temos mais de duas décadas de política ambiental em Limeira. Pelo menos cinco gestões do Executivo e Legislativo já passaram durante esse período. Quais são os resultados ambientais efetivos que foram alcançados? O desmatamento da Mata Atlântica parou? Não! Diminuiu? Também não! Os loteamentos clandestinos pararam? Não! Em breve serão mais de 450 condomínios urbanizados irregularmente em Limeira – Limeira é o município que possui a maior quantidade de loteamentos clandestinos da região. E a poluição pontual e difusa em corpos d’água na Zona de Proteção de Mananciais – ZPM, diminuiu? Eu não sei e acredito que ninguém saiba.

É interessante pensar aqui em algumas coisas: é por acaso que as áreas com maiores restrições legais de uso e ocupação do solo em Limeira são as áreas com os maiores problemas ambientais? É por acaso que na região em que o Estado tenta controlar as atividades econômicas é que surgem mais atividades econômicas ilegais? É por acaso que o município com as maiores restrições legais de uso e ocupação do solo é também o que possui um dos piores índices de Mata Atlântica e maior quantidade de loteamentos clandestinos?

Roger Scruton, filósofo conservador falecido há pouco mais de um ano, compreende que o equívoco não está exatamente na existência de Lei ou Estado, mas em “burocratas irresponsáveis” que fazem leis e procedimentos administrativos sem nenhuma capacidade de compreensão da realidade. Edmund Burke, outro grande pensador do conservadorismo, alerta sobre os delírios dos “teóricos de gabinete” que querem impor modificações na realidade a partir de utopias desconexas.
Segundo Scruton, conservadorismo e conservação ambiental são dois aspectos de uma única política de longo prazo (2). Mas como é isso?

O homem das 100 mil árvores

A proposta conservadora é de que as questões ambientais sejam enfrentadas por todos, na esfera das circunstâncias diárias, para que não sejam confiscadas pelo Estado. Afinal, se confiscadas pelo Estado nada garante uma solução, muito pelo contrário. A solução, então, será possível se as pessoas estiverem motivadas, e a tarefa do governo é justamente criar essas condições pelas quais a motivação adequada possa surgir e prosperar. Alô Prefeitura e Câmara dos Vereadores!

Scruton compreende que projetos que buscam soluções reais para os problemas ambientais precisam ser “enraizados no raciocínio prático de pequena escala. Somos nós que temos que agir, criar consenso e trabalhar em conjunto as decisões tomadas em nosso nome, fazendo o sacrifício necessário para o bem das futuras gerações” (3), pois a “nossa compreensão é moldada por necessidades locais, não por incertezas globais: o produto de emergências do dia a dia, uma sabedoria da sobrevivência” (4).

A condição fundamental para a viabilidade da proposta conservadora é o que Scruton chama de Oikophilia: o amor ao lar, amor ao lugar em que se vive. Na proposta conservadora, uma ‘natureza’ abstrata cede lugar para o mundo da vida (lebenswelt).

A Oikophilia “caracteriza-se como um chamado à responsabilidade, e reprova o cálculo. Exorta-nos a amar, em vez de usar; a respeitar, em vez de explorar. Convidamos a perceber o ‘doce lar’ da mesma maneira que percebemos as pessoas, não somente como meios, mas como fins” (5).

Em Limeira, de todas as iniciativas para a conservação e restauração florestal da Mata Atlântica, não há dúvidas de que a mais bem sucedida e de longo prazo é do Seu Waldomiro Ivers – famoso agricultor e ícone do ambientalismo limeirense. É necessário ressaltar aqui o principal: não foram as leis, nem projetos do Estado ou o dinheiro público que motivou um agricultor a plantar centenas de milhares de mudas de árvores em uma propriedade rural no Bairro do Pinhal com o objetivo de reflorestamento. O que motivou o Seu Waldomiro Ivers foi claramente um sentimento de Oikophilia, conforme suas próprias palavras: “O dom de cuidar e gostar ganhei da minha mãe, que me ensinou e incentivou a semear” (6).

Um outro elemento importante para compreender a proposta conservadora pela Oikophilia é a afirmação do belo. Apreciar a beleza de algo é dar-lhe valor pelo que é, e não pelo que faz ou pelos propósitos a que serve. O belo não é um valor instrumental. Para Scruton “o belo e o sagrado estão conectados e precisam ser juntamente resgatados do ímpeto de explorar e destruir” (7). É um tema que fica para um próximo artigo!

Thomaz Almeida é empresário e biólogo.



Referências:
1) BURCKHARDT, Titus. What is Conservatism? Sacred Web. Número 03. 1999.
2) SCRUTON, Roger. Filosofia Verde – Como Pensar Seriamente o Planeta. Página 14. 2016.
3) SCRUTON, Roger. Filosofia Verde – Como Pensar Seriamente o Planeta. Página 08. 2016.
4) SCRUTON, Roger. Filosofia Verde – Como Pensar Seriamente o Planeta. Página 277. 2016.
5) SCRUTON, Roger. Filosofia Verde – Como Pensar Seriamente o Planeta. Página 123. 2016.
6) Gazeta de Limeira, 15 de setembro de 2012.
7) SCRUTON, Roger. Filosofia Verde – Como Pensar Seriamente o Planeta. Página 226. 2016.

Parte 1 do Desmatamento em Limeira (veja aqui)

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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