Morte de Erick foi “revelada” em ritual com capa e uísque para invocação de entidade

Após a reviravolta na investigação da morte do adolescente Erick Delatore de Araújo, de 16 anos, ocorrida em janeiro deste ano, a Polícia Civil de Limeira realizou oitivas que revelaram mais detalhes sobre as horas seguintes ao crime. Um dos depoimentos narrou como a morte do adolescente teria sido “revelada” por meio de uma entidade espiritual supostamente incorporada pelo médium T.O.R., que está preso e é acusado de participar do homicídio. Contudo, segundo o Ministério Público, naquela altura, T. já sabia como tudo tinha acontecido.

No dia 9 de agosto, a mãe da namorada de Erick relatou à polícia que filha estava triste com a ausência do jovem. No domingo dia 22 de janeiro, com o objetivo de promover um encontro entre os dois, ela fez contato com a mãe de Erick, quando soube que ele havia sumido. Ela sabia que os adolescentes tinham trocado mensagens até a noite anterior e pediu para verificar a localização do celular do rapaz. O aplicativo indicou que ele estaria em uma fazenda, na zona rural de Limeira.

Ela foi até o local com a filha, mas nada acharam. Elas comunicaram a família de Erick sobre a indicação da localização do celular. A mulher também fez contato com S.S.C.J., outro acusado pelo homicídio, e mais dois rapazes, mas nenhuma informação foi obtida. Com os pais de Erick, elas retornaram à fazenda e, em seguida, decidiram ir até a casa de T..

Ali elas souberam que, na noite anterior, Erick estivera na residência, que é um local de prática religiosa e rituais que tem T. como o médium. Ela ouviu o relato de que Erick, que desejava parar de frequentar o espaço, foi orientado a ir até uma capela para acender vela e, depois, retornar para casa. T. afirmou que S. roubou uma faca da casa e foi atrás de Erick.

No início daquela tarde, mãe e filha voltaram à casa de T., quando encontraram S. na saída da fazenda, nervoso, com uma mochila nas costas. O jovem relatou que estava ali para fazer uma oferenda. A mulher ligou, então, para T., que pediu um favor: que ela comprasse uísque ou conhaque e cigarro e levasse até ele. Sua intenção era “baixar uma entidade” que lhe diria o que havia acontecido com Erick.

No caminho, ela fez a compra em um depósito e rumaram até a casa de T.. Segundo o relato, o médium acendeu um cigarro, colocou um chapéu e vestiu uma capa. Pediu para a namorada de Erick colocar o uísque em um copo para que ele fosse bebendo. A garota perguntou sobre o rapaz, quando a entidade, chamada “Mangueira”, teria dito, por meio de T.: “Erick está morto”. A menina perguntou: “Quem o matou?”. A resposta foi de que ela e a mãe haviam dado de cara com a pessoa responsável pela morte.

Após isso, a mulher, a filha, T. e o pai dele voltaram até a fazenda. Quem conduziu a comitiva foi T.. Durante as buscas, T. enviou mensagem para S. dizendo que já sabia do ocorrido. Ele teria pedido para que S. se entregasse. “Ou você vai para delegacia ou você se mata, entrega na mão da entidade que ela resolve”. Quando voltaram à casa de T., S. apareceu e confessou ter matado Erick. Em juízo, porém, S. mudou sua versão e disse que foi coagido por T. a assumir o crime. Foi a partir desta informação que T. foi investigado, preso e denunciado por envolvimento no crime.

O relatório final da Polícia Civil, entregue no final de agosto à Justiça, aponta que a narrativa de S. contradiz T.. Este relatou que, naquela noite, tinha ido dormir enquanto os rapazes jogavam cartas na casa. S., no entanto, relatou que todos foram juntos até a fazenda. Um dos rapazes que estava no grupo também apresentou versão divergente à de T., confirmando que todos tinham ido até a capela próxima à fazenda.

Como foi o crime

O Ministério Público (MP) de Limeira apontou que Erick foi assassinado em um ritual macabro como “sacrifício”. Inicialmente, apenas S.S.C.J., de 20 anos, havia sido denunciado, mas o caso teve reviravolta e o MP incluiu T.O.R. como autor do homicídio junto com S..

Erick, S. e mais um jovem eram frequentadores da casa espiritual. No início da noite de 21 de janeiro, enquanto os quatro jogavam cartas e bebiam na casa espiritual, Erick anunciou que deixaria de frequentar o local. T. o alertou de que ele poderia sair, mas que não se responsabilizaria pelo que acontecesse após a perda de proteção. Para isso, disse ao adolescente que ele deveria acender vela em local próprio, como um ritual de saída da religião.

Durante a noite, T. guardou instrumentos em sua mochila, inclusive facas, e chamou todos para acenderem vela. Os quatro saíram da casa, passaram por uma capela próxima e, ao chegarem na estrada de terra, um jovem que é testemunha no processo decidiu ficar perto de um portão, pois não se sentia bem. Nisso, S. ficou ali o acompanhando e depois seguiu em frente somente com T. e Erick.

Os dois atraíram o adolescente a um local deserto, sob o pretexto de que lá acenderiam a vela para lhe dar proteção quando saísse da religião. Foi T. que determinou a Erick que se ajoelhasse e iniciasse a oração.

“Já no sítio do evento, os denunciados com objeto(s) perfurocortante(s) e, em prática de um ritual macabro, desferiram 21 golpes contra a vítima de forma violenta, atingindo várias partes do corpo, inclusive coração e pulmão, bem como causando-lhe grande lesão no braço, sendo que os ferimentos causados pela agressão foram a causa de sua morte”, narrou a promotora na denúncia.

Em seguida, T. voltou pela estrada e, ao entrar na capela, dispensou a mochila que levava. Enquanto isso, S. retornou por outro caminho de T., que buscava se isentar de responsabilidade e imputava a ação ao colega. No dia seguinte, como Erick não retornava, a sogra do menino acionou o celular da filha para localizar o telefone da vítima. Chegaram ao local próximo à capela do Jd. Lagoa Nova. Em certo momento, encontraram S. nas proximidades com uma mochila. Ele estava nervoso e dizia que tinha ido acender velas.

Após insistência do médium, S. confessou à família de Erick e, posteriormente à Polícia Civil, que era o único autor do homicídio. Mas isso mudou ao longo do processo. As suspeitas ainda permaneciam sobre T e se evidenciaram a partir dos depoimentos das testemunhas na audiência realizada em 19 de julho. T. foi considerado o autor intelectual do crime e teve a prisão decretada pela Justiça.

A promotora pede que S. e T. sejam pronunciados, ou seja, submetidos a júri popular por homicídio triplamente qualificado. Como houve aditamento à denúncia original, o processo praticamente foi reiniciado e a defesa prévia de T. é aguardada para o prosseguimento.

Foto: Pixabay

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