Enquanto vivo: como enfrentar a morte anunciada

por Farid Zaine
@farid.cultura

Limeira foi incluída na lista de cidades que receberam o Festival Varilux de Cinema francês de 2021. Fui ver “Enquanto Vivo”, de Emmanuelle Bercot. Na sala, havia três pessoas. Talvez por causa da baixa procura pelo público, o Festival tenha sido encurtado na cidade. Uma pena. O Festival tem uma rica e diversificada programação, espelho fiel da alta produção cinematográfica da França. 

“Enquanto Vivo” conta a história de um professor de teatro, Benjamin (Benoît Magimel), precocemente condenado à morte por um câncer devastador. Ao receber o diagnóstico de um médico que lida o tempo todo com o meio de informar o paciente sobre sua situação, e a ajuda para superar a negação da morte e chegar a uma aceitação serena, Benjamin revê sua trajetória, na intenção de “limpar a mesa de sua vida”. Nessa dura tarefa de encarar a iminência da morte, ele vai aos poucos compreendendo a necessidade de perdoar a mãe , Crystal, dominadora (Catherine Deneuve), que o ama demais, perdoar a si mesmo e declarar seu amor a todos, incluindo o filho que nunca conheceu. 

“Enquanto Vivo” transcorre durante as quatro estações de um ano, período em que é mostrado o relacionamento do chefe da equipe médica, o Dr. Eddé (Gabriel Sara), seus médicos e enfermeiros, incluindo a enfermeira Eugénie (Cécile de France): eles aparecem,no início de cada estação,reunidos, cantando e conversando sobre a vida no hospital, sobre a convivência com pacientes terminais. 

Emmanuelle Bercot conduz seu filme com classe e elegância, nunca deixando que um tema tão delicado seja desviado para o dramalhão. Nada aqui é piegas, nem se conduz a emoções fáceis. Sim, o filme é triste, mas tem uma leveza compensadora. 

A morte é um tema recorrente no cinema, e incontáveis filmes tratam do assunto das mais diversas formas. A própria Cécile de France, que faz em “Enquanto Vivo” a enfermeira Eugénie, é a protagonista do ótimo drama de Clint Eastwood “Além da Vida”, com Matt Damon, em que o tema é a vida após a morte, através de relatos de casos de “quase-morte”. Outro filme extraordinário é o franco-canadense “As Invasões Bárbaras”, dirigido por Denys Arcand, sobre a história de Remy, também condenado por um câncer, e que deseja fazer uma partida pacífica rodeado de amigos e familiares. Original e instigante, “As Invasões Bárbaras” ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro (hoje chamado melhor filme internacional) em 2004.

Outro exemplar muito significativo sobre a relação com a morte é o belo e contundente “Mar Adentro”, em que um homem tetraplégico luta pelo direito de dar um fim à própria vida e encerrar um sofrimento insuportável. Javier Bardem é o protagonista desse filme espanhol de Alejandro Amenábar, vencedor do Oscar de melhor filme estrangeiro em 2005.

“Enquanto Vivo” , desde o seu recente lançamento, já está inserido entre os melhores filmes que trazem a morte como seu tema central. Tema incômodo, diga-se, mas que conduz a uma reflexão necessária sobre como cada um pode reagir diante da morte anunciada, uma vez que todos sabem que um dia vão morrer, mas não saber quando isso vai ocorrer é capaz de produzir uma falsa sensação de eternidade. 

ENQUANTO VIVO (De Son Vivant) – (França,2021) – Direção de Emmanuelle Bercot – Em exibição no Festival Varilux de Cinema Francês de 2021 – Breve nos cinemas.
Cotação: ****MUITO BOM

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