Empresas de portaria eletrônica e o exercício da livre iniciativa

por Sidnei José Nagalli Júnior

As constantes inovações tecnológicas tornaram-se fortes aliadas dos negócios além de, em maioria, serem criadas para facilitar e melhorar a vida em sociedade. Nada obstante, e nos causa estranheza, o legislador pátrio anela para a criação de projetos de leis descabidos.  

Vimos recentemente que o Órgão Legislativo de Limeira/SP colocou em pauta de votação o Projeto de Lei n. 111/2018 que visa proibir a implantação de centrais terceirizadas de monitoramento de acesso, as chamadas portarias virtuais, nos edifícios, condomínios e loteamentos fechados existentes no Município.

Malgrado a pretensão legislativa, as empresas de portaria eletrônica não podem ser obstadas de exercitar a livre iniciativa, com o desempenho desta atividade econômica, tal como os condomínios, loteamentos e edifícios devem ter a liberdade na contratação de seus prestadores de serviços.

Desta forma, entendemos que eventuais proibições impostas por projetos de leis nesse sentido afrontam o princípio basilar da promoção da atividade econômica, forte no direito à livre concorrência mencionado no art. 170, IV da Constituição Federal (CF), que, conforme ali previsto, se trata de “elemento fundamental para o democrático desenvolvimento da estrutura econômica”.

Do mesmo modo, tais proibições vão de encontro ao fundamento da República Federativa do Brasil dos valores sociais e da livre iniciativa, enraizado no art. 1º, IV da CF, dificultando o desenvolvimento de atividade lícita e regular, e limitando o campo de atuação de empresas que oferecem o serviço de portaria remota.

Se não bastasse o projeto de lei ser materialmente inconstitucional, pelo acima exposto, ao limitar a utilização do sistema de monitoramento virtual, a proposta legislativa cria uma norma restritiva de direito em relações civis privadas decorrentes de direitos materiais, tais como a autonomia da vontade e a propriedade privada, cuja pertinência temática afeta, desta forma, ao direito civil, usurpando, assim, a competência privativa da União para legislar.

Um ponto citado pelo projeto de lei é o de que a implementação da portaria virtual nos condomínios causa desempregos em massa. Assim dizendo, a proposta legislativa pretende legislar sobre o Direito do Trabalho, o que também se trata de competência privativa da União, sendo este um caso de inconstitucionalidade formal por vício de iniciativa.

O avanço tecnológico não pode, por si só, ser considerado como uma forma de aniquilar postos de trabalho. De fato, ele trará novas profissões e necessidades.

Outro ponto destacado pela proposta é que o funcionamento da portaria virtual gera menor segurança aos moradores. Em verdade, não há sistema isento de falhas, seja ele presencial ou virtual.

As empresas que prestam serviços de portaria remota, quando estruturadas, proveem a instalação de câmeras extras que auxiliam na visualização das áreas de acesso, contam com tecnologias de inteligência artificial para aprimorar ainda mais os controles de acesso, dentre outros pontos positivos.

Já no que tange às falhas de sistemas ou energia elétrica, é certo de que a maioria das empresas que oferecem o controle de acesso remoto utiliza equipamentos capazes de manter o sistema em funcionamento, tais como no-breaks, sistemas de redundância, rádio comunicação e links cabeados.

Acrescido a essas tecnologias, na maior parte dos casos, contam com equipes de atendimento presencial para situações em que seja necessário.    

Por outro lado, não raras vezes, devido à falta de supervisão e qualificação sobre o controle de acesso, presenciamos ou são divulgadas situações de casos de furtos e roubos a edifícios verticais que ocorrem com acesso pela portaria – estima-se 90% dos casos. De mais a mais, estudos indicam que 7 em cada 10 porteiros adormecem no turno da noite (https://glo.bo/37FBxwz).

Assim sendo, e dentre outras situações aqui não destacas, podemos concluir que podem existir falhas em ambas as formas de portarias e que, por si só, a presença de um porteiro nos edifícios e condomínios não tem o condão de reduzir ou impedir o número de ocorrências, sendo este mais um motivo para que os condomínios, loteamentos e edifícios possam ter a liberdade de escolha para qual sistema lhes aprouverem.

Por fim, além das razões fáticas expostas, entendemos que o mencionado projeto de lei está eivado de inconstitucionalidade formal e material.

Sidnei José Nagalli Júnior (@juniornagalli) é membro da Comissão de Fiscalização e Defesa do Exercício da Advocacia e da Comissão de Direito de Família da OAB Limeira/SP

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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