Afinal, a busca pessoal ou veicular pode ser feita sem critérios?

por Felipe Rissotti Balthazar

Quem nunca foi ou conhece alguém que já foi abordado? Creio que poucas ou nenhuma pessoa deve ter passado nesta vida sem ter sido abordado por policiais. Mas você já se perguntou se essa busca pessoal pode ser feita sem critérios objetivos ou se ela deve respeitar alguma regra? Bom, é isso que o texto busca esclarecer.

A busca pessoal ou veicular, sem mandado judicial, motivada apenas pela impressão subjetiva da polícia sobre a aparência ou atitude suspeita do indivíduo, é ILEGAL.

O art. 240, §2º, do Código de Processo Penal, é claro em estabelecer que “Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras “b” a “f” e letra “h” do parágrafo anterior”. Nesse mesmo sentido, o art. 244 do CPP, diz que “A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar”.

Em ambos os artigos, fica claro que só será possível a busca pessoal ou veicular, quando o agente público concluir, com base em elementos objetivos e concretos, a existência de fundada suspeita de que o indivíduo esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, e não “meros achismos” e/ou arbitrariedades por parte dos agentes públicos. Caso isso ocorra, tal conduta poderá ser considerada ilegal, podendo, inclusive, o agente público responder pelo crime de abuso de autoridade, devendo a conduta ser apurada conforme o caso concreto.

Recentemente, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, tratando sobre o assunto no RHC 158.580, decidiu que para a realização da busca pessoal, é necessário que a fundada suspeita seja descrita de modo objetivo e justificada por indícios de que o indivíduo esteja na posse de drogas, armas ou outros objetos ilícitos, evidenciando-se a urgência para a diligência/abordagem.

Significa diz que, mesmo nos casos de denúncia anônima, intuição policial ou na própria abordagem de rotina, as buscas não poderão ocorrer sem critérios, justificando-se somente quando existirem razões suficientes que possam ser concretamente apuradas e justificadas a partir de indícios concretos, tendo em vista tratar-se de uma atitude tão invasiva como a de parar e revistar alguém em via pública.

Para melhor compreender como seria isso na prática, podemos utilizar o próprio exemplo do caso julgado pela 6ª Turma do STJ, na qual deu provimento ao recurso em Habeas Corpus ajuizado para trancar a ação penal contra um homem que foi abordado pela polícia em Vitória da Conquista, no estado da Bahia, com a justificativa de que estava “em atitude suspeita”. No caso, o homem pilotava sua moto com uma mochila nas costas, momento em que foi abordado por uma guarnição da Polícia Militar, sendo flagrado com 50 porções de maconha e 72 de cocaína, além de uma balança digital. Neste caso, o indivíduo foi processado pelo crime de tráfico de drogas. Segundo a defesa do acusado, a justificativa dada pelos policiais militares para a abordagem foi genérica e insuficiente, ferindo os artigos 240, §2º e 244, do Código de Processo Penal.

Segundo o Relator do caso, o ministro Rogério Schietti, a “fundada suspeita e posse de determinados objetos”, devem ser utilizados em conjunto para justificar uma atitude tão severa na liberdade de locomoção e intimidade. Todas essas regras devem ser seguidas com rigor, pois, caso não sejam, a busca pessoal poderá ser convertida em salvo-conduto para que os agentes públicos façam buscas injustificadas e arbitrárias, utilizando somente os seus motivos pessoais como justificativa. O ministro ainda esclareceu que a fundada suspeita que autoriza a busca pessoal deve ser baseada em um juízo de probabilidade, descrita com a maior precisão possível, aferida de modo objetivo e devidamente justificada pelos indícios e pelas circunstâncias do caso concreto.

Sendo assim, a violação dessas regras deve resultar na ilicitude das provas colhidas, inclusive sem prejuízo de eventual responsabilização penal dos policiais que tenham praticado tais condutas.

Felipe Rissotti Balthazar (@rissotti.adv) é advogado criminalista.

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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