Vai mudar: gravação ambiental sem conhecimento das autoridades poderá ser usada como defesa

Com a derrubada de vetos do presidente Jair Bolsonaro pelo Congresso Nacional, pontos relacionados à captação ambiental (gravação) como meio de prova foram restabelecidos e vão constar na Lei 13.964/19, a chamada Lei Anticrime. Os termos genéricos, no entanto, devem ser levados à interpretação dos tribunais.

O projeto autorizava a instalação do equipamento de captação ambiental por meio de operação policial disfarçada ou no período noturno, exceto na casa do investigado. Para Bolsonaro, a redação esvaziaria o comando ao retirar a casa de seu alcance.

Os senadores seguiram a Câmara dos Deputados e restabeleceram o parágrafo 2º do art. 8º-A da Lei 9.296/96 (Lei de Interceptações), que ficou desta forma:

A instalação do dispositivo de captação ambiental poderá ser realizada, quando necessária, por meio de operação policial disfarçada ou no período noturno, exceto na casa, nos termos do inciso XI do caput do art. 5º da Constituição Federal”.

Bolsonaro também tinha vetado a medida que autorizava a utilização de gravação feita por um dos interlocutores, sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público, desde que usada em matéria de defesa e demonstrada a integridade da gravação.

Para o presidente, a medida limitaria o uso da prova apenas pela defesa. “Contraria o interesse público uma vez que uma prova não deve ser considerada lícita ou ilícita unicamente em razão da parte que beneficiará, sob pena de ofensa ao princípio da lealdade, da boa-fé objetiva e da cooperação entre os sujeitos processuais, além de se representar um retrocesso legislativo no combate ao crime”, disse.

O Congresso restabeleceu o parágrafo 4º do art. 8º-A da Lei 9.296/96 (Lei de Interceptações), que ficou desta forma:

A captação ambiental feita por um dos interlocutores sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público poderá ser utilizada, em matéria de defesa, quando demonstrada a integridade da gravação”.

A dúvida é a amplitude da expressão “matéria de defesa”. Procurador da República e professor, Vladimir Aras disse, em seu Twitter, que a expressão é dúbia, pois faz parecer que se tolera o uso da gravação só para a defesa do interlocutor em processo criminal. “Mas tal interpretação restritiva não se sustenta. Gravações ambientais têm inúmeros usos para quem as capta, para além do penal”, apontou.

Ele lembra que esse tipo de gravação serve como prova em ações de divórcio (agressões), ações de guarda (maus-tratos a filhos); ações trabalhistas (assédio moral); tutela de direitos humanos (violência estatal), proteção contra agentes públicos corruptos (achacadores e autores de concussão), entre outros.

“Logo, a gravação pode ser usada também em matéria de defesa dos direitos das vítimas de crimes, desde que não seja produto de atividade probatória orientada pelo MP ou pela Polícia. Esta me parece a única interpretação que compatibiliza o dispositivo com a CF [Constituição Federal] e mantém sua integridade”.

O restabelecimento do trecho original da Lei Anticrime depende de promulgação presidencial.

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Foto: AMDEPOL/SINDEPO

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