Limeirenses compram terreno juntas e, 20 anos depois, uma processa a outra por cômodo irregular nos fundos

O juiz da 5ª Vara Cível de Limeira, Flávio Dassi Vianna, sentenciou um caso na semana passada que envolve construção irregular de um cômodo nos fundos de uma das mulheres que compraram um terreno juntas, há quase 20 anos.

A área adquirida é de 250 metros quadrados. A compra foi em 1994, na região Sul de Limeira. Foi feita a divisão igualitária e cada uma construiu uma residência.

Em 2020, a autora da ação tomou a iniciativa de regularizar a situação do imóvel. No entanto, ao iniciar o processo de regularização, para aprovação do desdobro (divisão de terreno de forma regularizada) junto à Secretaria de Urbanismo da Prefeitura de Limeira, foi constatada pelo fiscal vistoriador a existência de uma construção irregular na residência da outra mulher, sobre a faixa não edificante, o que é irregular.

A autora da ação, então, procurou a dona do imóvel com irregularidades para tentar resolver amigavelmente a situação, mas ela não se manifestou para a regularização. Por este motivo, buscou o Poder Judiciário. Ela pediu tutela de urgência para imediata demolição da construção irregular feita sobre faixa não edificante do imóvel, em desacordo com a legislação municipal.

O pedido de tutela de urgência foi indeferido e a proprietária do imóvel irregular contestou. Ela pediu o reconhecimento da ocorrência da prescrição decenal. Ela disse que construiu o cômodo nos fundos de sua casa de boa-fé e com muito sacrifício. De acordo com ela, o cômodo não oferece nenhum tipo de risco ou dano para o imóvel da autora.

A mulher afirmou, também, que o laudo trazido aos autos está defasado, sem conclusão lógica, e não deve ser considerado como documento hábil a instruir o processo. Ela pediu a extinção pela prescrição e, do contrário, a nomeação de perito para análise da questão, que foi o que aconteceu.

O entendimento do juiz

Com mais manifestações das partes e laudo pericial juntado com esclarecimentos, o juiz sentenciou no último dia 1º. Para ele, a pretensão inicial está prescrita, embora não exista prazo prescricional específico para o pedido demolitório, mas foi aplicado o prazo geral decenal estabelecido no artigo 205 do Código Civil.

A construção que a autora pretende ver demolida, na verdade somente a parte da edificação construída em área não edificável, foi erguida há mais de 16 anos, como aponta laudo. “[…] não resta dúvida de que a construção irregular existe há mais de 10 anos, o que já se mostra suficiente para reconhecer o decurso do prazo prescricional. Nem se diga que as partes somente tiveram conhecimento da irregularidade da construção mais recentemente, pois no projeto de construção aprovado no ano de 1993 já havia registro da faixa não edificante nos fundos do imóvel”.

O juiz também ponderou que, além do reconhecimento da prescrição, o pedido demolitório não haveria mesmo de ser acolhido. “É certo que, nos termos do artigo 1.299 do Código Civil, ‘o proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos’. E o artigo 1.312 do Código Civil estabelece que ‘todo aquele que violar as proibições estabelecidas nesta Seção é obrigado a demolir as construções feitas, respondendo por perdas e danos’. Porém, essas proibições, estabelecidas na referida Seção, referem-se exclusivamente ao direito de vizinhança, conforme se verifica nos artigos 1.301 a 1.311 do Código Civil”.

No caso de violação de normas administrativas construtivas, como é o em questão, o magistrado diz que a legitimidade para exigir a correção da irregularidade seria, a princípio, do Município.

De acordo com a informação da Prefeitura no pedido da autora, existem construções sobre a faixa não edificante, que deveriam ser regularizadas para a aprovação do desdobro. O perito verificou que ambas as partes ergueram parte de suas edificações sobre a faixa onde não é permitido construir. “Assim, ainda que regularizada a construção na parte do imóvel pertencente à ré, o desdobro pretendido se manteria inviabilizado em razão da irregularidade na construção do lado da própria autora. Somente a regularização por ambas as partes autorizaria o desdobro pretendido”.

O processo foi julgado extinto, com resolução de mérito. A autora da ação foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios ao defensor da ré.

Foto: Pixabay

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