STJ decide que direito ao silêncio não pode ser interpretado em desfavor do réu

“É equivocado qualquer entendimento de que se conclua que o exercício do direito ao silêncio possa acarretar alguma punição ao acusado. A pessoa não pode ser punida por realizar um comportamento a que tem direito. (…) O silêncio não descredibiliza o imputado e não autoriza que magistrados concedam automática presunção de veracidade às versões sustentadas por policiais”. Com este entendimento, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) absolveu um acusado do crime de tráfico de drogas, condenado após ter exercido seu direito ao silêncio, em atuação da Defensoria Pública de SP.
 
Segundo consta nos autos, Eduardo (nome fictício) foi ao local dos fatos para comprar drogas, uma vez que era dependente químico. No entanto, no momento em que se aproximou do local, chegaram policiais militares. A pessoa que vendia a droga correu para dentro de uma casa – onde as drogas foram encontradas posteriormente – mas os policiais acabaram por prender o traficante e também Eduardo, que ficou calado perante a autoridade policial, e negou a autoria diante da juíza que analisou o caso.
 
Em primeira instância, o acusado foi absolvido. A juíza considerou o fato de não ter sido encontrado com drogas, e que ele não foi visto pelos policiais praticando atos típicos de traficância. “Em um processo criminal tudo deve ser muito bem provado, e tudo bem esclarecido em seus mínimos detalhes e circunstâncias, a fim de impedir que eventuais injustiças sejam feitas”, pontuou a juíza. 
 
No entanto, o Ministério Público recorreu da decisão, e, ao analisar o caso, o Tribunal de Justiça de SP (TJ-SP) acabou por condenar o réu à pena de 5 anos e 10 dias de reclusão, em regime inicial fechado, pelo crime de tráfico de drogas. Entre os fundamentos apontados, o acórdão destacou o fato de o acusado ter ficado em silêncio durante a fase policial, e negado a autoria do crime apenas perante o juiz.
 
Dessa forma, defensor público Luis Cesar Rossi Francisco, que atuou no caso, interpôs Recurso Especial perante o Superior Tribunal de Justiça, apontando que o direito ao silêncio é uma garantia legal, e isso não pode ser utilizado em desfavor do acusado. “A conclusão de que mentiu em juízo porque ficou em silêncio na fase policial representa claro amesquinhamento da garantia legal”.
 
Na decisão, o ministro Rogerio Schietti Cruz, do STJ, consignou que a Constituição Federal prevê o direito ao silêncio, reiterando que o exercício deste direito não pode gerar prejuízos à pessoa acusada. Ele também observou que o testemunho de policiais deve vir acompanhado do devido respaldo probatório.
 
“Propor que o testemunho policial deva ser corroborado por outros elementos probatórios independentes e idôneos está longe de ser questão de opinião, senão corresponde à fundamentada reflexão acerca da sociedade que queremos contribuir a que seja construída. A efetividade dos direitos fundamentais de todos, sem exclusão dos mais vulnerabilizados, impõe-nos a coragem de reconhecermos que a atuação policial merece redobrada atenção”.
 
Nesse sentido, em votação unânime, os ministros da Sexta Turma do STJ deram provimento ao recurso da Defensoria Pública, para absolver o acusado.
 
Atuaram neste caso os Defensores Públicos Luis Cesar Rossi Francisco, Leandro de Marzo Barreto, Rafael Ramia Munerati e Fernando Rodolfo Merces Moris, com apoio da Coordenação do Núcleo de Segunda Instância e Tribunais Superiores de São Paulo e Brasília.

Fonte: Defensoria Pública de SP
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

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