Réu por um roubo de motocicleta que ocorreu em julho do ano passado, M.J.S. foi absolvido nesta terça-feira (7) pela Justiça de Limeira, que não acolheu o pedido do Ministério Público (MP), pela condenação, por falta de provas e reconhecimento de “80% de certeza” feito pela vítima.

O crime ocorreu no Jardim Palmeira Real e a proprietária da motocicleta descreveu que foi abordada por dois homens quando parou para verificar o endereço. Um deles, armado, tomou sua Titan e fugiu.

O réu foi preso depois, fora do período de flagrante, por outro roubo e, na ocasião, foi apresentado à Polícia Civil e mencionado que ele teria sido um dos autores do assalto no Jardim Palmeira Real. Acionada, a vítima o reconheceu e ele acabou denunciado pelo crime, cuja ação tramitou na 2ª Vara Criminal de Limeira.

Em juízo, consta que a vítima reconheceu o réu com “80% de chance” e M., ao ser questionado, negou participação no crime e a defesa pediu absolvição.

O juiz Guilherme Lopes Alves Lamas analisou a ação penal e levou em consideração duas situações: o porcentual de reconhecimento feito pela vítima e a ausência de outras provas. “O ponto fulcral, porém, para a análise sobre eventual condenação é o ‘percentual’ de certeza que a vítima ofertou no reconhecimento. De fato, a Resolução 484, de 19 de dezembro de 2022, do Conselho Nacional de Justiça estabeleceu diretrizes para a realização do reconhecimento de pessoas em procedimentos e processos criminais e sua avaliação no âmbito do Poder Judiciário, dentre elas a de que a vítima deverá indicar, com suas próprias palavras, o grau de confiança em sua resposta [art. 7º, IV, da referida Resolução]. No caso, a ofendida disse que reconhecia o réu com ‘80% de certeza’. Tal percentual é suficiente para uma condenação ou só se pode admitir uma condenação com 100% de certeza? Deve ser discutido, nesse ponto, se o standard de prova próprio do processo penal contempla a fórmula anglo-saxã do ‘acima de qualquer dúvida razoável’ ou se é necessário algo mais. O Superior Tribunal de Justiça já anulou condenação criminal baseada em ‘alta probabilidade’, quando o correto seria se valer da ‘certeza’”, explicou na sentença.

Para o magistrado, o grau de confiança da resposta da vítima não foi o fator principal para a absolvição do réu, mas, essa situação, alinhada aos demais elementos dos autos, permite a dúvida. ”Não há, portanto, como se admitir que apenas com a afirmação de 100% de certeza que se pode dar prevalência ao reconhecimento efetuado pela vítima, até porque, se assim fosse, a referida Resolução do CNJ dispensaria a necessidade de se perquirir o ‘grau’ de confiança da resposta da vítima, pois qualquer percentual abaixo de 100 levaria à absolvição. […] Desse modo, caso não se tome apenas o reconhecimento [‘com 80% de certeza’] efetuado pela vítima como fundamento para a condenação, não há, nos autos, quaisquer outros elementos a ampará-la, seja porque o réu não foi detido, logo após, na posse das rei furtivae, seja porque, como admitido pelo policial civil, em audiência, foram guardas municipais que narraram que o aqui réu, preso em outro flagrante, havia participado, também, do roubo tratado nestes autos. Há, portanto, possibilidade de que, de alguma forma, a aqui vítima tenha sido influenciada pela prisão decorrente do outro fato. Desse modo, por todo o exposto, deve ser aplicado o in dubio pro reo, absolvendo-se o acusado”, decidiu.

O Ministério Público (MP) pode recorrer da sentença.

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