Habermas e a Bancada da Bíblia

por Roberson Augusto Marcomini

A religião pode ocupar a esfera pública?  Vivemos em um Estado democrático de direito?  O evangelicalismo no ano de 2020 apresentou um capital político nunca visto. As eleições realizadas em outubro de 2018 mostraram que a chamada bancada evangélica obteve 196 mandatos de deputados, o que representa 38% do total de 513 parlamentares na Câmara. Na filosofia política não buscamos respostas prontas, e não fazemos perguntas para encontrar respostas, mas sim questionar as respostas estabelecidas de uma sociedade. 

Existe uma forma de religiosos e não religiosos trabalharem em conjunto na esfera pública? Habermas, filósofo da Escola de Frankfurt, vai dizer que sim, e propõe o conceito de esfera pública em uma sociedade pós-secular é importante para entendermos como devem ser as relações entre religiosos e não religiosos pertinentes à coisa pública. Esta relação deve estar baseada em um conceito que chama de racionalidade comunicativa, ou seja, uma forma de conhecimento que deve produzir uma dinâmica de diálogo dentro dos espaços de fala.

Os entes religiosos e não religiosos precisam entender que suas ideias deverão ser submetidas a validação racional no debate dentro da esfera pública, o que nos remete que a razão comunicativa deve ser uma construção do conhecimento coletivo e plural, mas para esta relação acontecer deve existir boa intenção de ambas as partes, para que possam escutar e discutir de forma mais racional do que emotiva, assim diante do entendimento que o argumento da outra parte possui mais razão lógica.

No espaço público, a argumentação e visão do mundo dos religiosos precisa ser submetida ao debate e as regras do debate, seguindo as formalidades previstas, pois as regras valem para todos, é um princípio elementar de equidade na participação na esfera pública, de igualdade nos espaços de fala.

Sendo assim, a razão comunicativa defendida por Habermas defende que as ações da comunidade devem ser construídas através do conhecimento coletivo e não individual, assim os religiosos precisam entender que no debate público o que deve prevalecer são os valores democráticos, é inevitável que haja o debate, o confronto de ideias, a comparação de proposta e o choque de perspectivas diante dos mais variados temas.

Finalmente o Estado liberal não tem autoridade para proibir ou limitar a ação dos evangélicos nas esferas públicas, mas com base na razão comunicativa deve valorizar o melhor argumento a partir de três passos para chegarmos nesta relação, primeiro o religioso e o não religioso precisa entender que eles estão inseridos em uma comunidade que apresenta confissões e religiões diferentes, segundo precisam se adaptar à autoridade da ciência que detém os saber mundano, e o último precisam se adequar aos fundamentos de um Estado constitucional.

Roberson Augusto Marcomini é graduado em Teologia, tem licenciatura plena em Filosofia, doutorando em Sociologia, mestre em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, membro do Grupo de Pesquisa do Núcleo de Estudos de Religião, Economia e Política (NEREP/UFSCar), membro do Grupo de Pesquisa Ética e Justiça (Unicamp/Limeira)

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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