Defensoria consegue acórdão que autoriza interrupção de gravidez por inviabilidade de vida fora do útero

A Defensoria Pública de SP obteve no Tribunal de Justiça (TJSP) a concessão de habeas corpus para autorizar uma mulher a interromper a gestação em que não existe viabilidade de sobrevivência fora do útero.
 
O feto foi diagnosticado com agenesia bilateral (ausência de ambos os rins) e anidrâmnio (ausência de líquido amniótico). Mesmo com relatório médico, exame de ultrassom e perícia judicial atestando a inviabilidade de vida extrauterina e o parecer favorável do Ministério Público ao pedido inicial, o Juízo de primeiro grau indeferiu o direito da paciente à interrupção da gestação, sob o argumento de que o pleito não tem amparo legal, pois não teria ficado demonstrado efetivo risco à vida da gestante. 
 
O Juízo entendeu ainda que, por não se tratar de caso de anencefalia, não caberia interpretação analógica àquela dada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 54, segundo a qual a interrupção de gestação de feto anencéfalo não configura crime de aborto.
 
Diante da decisão, as defensoras públicas Rita de Cássia Gandolpho e Nálida Coelho Monte, coordenadoras do Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulheres, impetraram habeas corpus no TJSP pedindo autorização judicial para interrupção da gravidez. 
 
“Está-se diante de atipicidade material da conduta, por completa ausência de lesividade ao bem jurídico tutelado pela norma, já que não há possibilidade nenhuma de sobrevida extrauterina”, argumentaram as defensoras. Diante do quadro clínico apresentado, “não há vida a ser tutelada pela norma penal – e pelo Direito como um todo, exceto aquela da própria gestante, que deve ser gozada em sua plena dignidade”, acrescentaram. 

O Ministério Público manifestou-se pela concessão do habeas corpus.
 
Na decisão, o desembargador Eduardo Abdalla, acolheu os argumentos da Defensoria e deferiu liminar autorizando a interrupção da gravidez. Posteriormente, a 11ª Câmara de Direito Criminal do TJSP, em votação unânime, concedeu a ordem definitivamente. “Pelos documentos juntados, verifica-se que a paciente carrega feto sem condições de vida extrauterina, o que autoriza dizer, sem qualquer dúvida, que não se cuida de doença sem cura, mas, de feto que, infelizmente, não terá qualquer condição de sobreviver”, observou Abdalla. 
 
“Ainda que o risco físico seja inerente a qualquer gravidez, não há porque agravá-lo com relação à paciente, sujeitando-a dolorosa espera de filho sem qualquer condição de sobrevida”, acrescentou o magistrado, observando que “o caso se assemelha ao decidido na ADPF 54 do STF, que reconheceu à gestante portadora de feto anencéfalo – condição que por si só também não traz riscos físicos à mulher – o direito subjetivo de submissão ao procedimento adequado sem que necessária condição outra que não a sua própria vontade para a interrupção da gravidez”.

No acórdão, o relator,  desembargador Tetsuzo Namba, reiterou que o caso é análogo ao decidido pela Suprema Corte no que se refere à comprovada inviabilidade de vida após o nascimento, uma vez que as malformações inerentes ao feto são incompatíveis com a possibilidade de sobrevida. “Não haverá vida a ser tutelada pelo Direito Penal, o nascituro está fadado, infelizmente, à letalidade, sem indicação de recuperação por tratamento ou terapia, conforme repisado pelos laudos técnicos”, considerou.

Fonte: Defensoria Pública de SP
Foto: Pixabay

Deixe uma resposta

Your email address will not be published.

error: Conteúdo protegido por direitos autorais.