Presunção de culpa relativa em colisão contra automóvel estacionado em via pública

Por Juliana Teixeira de Campos

O Código de Trânsito Brasileiro, em seu artigo 28 estabelece que, o condutor deverá, a todo momento, ter domínio de seu veículo, dirigindo-o com atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito.

Nesse mesmo sentido, o artigo 29, inciso II do mesmo diploma legal, dispõe:

Artigo 29 – O trânsito de veículos nas vias terrestres abertas à circulação obedecerá às seguintes normas:

[…]

II – o condutor deverá guardar distância de segurança lateral e frontal entre o seu e os demais veículos, bem como em relação ao bordo da pista, considerando-se, no momento, a velocidade e as condições do local, da circulação, do veículo e as condições climáticas;

Após a análise destes dois artigos, imaginem a seguinte dinâmica de acidente: um veículo trafegava em via de mão dupla, dentro do limite de velocidade, quando colidiu contra a lateral de outro veículo que estava estacionado na referida via.

Considerando o regramento jurídico acima, a conclusão é a de que a culpa pelo acidente foi do veículo que trafegava na via, por não respeitar a distância entre ele e o automóvel que estava estacionado.

Ocorre que a presunção de culpa nesse caso é relativa, como nos casos envolvendo colisão traseira.

Recentemente, no decorrer de uma ação de indenização por danos materiais, a autora alegou que o coletivo da empresa de ônibus trafegava pela via acima da velocidade e, por não observar as normas estabelecidas pelo Código de Trânsito Brasileiro, colidiu contra a sua lateral esquerda, causando avarias no seu carro.

Para comprovar suas afirmações, a autora da ação anexou aos autos do processo imagens que mostravam o momento exato do acidente, o que foi essencial para que a empresa de ônibus apresentasse a sua defesa e a Juíza decidisse de forma certeira.

Os advogados da empresa de ônibus, portanto, arguiram a tese da culpa exclusiva da vítima pois as imagens anexadas pela própria Autora comprovavam que o seu veículo estava estacionado de forma irregular na via e que, por isso, deu causa ao acidente.

Além disso a empresa de ônibus, por meio do disco tacógrafo, comprovou que o coletivo não estava trafegando em alta velocidade.

Em sentença, a meritíssima Juíza da 2ª Vara do Juizado Especial Cível da Comarca de Campinas/SP, nos autos de nº 1040364-77.2022.8.26.0114, concordou com a tese dos advogados da empresa de ônibus e julgou improcedente a ação.

Para fundamentar sua decisão, a Juíza relatou:

[…] Na hipótese, a requerente apresentou um vídeo, do momento do acidente, que demonstra que a via em que seu veículo estava estacionado era de mão dupla, com pista simples, de modo que o ônibus de propriedade da ré precisou invadir a outra mão para passar pelo local e, ainda assim, acabou colidindo com a lateral do carro da autora.

Assim, embora não seja possível precisar, por meio da prova apresentada, a distância entre o carro da autora e o meio-fio, as imagens demonstram que o espaço restante na via era insuficiente para que o coletivo passasse pelo local sem invadir a outra pista.

Note-se, ainda, que um pouco antes do local em que o veículo da autora estava estacionado há uma marcação no chão, que indica o tráfego de ônibus pela região.

Desta forma, caberia à autora estacionar seu carro de forma a permitir a passagem do coletivo, o que não ocorreu. […]

Diante disso, portanto, nota-se que a presunção de culpa daquele que colide em veículo estacionado não pode ser adotada por si só, pois o fato do automóvel estar estacionado de forma irregular contribuiu para a ocorrência do acidente, afastando no caso citado a responsabilidade da empresa de ônibus frente ao dever de indenizar, diante da ausência dos requisitos estabelecidos nos artigos 186 e 927 do Código Civil.

Juliana Teixeira de Campos é advogada do escritório Izique Chebabi Advogados Associados. Graduada pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo – Unisal Campinas-SP. Sua área de atuação é a Cível.

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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