por Vinícius De Sordi Vilela

O contrato, na moderna concepção, é uma das mais poderosas ferramentas criadas no ordenamento jurídico a fim de estabelecer a segurança jurídica no meio social, tendo se amoldado às necessidades e características da sociedade ao longo dos anos.

                   Por meio de referido instrumento, duas ou mais pessoas, manifestando livremente suas respectivas vontades, se vinculam, de modo transitório e equilibrado, nos limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa fé, ou pelos bons costumes, com a finalidade de que as obrigações, reciprocamente assumidas, sejam integralmente cumpridas de modo voluntário.

                   Em que pese o adimplemento das prestações contratuais ser a regra, é possível que o inadimplemento contratual ocorra, devendo, nesta última hipótese, ser observado se o descumprimento se deu de modo voluntário ou involuntário, a fim de auferir a responsabilidade civil respectiva.

                   Na hipótese de descumprimento voluntário, doloso ou culposo, isto é, acaso tenha havido a intenção em descumprir a prestação contratual ou mesmo se o descumprimento se operou pela negligência, imprudência ou imperícia, responderá o inadimplente pelas perdas e danos ocasionados, mais juros e atualização monetária da prestação respectiva, bem como honorários advocatícios.

                   Entretanto, acaso o descumprimento se der na modalidade involuntária, isto é, em razão de caso fortuito ou força maior, é possível que o inadimplente não responda pelos prejuízos dali advindos, se expressamente por tais motivos não tenha se responsabilizado.

                   Assim, atualmente, muitas pessoas que se encontram envoltas em uma relação contratual restaram atingidas pelos efeitos do lockdown advindo do atual estado de pandemia, fazendo com que a produção e circulação de riquezas fossem afetadas.

                   Em razão deste quadro caótico nas relações contratuais, inúmeras demandas vêm desafiando a segurança jurídica advinda do contrato perante o Poder Judiciário, seja a relação contratual de adesão ou mesmo consensual, paritária, ou, ainda, de natureza pública ou privada.

                   Sob este enfoque, tem-se que as decisões judiciais, proferidas até então, vêm imprimindo, pontualmente, uma certa elasticidade às obrigações contratuais em razão da caracterização do caso fortuito / força maior, a fim de manutenir a relação contratual outrora firmada, conforme determina o ordenamento jurídico nacional, sempre balizadas pelas cláusulas gerais orientadoras das relações contratuais, tais como a função social dos contratos e a boa-fé objetiva.

                   Sob esta ótica, a simples alegação genérica da existência de caso fortuito / força maior, advindo do atual estado de pandemia, não é hábil a modificar os efeitos da relação contratual, devendo ser apreciada caso a caso, de modo individualizado, a fim de atestar se a causa apontada está, ou não, intimamente ligada à impossibilidade na prestação contratual, e não meramente vinculada na dificuldade de seu cumprimento ou mesmo na onerosidade, haja vista que o mero risco do negócio não poderá ser apontado como caso fortuito ou força maior.

                   Ou seja, diante do atual cenário, em que pese a força obrigatória dos contratos, pacta sunt servanda, o Poder Judiciário, em face de casos excepcionais e justificantes, vem flexibilizando o rigorismo contratual, imposto, em especial, nas relações contratuais de execução continuada e diferida, a fim de manter o contrato em condição equitativa.

                   Por derradeiro, o reconhecimento da atual pandemia como caso fortuito / força maior, beneficiando o inadimplente contratual com a benesse da respectiva excludente de responsabilidade civil, deve ser operada de modo muito cauteloso e prudente, primando sempre pela boa-fé objetiva, função social dos contratos e manutenção dos vínculos contratuais, a fim de não gerar injustiça e insegurança entre os contratantes e no meio social como um todo.

Vinícius De Sordi Vilela é mestre em Direito, sócio no escritório Ubirajara Gomes de Mello Advogados

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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