Qual a diferença entre o crime de furto mediante fraude e estelionato?

por Felipe Rissotti Balthazar

Em ambos os crimes (furto mediante fraude e estelionato) o agente se vale de engodo, artifício ardil ou qualquer outro meio fraudulento. Porém, as fraudes são empregadas com fins diversos. No furto mediante fraude, o agente utiliza-se da fraude para distrair a vítima, para mudar o cenário, fazendo a vítima incidir em erro e subtrair o bem dela sem que esta perceba. Assim, a fraude serve para fazer com que a res saia da vítima e vá para o agente de forma unilateral, não querendo que a res saia da sua esfera de vigilância e passe para o agente. Porém, enganada, não percebe essa mudança da posse do bem. Importante mencionar que nesse caso a vítima tem a posse vigiada do bem, diferentemente do estelionato, em que a vítima entrega o bem ao agente, tendo a posse desvigiada, pois acredita estar ocorrendo uma situação lícita.

Já no caso do Estelionato, a fraude é empregada não para distrair a vítima, não para fazer com que a vítima não perceba que a coisa está saindo da sua esfera de vigilância, mas sim fazer com que a própria vítima entregue a coisa, entregando a posse desvigiada, não percebendo a ocorrência do delito. Diferentemente do furto, no estelionato a coisa sai da vítima e vai para o agende de forma bilateral. Concordando com essa entrega, enganada, acredita estar fazendo a coisa certa.

Para melhor exemplificar, podemos dar o seguinte exemplo: dois agentes, simulando serem operadores de uma empresa de telefonia, vão até a casa de uma senhora e dizem que são funcionários da empresa “x”, informando que o telefone dela está apresentando problemas, mostrando a ordem de serviço. Assim, diante da verossimilhança fática, a vítima permite a entrada dos dois agentes em sua residência, tendo estes, a pretexto de estarem consertando o telefone da vítima, adentram a mesma. Já dentro da residência, um dos agentes solicita que a vítima o acompanhe perto da antena, em outro cômodo, enquanto o outro agente, sozinho, subtraí os eletroeletrônicos da casa da vítima sem que ela perceba. Assim, após toda a simulação, ambos os agentes saem da residência em posse dos bens, sem que a vítima tenha conhecimento da subtração ou que tenha consentido a sua entrega.

Esse exemplo acima, é um caso clássico de furto mediante fraude, pois a vítima não entrega os bens de forma consentida, agindo os agentes de forma unilateral para se apossar dos bens.

Nesse sentido, explica o Promotor de Justiça Rogério Sanches Cunha, que “O furto mediante fraude não se confunde com estelionato. Naquele, a fraude visa a diminuir a vigilância da vítima e possibilitar a subtração. O bem é retirado sem que a vítima perceba que está sendo despojada. No estelionato, a fraude visa fazer com que a vítima incida em erro e entregue espontaneamente o objeto ao agente. A vontade de alterar a posse do furto é unilateral (apenas o agente quer); já no estelionato é bilateral (agente e vítima querem).”

No mesmo diapasão, os nossos Tribunais vêm decidindo e esclarecendo o que vem a ser furto mediante fraude, diferenciando do crime de estelionato, citando os seguintes comportamentos:

  1. agente que, a pretexto de auxiliar a vítima a operar caixa eletrônico, apossa-se de seu cartão magnético, trocando-o por outro (RJDTACRIM 33/132);
  • agente que simula interesse na compra de motocicleta, com pretexto de testá-la, bem como de ir buscar dinheiro em outro lugar, para em seguida dela se apossar (RT 736/640);
  • agente que, como empregado da empresa-vítima, coloca aparelho de maior valor em caixa de aparelho de menor quantia, destinando-se a fraudar a vigilância do ofendido sobre o bem, de modo a impedir que tenha este conhecimento de que a res está saindo do seu patrimônio (RJTACRIM 23/237);
  • gerente de instituição financeira, falsificando assinaturas em cheques de correntistas com os quais, por sua função, mantinha relação de confiança, subtrai, sem obstáculo, valores alheios que se encontram depositados em nome deles, caracterizando furto, servindo a fraude, no caso, para burlar a vigilância das vítimas, e não para induzi-las a entregar voluntariamente a res (STJ – REsp 1.173.194-SC).

Embora os crimes se pareçam por ambos utilizarem da fraude, ou seja, da enganação, o principal ponto de distinção desses crimes está na consciência e atitude da vítima em entregar o bem ou sequer saber que a coisa está sendo subtraída.

Felipe Rissotti Balthazar (@rissotti.adv) é advogado criminalista, pós-graduando em Direito Penal Econômico pela UniAmérica.

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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