Mulher convida agressor para sua casa e será investigada por mau uso de medida protetiva em Limeira

Uma ocorrência de possível descumprimento de medida protetiva de urgência, benefício que a Justiça concede às mulheres vítimas de violência, tomou rumo diferente no plantão policial de Limeira no último dia 3 (quinta-feira). Geralmente, nesses casos, o autor do descumprimento é autuado em flagrante na esfera policial e na judicial pode ser processado pelo crime previsto no artigo 24-A da Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), ou seja, descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência. Ao atender o caso, o delegado Leonardo da Costa Ferreira entendeu que a ocorrência merecia melhor apuração, sob o risco de a mulher detentora do benefício ter “desnaturado” a essência da proteção judicial.

O caso chegou ao conhecimento da Polícia Civil por meio da Guarda Civil Municipal (GCM), acionada pela vítima porque o ex-companheiro estava com a motocicleta em frente ao prédio onde ela reside, no Jardim Florença. Em tese, ele estaria descumprindo a medida protetiva concedida à mulher e acabou abordado por agentes que integram a Patrulha Maria da Penha.

Na delegacia, porém, foi descoberto que anteriormente, já em posse do benefício judicial, a própria mulher tinha feito contato, por mais de uma vez, com o rapaz e disse que estava com saudades. No dia anterior à ocorrência, por exemplo, mandou mensagem à mãe do ex-companheiro e pediu para que ele fosse ao imóvel dela buscar pertences pessoais. Foi essa situação que mudou o rumo da ocorrência na delegacia, onde o delegado afastou o estado flagrancial e adotou a investigação, por meio da delegacia especializada no assunto, a Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), para que o caso fosse melhor apurado.

DESNATUROU A ESSÊNCIA DA PROTEÇÃO
Ao fundamentar sua tese para afastar o flagrante, o delegado Leonardo citou que, a princípio, a mulher tenha desnaturado a essência da proteção prevista na Lei Maria da Penha. “Entendo, sem prejuízo de entendimento ulterior diverso, que a suposta vítima por inúmeras vezes entrou em contato com o conduzido, desnaturando a essência da proteção contida no art.24-A da Lei 11.340/06, ou seja, entendo que há revogação tácita do teor do decisum proferido pelo douto juízo, haja vista que a própria vítima confessou ter telefonado para o conduzido, após a decisão judicial, para dizer que estava com saudades; uma vez que na data anterior aos fatos, a suposta vítima teria mandado mensagem para a mãe do conduzido e solicitou que ele fosse até o seu endereço buscar os pertences pessoais, não cabendo uma interpretação lógica-sistêmica apta a dar subsídio para sustentar uma possível violação da norma penal”, descreveu.

O fato de a mulher requerer a medida de proteção e, em seguida, procurar contato com o eventual agressor, coloca em risco a vida da beneficiada, desrespeita a decisão judicial e pode inclusive render uma apuração por denunciação caluniosa, conforme completou o delegado. “Ou seja, se a vítima solicita do Estado-juiz uma medida que vise à sua proteção e há urgência deste ato, pressupõe-se que há risco grave e iminente quanto à integridade física ou psicológica dela, cabendo uma medida urgente que a proteja; daí o nome do instrumento cautelar. Ocorre que, infelizmente, muitas supostas vítimas vêm fazendo mau uso desse instrumento de elevada importância na tutela da proteção dos direitos das mulheres, solicitando tais medidas para fins diversos dos quais o aludido instrumento foi criado; o que, em tese, se coaduna mais com os fatos apresentados a mim. Entendo que a vítima que se coloca em risco e ela própria desrespeita a decisão judicial e entra em contato com o suposto autor, em tese, não seria tão vítima como já fez crer em momento pretérito ou a gravidade dos fatos narrados que ensejaram a decisão judicial tiveram conotação distorcida para engodar o douto juízo, sendo passível atém mesmo de investigação pela DDM ou pela delegacia responsável pelo local dos fatos para apurar eventual denunciação caluniosa”, finalizou.

DESPACHO
Leonardo determinou a qualificação do rapaz como investigado, não converteu a captura em prisão em flagrante delito e despachou o caso para a DDM, que deverá colher as oitivas de todos os envolvidos e também comunicar a Justiça sobre o benefício concedido à mulher.

Quando há flagrante por descumprimento de medida protetiva, a Lei Maria da Penha prevê que não cabe fiança na esfera policial, somente na judicial. Em caso de condenação, a pena pode variar de 3 meses a 2 anos de detenção.

Durante a abordagem, o rapaz também portava entorpecentes e, por esse caso, ele será investigado pela Delegacia de Investigações sob Entorpecentes (Dise).

Foto: Denis Martins

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