Justiça de Limeira aciona Corregedoria sobre excesso em spray de pimenta em viatura

A Corregedoria da Guarda Municipal de Limeira (GCM) recebeu, nesta semana, ofício da 3ª Vara Criminal de Limeira para ciência de possíveis indícios de excesso de guardas no uso de spray de pimenta na prisão de um acusado em setembro de 2021. O homem acabou condenado por tráfico de drogas e a conduta dos guardas pode ser apurada pela corporação.

O jovem, hoje com 22 anos, fazia venda ilegal de crack no Parque Abílio Pedro. A droga era escondida em embalagem de salgadinhos. Com a aproximação da viatura da guarda, ele dispensou o saquinho no chão e entrou em sua residência. Dentro da embalagem, havia 27 pedras de crack, prontas para a venda.

Segundo o MP, os guardas foram até a casa e pediram ao pai que apresentasse o filho. O rapaz teria ido até eles, exibido o órgão genital e desacatado os agentes públicos.

Além dos crimes de tráfico e desacato, ele foi denunciado por outros dois delitos. Ele teria incitado populares a investir fisicamente contra os guardas, já que terceiros arremessaram pedras e garrafas. Além disso, teria oferecido R$ 10 mil aos guardas, o que lhe rendeu a acusação de corrupção.

Após a instrução do processo, o caso foi julgado pelo juiz Rafael da Cruz Gouveia Linardi, que reconheceu apenas os crimes de tráfico de drogas, o que rendeu 5 anos de prisão, e de desacato, mais seis meses de detenção.

Em juízo, o acusado negou o crime, dizendo que os guardas o chamaram em casa. Quando saiu, um dos guardas teria lhe dado um gravata, o que o fez desmaiar. Negou o desacato e a oferta de dinheiro e denunciou que os guardas jogaram gás de pimenta.

Os guardas confirmaram as informações que serviram de base à denúncia do Ministério Público (MP). Um deles reafirmou que o jovem incitou pessoas a atirar objetos, mas negou que ele e o parceiro tenham usado gás de pimenta para dispersar a população, muito menos dentro da viatura onde estava o réu. Outras testemunhas ouvidas, porém, confirmaram o uso do gás e vídeos gravados por populares foram trazidos ao processo.

Ao analisar todas as provas, o juiz considerou que abordagens policiais em certas localidades são marcadas pelo grau de animosidade dos moradores, o que traz risco e tensão. O magistrado entendeu que não ficou comprovado o crime de incitação. “É corriqueira a hostilidade dos moradores de referido bairro, o que foi admitido inclusive pelos guardas. Assim, ante a insuficiência probatória, a imputação pela prática de incitação ao crime não merece guarida”, apontou.

O juiz considerou haver prova robusta para condenar o jovem por desacato. “É possível verificar a presença dos agentes públicos na porta da residência do réu, em momento de alta animosidade, havendo dificuldade em convencê-lo a sair voluntariamente do imóvel. (…). A prática do desacato é inclusive compatível com a postura verificada pelos populares nos vídeos, já que, em situações onde grande número de pessoas passa a adotar comportamento agressivo, verifica-se tendência de reprodução e ampliação de tais atitudes [efeito manada]”, assinalou o magistrado.

Sobre o crime de corrupção ativa, o juiz não se convenceu. Ele entendeu que o acusado foi rendido mediante uso de força, desmaiou “e quando já estava dentro da viatura, ainda suportou jato de gás de pimenta, o que é possível verificar em um dos vídeos encaminhados”. Para ele, a suposta oferta, se ocorreu, não teve seriedade, já que não é possível saber se o acusado, enquanto era transportado para a delegacia, detinha o pleno exercício das faculdades mentais, pois havia perdido a consciência pouco antes.

Em seguida, o juiz apontou. “Ademais, o desnecessário uso do spray de pimenta, no momento em que o acusado já se encontrava contido e dentro da viatura, traz indícios de excesso praticado pelos guardas, razão pela qual determino o envio de ofício à Corregedoria da Guarda Municipal, contendo o link para acesso às imagens”.

O réu pode recorrer contra a sentença, mas segue preso. A Corregedoria da GCM recebeu o ofício nesta semana e vai avaliar as informações contidas no processo.

O uso de spray de pimenta teve notoriedade no mês de maio em Sergipe, quando policiais rodoviários federais usaram a ferramenta e gás lacrimogêneo na abordagem de Genivaldo de Jesus Santos, que foi trancado dentro da viatura com o gás já no interior. O detido morreu dentro do porta-malas e o caso teve repercussão nacional.

Foto: Pixabay

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