Juiz da 2ª Vara Criminal de Limeira (SP), Guilherme Lopes Alves Lamas sentenciou nesta quarta-feira (14) um caso de tentativa de furto qualificado e condenou o réu. O magistrado, ao justificar sua decisão, citou o artigo do filósofo e escritor Luiz Felipe Pondé, publicado no jornal Folha de São Paulo no dia 28 de janeiro deste ano, sob o título “Nas ruas, todas as gentes seguem esmagadas pelas patas do poder público” e afirmou: “esse magistrado ainda não desistiu”.

O caso envolveu um homem que tentou furtar a agência do Banco do Brasil na Praça Dr. Luciano Esteves, na região central limeirense, em agosto do ano passado. O réu, que confessou o crime, tinha acabado de deixar o Centro de Detenção Provisória (CDP) e, antes de chegar em sua casa, se embriagou e tentou pegar R$ 386,72 que estavam numa gaveta do estabelecimento, mas sem sucesso.

Toda a ação foi registrada pelo sistema de monitoramento do banco e o Ministério Públio de São Paulo (MPSP) denunciou o réu por tentativa de furto qualificado (rompimento de obstáculo). A defesa sugeriu a absolvição ou fixação de pena e regimes mais favoráveis. “Estando a confissão em harmonia com os demais elementos de prova, em especial a gravação já referida, é caso de condenação”, mencionou Lamas na sentença condenatória.

Ao justificar o motivo de não ter aplicado o princípio da insignificância, o magistrado levou em consideração o valor da tentativa de furto, superior aos 10% do montante do salário mínimo na data do crime, critério geralmente utilizado pela jurisprudência para o reconhecimento do princípio, e que o réu havia acabado de deixar o sistema prisional e, mesmo antes de voltar para casa, praticou novo delito.

Antes de fixar a pena, Lamas fez menção ao artigo de Pondé e reproduziu trechos do texto do filósofo, entre eles:

“em São Paulo temos algumas certezas. A cada dia seremos mais assaltados nas ruas, nos afogaremos mais nas tempestades, ficaremos sem luz mais vezes e por um número imenso de horas ou dias. E isso nada tem a ver com esquerda e direita. O mal do Brasil está para além dessa ‘dialética’. São Paulo está à deriva, o Rio está à deriva, o país soçobra na delinquência. O atraso, como dizia Nelson Rodrigues, não cai do céu, há que construí-lo arduamente. Há séculos que investimos no atraso, na ignorância, na corrupção, no crime, na miséria. O Estado brasileiro faliu administrativamente e moralmente. A sociedade brasileira é um paciente terminal. O crime organizado paulatinamente toma conta de tudo, e o Estado fica pegando no pé do cidadão comum, enchendo o saco com temas de costumes. […] Reconheçamos: o ‘projeto latinoamericano’ fracassou como sociedade na imensa maior parte do continente. O Brasil, uma terra de cínicos, se afoga em termos da moda saídos das mais inúteis ciências humanas, enquanto vê o país se transformar numa imensa usina de pessoas antissociais. Golpes, fraudes, assaltos, assassinatos, corrupção”

Ao concluir o artigo, Pondé cita: “Temo que as autoridades desse país desistiram. Umas talvez por preguiça, a maioria seguramente por canalhice, vaidade e oportunismo”. Lamas, na sentença, afirma: “Este magistrado [e certamente muitos outros] ainda não desistiu, de modo que cabe aplicar pena mais rigorosa para evitar que o ora réu deixe o estabelecimento prisional prematuramente e volte a delinquir”, mencionou.

O réu foi condenado à pena de um ano de reclusão. A defesa pode recorrer, mas sem direito de apelação em liberdade.

Foto: Diário de Justiça

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