Um shopping foi condenado a indenizar uma mulher por danos morais após a abordagem agressiva de um segurança. A autora afirmou que o caso ocorreu no piso inferior, após ela receber um “selinho” de sua companheira que a presenteava em alusão ao Dia das Mulheres. Além da indenização, o estabelecimento foi multado por não apresentar as imagens do ocorrido.

Nos autos, ela descreveu que estava no estabelecimento no dia 8 de março de 2022, justamente no Dia da Mulher, e, por volta de 16h30, recebeu de sua namorada um chocolate em alusão à data. Ela diz ter baixado a máscara, deu um “selinho” na companheira e recolocou a máscara novamente.

Após o beijo, ainda de acordo com a autora, o casal passou a ser seguido por um segurança que, de forma exaltada, pediu a recolocação da máscara no rosto da autora. “Enquanto estava abraçada com sua namorada, o segurança pegou no braço da requerente de forma muito agressiva e a puxou para trás. Indagou o segurança a respeito daquele comportamento, pois ficou com medo e muito constrangida, procurando um supervisor para realizar uma reclamação verbal sobre o ocorrido. Uma pessoa se identificou como responsável pelo serviço dos seguranças, ocasião em que o agressor disse ao supervisor: ‘não sei o que é esta coisa, se é menino ou menina, não consigo definir’, fala muito preconceituosa pela opção de sexualidade da requerente”, consta nos autos.

Preliminarmente, a autora pediu que a Justiça obrigasse o estabelecimento a apresentar, num prazo de 48 horas, as imagens do circuito interno de câmeras e, no mérito, pagamento de indenização por danos morais.

A Justiça acolheu o pedido liminar e determinou o fornecimento das gravações do circuito interno das câmeras sob pena de multa diária no valor de R$ 500, limitada a R$ 10 mil a ser revertida em favor da autora. O shopping não apresentou as imagens e chegou a contestar a decisão no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), mas não reverteu a decisão.

OUTRO LADO

A defesa do shopping, ao se manifestar nos autos, negou que houve abordagem agressiva e que a autora transitava sem máscara de proteção. “Foi abordada de forma pacífica pelo segurança do shopping, havendo a solicitação de colocação do item de proteção em respeito ao decreto em vigor à época dos fatos”, defendeu-se.

Afirmou, ainda, que não há registro de tentativa de resolução e no boletim de ocorrência juntado aos autos não há relato de qualquer ofensa feita pelo segurança, “tampouco a busca de resolução junto ao ‘líder de segurança’, não havendo qualquer ato ilícito praticado pelo réu”, completou.

Contestou o pedido de danos morais e voltou a defender a impossibilidade de apresentação das imagens, sob a alegação de ser impossível o armazenamento de todas as imagens diárias capturadas pelas câmeras de vigilância. Por isso, pediu o afastamento da multa.

JULGAMENTO

O caso foi julgado pelo juiz auxiliar Ricardo Truite Alves e, primeiramente, o magistrado analisou a situação que envolveu a não disponibilização das imagens por parte do estabelecimento, que fica na região central. “Verifica-se do depoimento prestado pela testemunha, a qual exerce a função de inspetor no shopping réu, que a autora a procurou no dia dos fatos e reclamou da conduta inadequada de um segurança de uma empresa terceirizada enquanto passeava pelo local com sua companheira. A testemunha ainda declarou que a autora lhe informou ter sido puxada pelo braço, o que gerou bastante constrangimento e revolta. Sobre a existência de filmagens do ocorrido, o shopping assim declarou: ‘Desta feita, não se pode exigir a exibição das imagens neste momento, ainda mais sob pena de multa, eis que a intimação para tanto se deu em prazo não razoável para localização e armazenamento dos vídeos, caso existissem no local dos fatos’. Contudo, a testemunha arrolada pelo próprio réu, ao ser ouvida em juízo, declarou que a autora pediu cópia das imagens de câmeras de segurança e mencionou o interesse em ajuizar ação judicial para a defesa dos seus direitos violados. Logo, depreende-se do conjunto probatório, em especial pelo depoimento prestado pela testemunha do réu, que as imagens existem, mas não foram juntadas aos autos, possivelmente a fim de esconder a conduta ilícita praticada pelo preposto da ré e dificultar a apuração da verdade real”, mencionou o juiz, que aplicou a multa.

Sobre os danos morais, o magistrado reconheceu que a abordagem foi excessiva. “Muito embora não tenha sido comprovada a ocorrência de fala preconceituosa na interpelação do segurança, não havendo prova da abordagem fundada exclusivamente em decorrência da orientação sexual da autora, restou demonstrado que a demandante foi ao menos puxada pelo braço por um funcionário da ré a serviço, devidamente corroborado pelo evidente descumprimento da liminar. Verificada a execução obrigacional imperfeita que ultrapassa o limite do aceitável, caracteriza-se o ato ilícito diante da ofensa danosa à esfera de dignidade e aos direitos básicos do consumidor, a quem o Estado deve defender, reprimindo todos os abusos praticados no mercado [equívocos como esse inclusive], tanto que, a partir da consagração do direito subjetivo constitucional à dignidade, o dano moral deve ser entendido como sua mera violação. Se assim é, entendo que há elementos suficientes nos autos a evidenciar que a conduta de um funcionário do réu gerou dano à integridade física e psíquica da parte autora, lesando seus direitos de personalidade e justificando a indenização por danos morais buscada”, decidiu.

O shopping foi condenado a indenizar a autora em R$ 5 mil por danos morais, além do pagamento de multa pela não apresentação das imagens, em valor fixado em R$ 10 mil. Cabe recurso.

Foto: Diário de Justiça

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