Os limites da filantropia e os resultados da solidariedade

Por João Geraldo Lopes Gonçalves

“Quando dou comida aos pobres, me chamam de Santo, mas quando pergunto porque eles são pobres, me chamam de comunista” – Dom Hélder Câmara.

Esta frase de Dom Hélder, arcebispo de Olinda e Recife, nos anos de 1960 a década de 90 do século passado, é uma das mais famosas de sua obra de pensamentos e orações.

A popularidade da frase tem dois significados: O primeiro o contexto de ditadura militar, onde o bispo foi um dos ferrenhos opositores e, por isto, perseguido e rotulado como comunista todas as vezes que denunciava as injustiças e atrocidades do regime. Segundo, para nos fazer refletir sobre os limites da caridade clássica, o de doar alimentos, roupas e outros para os que mais precisam.

Não há dúvida de que o ato de ser caridoso, doando parte de sua renda para os mais pobres, não deixa de ser uma atitude nobre e digna de reconhecimento. É inegável as ações de inúmeras instituições e mesmo pessoas físicas em distribuir pão para os mais necessitados.

Na frase de Dom Hélder há um significado de sua própria militância. Nos anos 50, como cardeal no Rio de Janeiro, Dom Hélder Câmara, organizava junto com lideranças de classe média, inúmeras campanhas de arrecadação de alimentos e roupas para serem distribuídos nas favelas, morros e periferias da cidade. Mais tarde, o próprio bispo reconhece os limites da filantropia, palavra que vem do latim que significa amor a humanidade.

Dom Hélder vai escrever e falar que a fome e a miséria são resultados de injustiças, onde uma outra frase do Santo Guerreiro, como era chamado, também ficou famosa: “O verdadeiro cristianismo rejeita a ideia de que uns nascem pobres e outros ricos, e que os pobres devem atribuir a sua pobreza à vontade de Deus”.

O pensamento mais uma vez profundo nos faz exatamente buscar motivos de uma grande maioria das pessoas viver na miséria enquanto uma minoria tem em abundância.

O sociólogo Herbeth de Souza, o Betinho, uma das maiores autoridades intelectuais do Brasil e do mundo, nos anos 90, do século XX, organizou e liderou a campanha nacional de luta contra a fome. Um movimento gigantesco, que mobilizou centenas de entidades e lideranças no sentido de coletar comida aos pobres.

Porém, Betinho dizia que eram medidas paliativas, emergenciais, que aliviam a dor da fome, mas não eliminam a miséria. Defendia o sociólogo que era preciso cobrar das autoridades públicas que promovessem políticas públicas de emprego e renda; estas sim capazes de vencer a escuridão e o terror da fome.

Vários governos criam programas como o Bolsa Família que, em tese, retira da linha da pobreza um número considerável de pessoas, mas por um tempo limitado por se tratar de uma medida de emergência e não o ideal.

Na pandemia, o crescimento da miséria tem sido assustadora. Números dão conta de desemprego já se aproximando de 15 milhões de trabalhadores, processo que já vinha em uma crescente antes do vírus mortal. Aliado à falta de emprego, a volta do mapa da fome. Novamente estamos atingindo números próximos de 50 milhões abaixo da linha da pobreza, de 2002.

É preciso ir a fundo na questão. Alimentar os mais pobres se faz urgente. Mas não buscar as raízes da fome, como ela surge, os porquês e o responsável, coloca limites, entre eles de continuar o problema.

É preciso a solidariedade, sentimento e atitude que coloca quem se preocupa com quem passa fome, parte e integrante do problema. Como afirma o padre Júlio Lancellotti: “ Sou amigo do povo de rua. Suas lutas são as minhas lutas”.

Assim, o espirito solidário substituí Eles e Nós para todos juntos e misturados.

João Geraldo Lopes Gonçalves, o Janjão, é escritor, consultor político e cultural

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