O direito ao silêncio e a não autoincriminação

por Ângela Souza

Muitos nunca pensaram no direito ao silêncio ou a não autoincriminação até se encontrar em um momento embaraçoso. Por esse motivo, é salutar compreender com antecedência sobre o tema.

Pois bem! De antemão frisa-se que não é de hoje que se associa o direito ao silêncio as grandes cenas de filmes estadunidenses, no momento de abordagens que leva um indivíduo a ser apreendido. O que o leitor talvez desconheça é que a origem é norte americana, o que explica a grande evidência da garantia nos filmes ao longo dos anos.

A saber, a prática realizada por policiais no momento da apreensão é chamada de; “Miranda Warning” ou “Miranda Rights”. Inclusive, teve origem na década de 60, no caso Miranda versus Arizona, nos Estados Unidos, no qual a Suprema Corte Americana absolveu o acusado que foi condenado com base em uma confissão obtida sem que tivesse sido informado de seu direito a ser assistido por um advogado e permanecer em silêncio. Sendo assim, foi a partir desse caso que passou a ser dever da autoridade policial informar no momento da apreensão que o acusado tem o direito a um advogado e de permanecer em silêncio, reafirmando garantias expressas na quinta emenda da Constituição dos Estados Unidos.

No Brasil as garantias são similares, inclusive, o inciso LXIII do artigo 5º da Constituição Federal, retrata o tema como garantia individual, fundamental e estabelecido como clausula pétrea, veja-se: “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”.

Ademais a título de curiosidade a doutrina se posiciona sobre o tema e o chama de “nemo tenetur se detegere” ou princípio da não autoincriminação, no qual dispõe que ninguém está obrigado a produzir prova contra si.

Recentemente, em abril do presente ano, houve uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (H.C nº. 703.978/SC), o qual confirmou a possibilidade do réu em exercer o direito ao silêncio parcial, ou seja, o acusado tem o direito de responder apenas perguntas de seu defensor.
Em outra decisão (Recurso em H.C, nº.170.843/SP), do Ministro relator Gilmar Mendes, o Magistrado evidencia que “a falta de advertência ao direito ao silêncio, no momento em que o dever de informação se impõe, torna ilícita a prova”.

Ressalta-se ainda que, os Tribunais Superiores do Brasil também têm aplicado o princípio da não autoincriminação em vários casos, tais como: afastar a obrigatoriedade do teste do bafômetro, não fornecer material biológico, e não obrigatoriedade em colaborar com investigações e instruções criminais.

A violação deste princípio também encontra respaldo no texto do artigo 9º da Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos de 19 de outubro de 2005, pela 33ª Conferência Geral da Unesco: “ “Artigo 9 — Privacidade e Confidencialidade: A privacidade dos indivíduos envolvidos e a confidencialidade de suas informações devem ser respeitadas. Com esforço máximo possível de proteção, tais informações não devem ser usadas ou reveladas para outros propósitos que não aqueles para os quais foram coletadas ou consentidas, em consonância com o direito internacional, em particular com a legislação internacional sobre direitos humanos”.

Um exemplo disto é quando um material genético retirado de um hospital para determinado tratamento, não seja utilizado para outras finalidades que não seja aquele pelo qual foi destinado e consentido.

Além de que, o ônus de provar o que se alega é responsabilidade de quem o fizer, sendo que em caso de suspeita de qualquer ilícito penal, cabe ao ente investigativo provar, e não o acusado de fornecer a prova.

Por outro lado, o direito Estatal as provas também são resguardadas pela Constituição Federal, porém, como não são absolutos, encontram seus limites nos princípios fundamentais pela observância do devido processo legal, ampla defesa, plenitude de defesa e contraditório, o que permite o não acolhimento de provas ilícitas e garante a dignidade da pessoa humana e seus direitos fundamentais.

Sendo assim, a compreensão sobre o direito ao silêncio e a autoincriminação é importantíssimo para evitar excessos, injustiças e manter o respeito ao Estado Democrático de Direito.

Ângela Souza é advogada criminalista, militante no Tribunal do Júri e infância e juventude. Pós-graduanda em Direito Penal e Processo Penal.

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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