“Lei” feita por presos ajuda detento ser absolvido por tráfico em Limeira

Uma “lei” criada por detentos colocou em dúvida a autoria de um caso de tráfico de drogas flagrado dentro do Centro de Detenção Provisória (CDP) de Limeira em 18 dezembro de 2019. Sem a certeza do cometimento do crime, o réu acabou absolvido pela Justiça. O caso tramitou na 1ª Vara Criminal e foi julgado nesta quinta-feira (24) pelo juiz auxiliar Ricardo Truite Alves.

Naquela data, agentes penitenciários faziam ‘blitz’ na unidade prisional e, quando vistoriaram a cela de número 1 do Raio 8, localizaram maconha sintética (K-4) e LSD dentro de um recipiente de creme hidratante. Os servidores questionaram quem era o dono dos entorpecentes e, então, o detento J.J.O. se apresentou. Ele respondeu a processo administrativo interno e, na Justiça, foi denunciado pelo crime de tráfico de drogas.

Durante os interrogatórios nas diferentes esferas, ele apresentou versões diferentes. No processo disciplinar, por exemplo, afirmou que a droga era de um colega de cela, mas aceitou a assumir a propriedade para não prejudicar o amigo, que estava prestes a ser solto. Já perante a autoridade policial, mudou a versão e assumiu ser o dono, citando que todas as porções eram para seu consumo e fornecia, caso necessário, para outros presos. Por fim, esclareceu que a droga estava em sua cama e não envolvia outra pessoa.

“LEI” ENTRE OS PRESOS
No entanto, foi a versão de uma das testemunhas que colocou em dúvida a autoria do crime. Ela informou em juízo que existe uma “lei” entre os presos e que ela é válida não somente em Limeira, mas em outros presídios: “o preso que chega por último na cadeia assume a posse do ilícito”, consta nos autos.

No caso analisado pela Justiça de Limeira, a cela onde ocorreu o flagrante abrigava mais de 20 presos e dispõe de 12 camas, ou seja, muitos dormem no chão. Durante a vistoria, todos os itens do chão devem ser colocados na cama para facilitar a busca por irregularidades e, como a cama é de uso coletivo, não somente de um dos presos, não ficou também comprovada se as drogas, apreendidas sobre uma delas, pertenciam ao réu. “O acusado teve que assumir, porque ninguém se identificou como proprietário”, relatou a testemunha.

Antes do julgamento, J. confirmou que existe essa norma dentro dos presídios. Afirmou que, no dia da apreensão, como nenhum dos presos assumiu a propriedade, e ele era o último que tinha chegado no local, teve que assumir para não gerar um castigo coletivo aos demais detentos, que ocasionaria perda das visitas e do banho de sol. “Tive que assumir por ser a regra do sistema prisional”, confessou.

Alves considerou que a materialidade ficou comprovada, mas que a autoria era duvidosa e absolveu o réu. “Como os elementos de convicção colhidos apontam tão somente para indícios contra a pessoa do réu e não para uma prova segura do delito, deve incidir ao caso o princípio do in dubio pro reo com a consequente absolvição”, decidiu. O Ministério Público (MP) pode recorrer.

Foto: Pixabay

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