Justiça anula regra que previa Bíblia à disposição dos vereadores em sessões

Em julgamento realizado em dezembro, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) julgou procedente ação movida pela Procuradoria-Geral de Justiça (PGJ) e anulou artigo do Regimento Interno da Câmara Municipal de Rifaina (SP), na região de Franca, que determinava que a Bíblia ficasse à disposição durante todo o tempo da sessão. Além da presença da Bíblia no plenário, o regimento também determina a abertura de cada sessão com as palavras “Sob a proteção de Deus”.

A decisão do tribunal foi por maioria de votos e teve divergências. Prevaleceu o voto do desembargador Ricardo Dip, que formou o acórdão. Em resumo, ele apontou que o Brasil atual não se constitui, formalmente, um estado religioso, nem é um estado ateu ou agnóstico, mas um estado teísta. “Não são juridicamente válidos, entre nós, os atos normativos de promoção e imposição de culto religioso público-estatal”, lembrou.

Sobre a obrigatoriedade da presença da Bíblia na Tribuna, à disposição dos vereadores, Dip fez uma análise sobre a legitimidade dos atos sobre aquisição da Bíblia para o acervo de bibliotecas públicas, lembrando o valor do documento no plano cultural. “Dietrich Schwanitz alista a Bíblia, ao lado da Odisseia e da Ilíada, por obras que estão à raiz da civilização europeia”, citou.

A partir disso, ele conduziu o voto com o seguinte entendimento. “Quem entenderia molestar a neutralidade estatal um preceito que ditasse houvesse a Odisseia e a Ilíada em bibliotecas públicas, com o argumento de que essas obras propalam os deuses do paganismo? Como admitir que se daria ofensa dessa neutralidade com a exigência de as bibliotecas públicas terem em seus acervos o Talmud, o Corão e os Vedas, por exemplo? A perspectiva, porém, é outra, quando se trate de, num estado apenas teísta, obrigar haja uma Bíblia em um ato público, porque então já não se cuida de permitir o acesso a uma expressão cultural, mas, isto sim, trata-se de referir-lhe um sentido religioso”, concluiu.

O desembargador Carlos Monnerat apresentou voto divergente em parte. Ele acompanhou o relator na questão da obrigatoriedade da Bíblia no plenário, mas entende que a abertura da sessão com a expressão “Sob a proteção de Deus” é legal, uma vez que a frase está no preâmbulo da Constituição.

“Ora, se somos Estado Teísta, a invocação de um Deus que se aclimate a qualquer religião não fere ânimos. Os crentes na existência de um ser superior a aprovariam. Os agnósticos – aqueles que afirmam que a existência de Deus não pode ser nem provada nem negada – não se incomodarão com a invocação. Finalmente, os ateus – aqueles que negam a existência de Deus – acharão inócua tal invocação ao início dos trabalhos legislativos. Há respeito mútuo, há obediência ao mandamento constitucional de respeito a liberdade de credo”, apontou. O voto de Monnerat, contudo, foi vencido.

Foto: Pixabay

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