Juíza de Limeira impede desalojamento de paciente em clínica que não poderia abrigá-la

Em sentença assinada nesta semana, a juíza Sabrina Martinho Soares, da Vara da Fazenda Pública de Limeira, impediu o desalojamento de uma paciente que está internada numa clínica que, a princípio, não poderia fazer o acolhimento. O estabelecimento é licenciado para cuidar de idosos, ou seja, pessoas com mais de 60 anos. A autora da ação tem idade inferior e seria desalojada do local após notificação do poder público. A ação foi ajuizada pela advogada Raquel Aparecida dos Santos Amorim, do escritório R Santos Advogados.

A autora, que tinha 54 anos quando ajuizou a ação no ano passado, descreveu que em 2015 foi acometida por um acidente vascular cerebral (AVC) e ficou com sequelas permanentes, tornando-se totalmente dependente em suas atividades. Seu pai se tornou seu curador definitivo, mas, devido à idade avançada dele e também por ele cuidar de outro filho portador de esquizofrenia, em 2020 ela foi internada numa clínica de repouso.

No estabelecimento, ela tem à disposição enfermagem 24 horas por dia, para auxílio no autocuidado; administração de medicamentos; alimentação, já que não possui condições de se alimentar sozinha; fisioterapia três vezes por semana; atendimento de urgência e emergência 24 horas por dia; lavanderia e hotelaria; nutricionista e médico clínico.

Ocorreu que a clínica foi notificada pela Vigilância Sanitária por não ter licença de funcionamento para acolher pessoas com menos de 60 anos. Com isso, deveria desalojar duas pacientes que se encontram nessa situação, uma delas é a autora da ação.

À Justiça, ela apontou que eventual transferência poderia agravar seu estado de saúde. “Vez que encontra-se adaptada aos cuidados recebidos na referida instituição”, citaram os advogados.

Também mencionou que não existe no município instituição que se enquadre nos critérios exigidos pela Vigilância Sanitária para seu acolhimento e requereu mandado de segurança cível para permitir sua permanência de forma definitiva na instituição. Citada, a Prefeitura de Limeira defendeu-se e apontou que na cidade existe outras instituições para acolher a autora.

DIGNIDADE HUMANA
Sabrina, ao julgar o caso, descreveu na sentença que a Anvisa regulamenta esses tipos de estabelecimentos e que adota o critério etário para o acolhimento de pessoas nas Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI), como é o caso da clínica onde está a autora e, caso um estabelecimento somente possua alvará de funcionamento relacionado ao oferecimento de residência para idosos, o local não pode acolher pacientes com idade abaixo de 60 anos ou pessoas com deficiências. Porém, para a juíza, essa situação não pode ferir o princípio da dignidade da pessoa humana.  “Nada obstante, dependendo do caso concreto, um mero critério formal pode acabar sendo um obstáculo dispensável e ainda violador do princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no artigo 1º, inciso III da Constituição Federal, o que é inadmissível”.

Para a magistrada, embora a clínica não esteja licenciada para tratar de pessoas com idade inferior a 60 anos, o desalojamento abrupto da mulher poderia comprometer seu estado de saúde. “[…] o que, como consequência, viola o direito constitucional da dignidade da pessoa humana, na medida em que seria dispensado tratamento degradante e desrespeitoso à saúde da impetrante. Além do mais, ainda que o Município tenha alegado que há estabelecimento privado apto para receber o pleiteante, não se mostra razoável retirar a impetrante da instituição em que se encontra acolhida, por mero obstáculo relacionado ao licenciamento do local, se os cuidados médicos estão sendo devidamente prestados. Dessa forma, considerando que o auto de infração emitido pelo Município é inconstitucional e tendo a impetrante comprovado que está na iminência de ser desalojada pelo Município, por meio de ato coator posterior àquele primeiro ato coator, é cabível concluir que a impetrante demonstrou a existência de prática iminente de ato coator contra si, bem como demonstrou seu direito líquido e certo de permanecer na ILPI em que se encontra, razão pela qual a concessão da segurança é medida que impera”, decidiu.

Com a sentença, a Prefeitura de Limeira está impedida de se opor à permanência da mulher na clínica onde ela está internada. Cabe recurso.

Foto: Pixabay

Deixe uma resposta

Your email address will not be published.

error: Conteúdo protegido por direitos autorais.