A juíza Alessandra Lopes Santana de Mello, da 2ª Vara Cível de Sorocaba, condenou um morador da cidade a indenizar um comerciante que citou “Fora Bolsonaro genocida”. Após a frase, o réu fez postagem na internet estimulando boicote ao estabelecimento e, também, xenofobia (o autor é argentino).

Consta nos autos que, depois do comentário do comerciante contra o ex-presidente, o réu postou nas redes sociais uma mensagem onde pedia que os moradores de Sorocaba não frequentassem o estabelecimento do autor e incitou as pessoas a localizarem o perfil dele e marcá-lo na postagem. “A mensagem tem conotação eminentemente política, violou a imagem dos autores e gerou inúmeros comentários nas redes sociais, causando-lhe prejuízos”, está na ação.

Na postagem, ocorreu uma série de ofensas, como dizeres de que o comerciante deveria voltar para a Argentina, que ele era um covarde, ingrato, “merda”, “vagabundo”, “traste”, entre outras. “A postagem realizada pelo réu enseja injúria e preconceito decorrente de procedência nacional [xenofobia] em relação ao primeiro autor, bem como importa uso não autorizado de sua imagem, por ter a publicação sido acompanhada de duas fotos de sua pessoa extraídas da própria rede social. A publicação impugnada incitou o ódio e o boicote ao estabelecimento comercial, salientando que fora seguida por inúmeros comentários negativos e também ofensivos de terceiros, tudo a ferir dolosamente a honra e a imagem de ambos os autores”, citou o comerciante e seu estabelecimento.

Após decisão liminar, a empresa responsável pela rede social removeu a postagem. Ao ser citado, o réu contestou a ação. Preliminarmente, apontou que houve associação de fatos distintos à postagem impugnada, distorção da verdade e ausência de conclusão lógica entre os fatos e os pedidos formulados. Requereu penalidade por litigância de má-fé contra os autores.

No mérito, sustentou o exercício de liberdade de expressão e de discordância do posicionamento político publicamente assumido pelo comerciante, ao chamar o ex-presidente da República de genocida. Negou a existência dos danos morais.

Ao julgar o caso, a magistrada considerou que o réu extrapolou a liberdade de expressão. “A crítica emitida pelo autor ao dizer ‘Fora Bolsonaro genocida’ não se dirigiu à pessoa do réu ou a quaisquer dos eleitores brasileiros, mas ao presidente da República. A postagem apresentada pelo réu, diversamente, não limitou a criticar o candidato adversário ao presidente da República ou se voltou a travar um debate de ideias políticas ou mesmo a desconstruir a fala do autor. Voltou-se a atacá-lo no plano pessoal, ao dizer que, se ele não gostava do presidente, não gostava do país; ao destacar o fato de possuir ele outra nacionalidade; ao sugerir que voltasse para sua terra e solicitar que as pessoas o marcassem no Facebook e em quaisquer outras plataformas. A mensagem visou causar danos à imagem do estabelecimento, ao solicitar que as pessoas não mais frequentassem tal local, incitando verdadeiro boicote em decorrência de divergências políticas. Como consequência, verifica-se que a postagem incitou, na sequência, a propagação de uma série de ofensas ao primeiro autor, com dizeres de que este deveria voltar para a Argentina, de que era um covarde, um ingrato, um “merda”, um “vagabundo”, “traste”, entre outras falas. A postura do réu desbordou claramente dos limites inerentes à liberdade de expressão. Em que pese seja possível a livre manifestação de pensamento, nos termos do art. 5º, inc. IV, da Constituição Federal, da qual decorrem os direitos de crítica, de informação e de manifestação de preferências políticas, não pode ser exercido de modo absoluto ou ilimitado. Não autoriza a prolação de ofensas, de discursos de ódio ou de discriminação ou mesmo a incitação de comportamentos xenófobos ou hostis, que lesam a paz, imagem e a honra subjetiva/objetiva de pessoas físicas ou jurídicas, que também são protegidas constitucionalmente, ainda que em contexto eleitoral”, decidiu.

O réu foi condenado ao pagamento de indenização por danos morais em R$ 10 mil, valor que será atualizado monetariamente e com juros de mora de 1% ao mês a partir da citação. Ele pode recorrer.

Foto: Pixabay

A reprodução parcial ou total desse conteúdo é proibida sem autorização expressa do Diário de Justiça

Deixe uma resposta

Your email address will not be published.

error: Conteúdo protegido por direitos autorais.