Cobrança feita no site do Serasa: da legalidade à imoralidade

por Reginaldo Costa

Recentemente, chegou ao meu conhecimento uma prática que vem sendo utilizada pelo Serasa, que é a utilização da sua plataforma por outras empresas para a cobrança de dívidas prescritas, o que inicialmente não constitui nenhum crime ou ilegalidade. Entretanto, seria moralmente aceitável essa conduta do Serasa?

Vejamos, conforme explícito no próprio site da empresa, o Serasa é atualmente a maior empresa de compilação de dados financeiros em atividade no Brasil. Como funciona: a empresa coleta os dados financeiros de toda população e depois os comercializa para que outras empresas possam tomar suas decisões sobre concessão de crédito, vendas a prazo e por aí vai, seguidos de vários outros serviços prestados.

Na ponta do consumidor, estes, quando desejam saber se o nome está limpo, têm como sua maior ou melhor referência os dados fornecidos pela mesma empresa, o Serasa. Os serviços fornecidos para as empresas são cobrados, por outro lado, há o serviço oferecido diretamente ao consumidor que não tem custo, como o relatório de regularidade, que é acessado através de um login e senha pessoal.

Ocorre que o Serasa vem vendendo um serviço de cobrança de dívidas, principalmente para empresas de recuperação de créditos, consistente na oferta de quitação de dívidas prescritas, o que, segundo o Serasa, não viola os direitos do consumidor, logo, não pode ser considerado ilegal, mas dada a relevância, confiabilidade e importância das informações coletadas no Serasa, será que isso seria moralmente aceito?

Explica-se. A pessoa, por alguma razão, deixa de pagar uma dívida, procura seu credor, faz uma negociação e paga um valor menor, prática muito comum com os bancos e empresas de cartão de crédito, cujos juros costumam ser astronômicos. Pois bem, é corrente a informação que feita essa negociação, algumas instituições financeiras mantêm o que chamam de restrição interna. Outra situação comum é a do consumidor que acaba não conseguindo pagar todas as dívidas que contraiu e seu nome é negativado junto ao Serasa. Porém, passado o período de prescrição, essa informação desaparece do relatório do Serasa, por não ser mais exigível através de ação judicial. O que muita gente não sabe é que dívida prescrita ainda pode ser cobrada, só não pode ser exigida através de ação judicial, sendo assim, ela continua existindo. A dívida deixa de existir quando, de alguma forma, é paga.

Voltando ao serviço gratuito oferecido pelo Serasa, o que ocorre é que o consumidor faz login no site da empresa e logo aparece a informação que existe uma oferta imperdível para a quitação de um débito, sempre com descontos enormes, mas, na verdade, aquela dívida não é mais exigível, logo, não vai aparecer no relatório fornecido ao consumidor pelo Serasa.

Acontece que a maioria das pessoas não é capaz de compreender essa sistemática e acaba pagando por essas dívidas inexigíveis por puro erro, ou seja, confia na reputação e confiabilidade do Serasa. Elas não têm conhecimento que trata de uma dívida inexigível e pagam muitas vezes sem saber que estava desobrigado a pagar. Como sustentado desde o início, não se trata de prática ilegal, porém, para uma empresa da envergadura do Serasa, seria essa prática moralmente aceita? Seria aceitável levar o consumidor ao erro desta forma? Bom, na minha opinião, essa prática poderia ser coibida através de uma ação civil pública por algum daqueles legitimados, já que vem induzindo em erro os consumidores e essa é uma prática proibida pelo Código de Defesa do Consumidor.

Reginaldo Costa é advogado e sócio-fundador do escritório Reginaldo Costa Advogados Associados, atuante nas áreas cível, direito do consumidor, direito de família, empresarial, administrativo, entre outros. É especializado em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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