Cenários para as eleições presidenciais

por Leandro Consentino

O mês de junho tem sido profícuo em notícias importantes para a corrida presidencial em todos os campos do espectro político-partidário: seja na situação de direita com Jair Bolsonaro (PL), seja na oposição de esquerda com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou mesmo nas chamadas candidaturas de “terceira via” como Simone Tebet (MDB) ou Ciro Gomes (PDT).

No caso de Lula, atual líder das pesquisas, o grande acontecimento foi o lançamento de seu programa de governo, já moderado pelas forças de mercado e por outros partidos que compõem a aliança. O caso da reforma trabalhista, por exemplo, é emblemático desse movimento, tendo suavizado o termo “revogação” para evitar perder os eleitores mais ao centro, uma vez que a esquerda já parece fidelizada. Algumas informações dão conta de que o teto de gastos públicos seguirá o mesmo caminho.

Já no caso de Bolsonaro, as notícias são menos alvissareiras: a dificuldade de debelar a escalada dos preços no setor de combustíveis e os escândalos da prisão de seu ex-ministro da Educação Milton Ribeiro e da demissão do presidente da Caixa Econômica Federal por acusações de assédio sexual e moral têm prejudicado a imagem de Bolsonaro, tanto no campo da gestão eficiente como da ética. Com tais problemas e eventuais instalações de Comissões Parlamentares de Inquérito sobre os dois assuntos – a da Petrobras e do MEC – pode ser cada vez mais difícil a recuperação em tempo hábil para conquistar a reeleição, embora haja resiliência em seu eleitorado.

Por fim, a chamada terceira via, sobretudo Simone Tebet, teve suas expectativas frustradas com baixos índices mesmo com a exposição nas inserções partidárias do MDB e do desgaste do governo que pode conduzir a uma ampliação em seus votos, a fim de cativar eleitores que desejem a derrota de Lula e da esquerda nas eleições presidenciais, mas se decepcionaram com os rumos do governo Bolsonaro.
A mais recente pesquisa Datafolha ajuda a delinear quatro cenários possíveis para as eleições em outubro, os quais detalharemos abaixo:

Vitória de Lula no primeiro turno (média/alta probabilidade)

O primeiro cenário possível seria a manutenção da tendência atual em que o ex-presidente Lula lidera as pesquisas e o atual presidente Bolsonaro perca força, tendo em mente os problemas na economia e na imagem ética do presidente da República. No caso desse cenário, os votos a Bolsonaro poderiam ser anulados ou migrarem para candidatos nanicos (como Janones ou Marçal) e da terceira via, mas não teriam força para ultrapassar Bolsonaro, deixando Lula livre para vencer já na primeira volta. Além disso, haveria uma movimentação de “voto útil” desses eleitores de terceira via que conscientemente escolheriam Lula para evitar dar força a uma suposta narrativa de ruptura institucional por parte de Bolsonaro.
Independentemente da composição do Congresso Nacional, uma vitória em primeiro turno pode ser fundamental para Lula conseguir imprimir suas diretrizes, podendo reforçar os nomes dos próprios partidos da coligação e atraindo os partidos mais fisiológicos e mesmo os do centro democrático para as reformas necessárias e evitando as ofensivas da oposição bolsonarista que ainda poderá persistir.

Lula e Bolsonaro polarizados no segundo turno (alta probabilidade)

Nesse segundo cenário, Lula se mantém em patamares altos, mas Bolsonaro cresce ou se consolida para uma segunda volta, anabolizado sobretudo por uma eventual melhora do cenário econômico, além da manutenção de seus apoiadores mais fiéis. O cálculo aqui também passa por um intenso uso da máquina pública, pródiga na concessão ou ampliação de benesses, e na manutenção da terceira via em patamares modestos, a qual acabaria sendo tragada pela polarização, sendo o resultado incerto dada a proximidade de ambos nos índices de intenção de votos e rejeição.
Nesse caso, a vitória de cada um por pequena diferença pode dificultar o governo do vencedor, impondo um custo mais alto tanto na divisão das pastas e cargos como na moderação de eventuais propostas, o que pode indicar concessões importantes aos partidos mais fisiológicos e enfrentando resistências mais significativas das respectivas oposições petistas ou bolsonaristas.

Lula e terceira via no segundo turno, com Bolsonaro fora da disputa (média/baixa probabilidade)

Este terceiro cenário pressupõe a ausência do atual incumbente, Jair Bolsonaro, de um eventual segundo turno, disputado entre o ex-presidente Lula e uma candidatura de terceira via, seja pela inabilitação judicial de Bolsonaro em concorrer, seja pela derrota política de fato ante a piora do cenário econômico e da crise política no interior do governo com a recente deflagração da operação da Polícia Federal.

Nesse caso, há uma hipótese real de derrota de Lula, dada a rejeição mais alta do ex-presidente e o fato de que boa parte dos eleitores de Bolsonaro, ainda que contrariados com a ausência do presidente na segunda volta, poderiam aderir à terceira via para derrotar o ex-presidente petista, a quem julgam um mal maior.

Tal disputa poderia levar a uma migração do debate para o centro e moderar as propostas e iniciativas no Congresso Nacional, mas também teria o efeito deletério de inviabilizar uma aproximação da esquerda com o centro, deixando a extrema direita bolsonarista como fiel da balança e ainda viva em um eventual governo da terceira via, dada a necessidade de aproximação com esse eleitorado.

Bolsonaro e terceira via no segundo turno ou Ruptura institucional (baixa probabilidade

Estes últimos cenários são bastante improváveis, dada a oposição e impopularidade de Bolsonaro. Nesse sentido, a ausência de Lula na disputa de um segundo turno fica cada vez mais distante, dados os contingentes que amealhou por representar a maior figura de oposição contra o atual governo e conservar parte da popularidade de seu antigo governo. Embora improvável, tal cenário favoreceria um diálogo da esquerda derrotada com a chamada terceira via, o que poderia fortalecer o governo dessa última ou até mesmo a coesão entre ambos os grupos na eventual hipótese de uma reeleição de Bolsonaro.

Outro cenário que dificilmente se verificará é o de ruptura institucional, pois, ainda que as ameaças ao sistema eleitoral sejam vocalizadas, a operacionalização de tal rompimento com a ordem constitucional se mostra muito mais complexa e não contaria com fatores existentes na última vez que isso ocorreu como o apoio de parte da imprensa, do centro político e mesmo da comunidade internacional, em especial os Estados Unidos da América. Assim, é mais provável que haja uma tentativa fracassada que propriamente a concretização de tais ameaças. Já no remoto caso de um golpe bem-sucedido, o reposicionamento dos atores e a dificuldade de antever o que seria feito com o Legislativo nos impedem de antever como seria o relacionamento de Bolsonaro com o Congresso Nacional.

Neste próximo mês, as convenções serão realizadas e as candidaturas homologadas, sendo dever de todo candidato e de seus respectivos entornos conhecerem esses cenários. E nunca é demais lembrar, temos toda uma campanha no meio do caminho das eleições. Aguardemos!

Leandro Consentino é bacharel em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo (USP), mestre e doutor em Ciência Política pela mesma instituição. Atualmente, é professor de graduação no Insper e de pós-graduação na FESP-SP.

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

Deixe uma resposta

Your email address will not be published.

error: Conteúdo protegido por direitos autorais.