A cultura sexista no Brasil – Parte II

por João Geraldo Lopes Gonçalves

Este assunto de novo escrevinhador ? Talvez o leitor ou leitora esteja se perguntando: o por que continuar este tema?

No Brasil, em especial nesta era em que a informação é em tempo real, instantânea e logo modificada por razão da velocidade das mesmas, um fato se esquece com relativa e preocupante rapidez.

Mesmo os artigos opinativos, se resumem ao calor da hora e em sua maioria se perdem ao imediatismo, ficando inclusive no “Fla X Flu”, sem aprofundar em conteúdo e em especial à busca de soluções.

A prática do sexismo, como dissemos no primeiro artigo, remonta à chegada do homem (sim no masculino, pois as primeiras viagens só traziam homens) branco e europeu nas nossas terras. 

Além dos espelhinhos e outros presentes para trocar por “riquezas” com os indígenas, nas malas de Cabral e companhia, vinham também a concepção e visão de mundo. Mas a cultura como tal se consolida e se qualifica com a escravidão negra, onde as mulheres, mesmo brancas, eram tratadas como objetos. A partir da mercantilização como se vê, trata-se da intensificação desta concepção discriminatória e violenta.

O sexismo não se resume apenas ao ato, à relação carnal e o papel das mulheres nesta ideia, e sim no comportamento do cotidiano. O machismo e o sexismo são instrumentos de violência que têm como intenção a dominação de gênero, para definir dominado e dominador. É primeiro o sexo e depois, não com grande distanciamento, a cor da pele e a condição social.

Há acordo entre este escrevinhador e aqueles pseudos intelectuais que, para esconder ou se acomodar na discriminação, é o gênero feminino que cumpre o papel de dominadas, independente do perfil pessoal e de grupos econômicos. Mas também é verdade e os tais entendidos discordam deste que escreve, de que são as mulheres pobres e negras que sentem as mãos e garras dos misóginos em seu corpo e mente com maior frequência. Assim, entendemos que o sexismo se constitui em uma cultura de mais de 500 anos e que faz parte de um projeto de poder coletivo ou individual e que circula em todos os segmentos da sociedade.

Algo palpável, pois assistimos a fatos e episódios, como dissemos diariamente, também é desconstruir discursos, que parecem para muitos ser inofensivos e parte da vida. Separamos alguns aqui para ilustrar a necessidade de substituir esta Cultura por uma outra:

Senta que nem mocinha

Isso não é coisa de menina

Não fale tão alto, menina

Vai ajudar as mulheres na cozinha

Mulher amadurece mais rápido

Você vai sair com esta roupa

Não mostra tudo, deixa algo para imaginação

Você tem que se dar o respeito.

Homem tem suas necessidades, você tem que entender

Mulheres são sensíveis

Nossa você cozinha bem, já pode casar

Para de falar palavrão, mulher falando palavrão é feio

mulher bêbada é tão feia

tira esta maquiagem, vão achar que é qualquer uma

homem gosta de pegar em carne, não em osso.

amizades de mulheres são todas falsas

você dirige bem, apesar de ser mulher

mulher com pelos é falta de higiene

aquela lá é encalhada

se continuar assim homem nenhum vai te querer

Estas frases, bem populares, são proferidas não só por homens, bem como não só por machistas declarados. Estão tão encravadas no nosso meio, que proferimos sem medir as consequências destas odientas frases. E selecionamos apenas 20, mas há muito mais, as quais peço para que, quem quiser colocar nos comentários do texto as sugestões, esteja a vontade.

Embora esta cultura se espalhe por todos os gêneros e classes sociais, sendo estritamente masculinas, não são proferidas apenas do macho alfa para as mulheres. Quem já não presenciou uma mulher se dirigindo a outra utilizando uma destas frases?

Raramente se cobra do homem que ele tem que emagrecer, caso contrário não arranjará mulher ou que pelos no corpo é falta de higiene ou ainda que determinada situação, como escarrar no chão, colocar as mãos nos órgãos genitais, não é coisa de homem.

As críticas que alguns entendidos fazem à politica de cotas, e em especial à de gênero, é tão sexista e machista, quanto os chamados ignorantes afirmam.
Em um país de alta desigualdade social e uma cultura ideológica que coloca um gênero no controle e no poder de outro, não só as cotas são necessárias, como a correção e igualdade em salários e condições de trabalho se fazem necessários.
Esta semana dois fatos chamaram a atenção e que colocam em xeque a cultura sexista. O primeiro deles foi assunto nas redes sociais por vários dias. Uma foto de uma reunião do elenco do programa Porta dos Fundos, com os atores e diretores da empresa, pousando em sorrisos para a máquina.
Detalhe: todos eram homens e brancos. Não havia uma mulher na mesa e muito menos um negro. E olha que estamos nos referindo a um coletivo ideologicamente de esquerda e progressista.

O outro fato que também repercutiu por um tempo, diz respeito à reclamação das deputadas da Assembleia Legislativa de São Paulo, quanto à escolha do relator no processo de cassação de Arthur do Val, o Mamãe Falei. As deputadas, e com razão, denunciam o fato de que o relator, principal cargo na comissão de cassação, é um homem. Ou seja, é um macho que julgará outro macho de prática de sexismo.

Não faço juízo de valor, mas com um quadro de preconceito de gênero, no mínimo cabe a uma mulher que sabe o que é sofrer sexismo, o direito legítimo de relatar o assunto. Na semana que vem vamos nos deter nas propostas para o combate encerrando esta série.

Até lá.

João Geraldo Lopes Gonçalves é escritor e consultor político e cultural

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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