O grito de Vini Jr. é o nosso!

Por Carlos Chinellato

Vini Jr. é um garoto preto, como tantos Brasil afora, descamisados, desassistidos, tidos como suspeitos em tudo, mortos. Ele saiu de São Gonçalo, no Rio de Janeiro, para sonhar com o futebol, no Flamengo. Aos 18 anos, foi para a Espanha. Hoje, aos 22, se transformou desde o domingo (21/05) em uma referência brasileira na luta antirracista, um verdadeiro ícone.

Olha, o gesto deste menino no campo do Valência foi algo notável, ímpar nesta luta. Algo que eu nunca havia presenciado. Impressionante, como um jogador já bilionário, tenha assumido um papel em que a maioria optaria pelo silêncio, conformismo e a falta de posicionamento. Sem falar dos omissos, covardes, que permeiam uma sociedade brasileira cada vez mais hipócrita.

Mais do que assumir, foi algo vibrante vê-lo com tamanha força no enfrentamento – num terreno sórdido do preconceito racial. Esta coragem, certamente, veio de uma alma sofrida de há muito, não só nos campos de futebol espanhol, onde se escancarou o fascismo e a violência racial do homem branco.

Brasileiro, Vini Jr. viveu até os 18 anos em um país marcado pelo processo de escravidão mais duradouro das Américas. Foram mais de três séculos de horror, que resultaram, de um lado em um povo ainda acorrentado na luta diária do preconceito, e do outro lado uma casta de indecentes, preconceituosos que vemos por aí todos os dias.

Foi coincidência! Tardiamente, assisti, no mesmo domingo, o celebrado filme brasileiro, “Que horas ela volta?”, em que Regina Casé dá os seus pulos para sobreviver como empregada doméstica na mansão de um casal da elite paulistana. Despertou o preconceito brutal da cor, quando a filha da personagem de Casé se banha na piscina da casa com o filho do casal. A madame, mãe do garoto, tratou rapidamente de trocar a água da piscina no dia seguinte, sob a desculpa de ter visto um rato boiando. O rato, na verdade, era a filha da doméstica preta vivida por Casé.

Celebro as reações positivas e solidárias em favor de Vini Jr. Foi ótimo ver um governo brasileiro atento e rápido ao se manifestar e agir sobre tal intolerância. Assim, como tantos outros, até mesmo o gesto dos hipócritas que lideram o futebol por aqui e acolá.

Mas não há nada mais positivo do que celebrar a atitude de Vini Jr.. Seu gesto pode ser um divisor de águas, necessário e urgente para mudarmos esse cenário em que humanos pretos são chamados de macacos e tratados à margem da sociedade.

Um salve para Vini Jr.

Carlos Chinellato é jornalista.

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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