Cota solidariedade: importante mantê-la

Por João Geraldo Lopes Gonçalves

A habitação é, de acordo com a Constituição Federal, um direito básico de qualquer cidadão no Estado Democrático de Direito. O preceito constitucional não admite que um brasileiro ou uma brasileira tenham seus direitos básicos e fundamentais tolhidos e excluídos de seu acesso.

No Brasil o drama dos Sem Teto e dos Sem Casa é uma realidade que remonta nos tempos do segundo império, quando ocorre a abolição da escravatura e milhares de famílias negras ficaram sem casa e sem emprego.

A responsabilidade do Estado com moradia só vai acontecer, por incrível que pareça, com a criação do Banco Nacional de Habitação – criado pelo regime militar. Antes, o que tínhamos para parcelas pobres e excluídas do país eram programas assistenciais criados pela Igreja Católica, a partir dos anos 50, com experiências do cardeal Dom Helder Câmara, no Rio de Janeiro, e outras. Já a partir dos anos 80, com programas como das COHABs e outros governamentais, tivemos um combate ao déficit habitacional nas cidades.

Em Limeira, só para citar alguns exemplos: Jardim Morro Azul, Vista Alegre, Cecap e Parque Nossa Senhora das Dores surgiram nesta transição do BNH e os programas estaduais.

Mas vêm os terríveis anos 90, com a alucinada e criminosa especulação imobiliária, que aliada à crise econômica, levou milhões a situação de miséria.

Aí surgem os Sem Casa.

Em nossa cidade, esta realidade nos pegou já no final da década de 80. Praticamente sem programas habitacionais que contemplassem as camadas mais pobres, nos deparamos com uma legião de famílias morando de aluguel, de favor ou, pasmem, nas ruas.

O Movimento dos Trabalhadores Sem Casa, com a liderança do saudoso ex-vereador Nelson Caldeiras, surge neste período, cumprindo seu papel legítimo de organizar e lutar pelos seus direitos. Surgem destas lutas, empreendimentos populares como Ernesto Kuhl, Nova Conquista, José Cortez e outros.

Mas a retomada em programas populares de Habitação ocorreu no “Minha Casa, Minha Vida”, na primeira metade e início da segunda deste século. Faixas de zero a três e de três a seis salários mínimos que há muito tempo não tinham acesso a habitação popular passaram a tê-lo. Surge, para exemplificar, o Residencial Rubi em Limeira.

Todo este histórico realizado é para constatar que, se não houver a participação do Estado em promover a construção de moradias, vamos só aumentar o exército de sem casas. Ao ler matéria do DJ do dia 27 de abril, fiquei surpreso com o projeto de lei apresentado pelo vereador Francisco Maurino dos Santos, o Ceará, que excluí do Plano Diretor do Município a Cota Solidariedade.

A iniciativa, apresentada pelo Governo Hadich, faz com que todo e qualquer loteador que optar em construir habitações com metragem de 200 metros venha a destinar 4% do total de lotes para um banco de terras, que será destinado a outros empreendimentos do Município. É o que chamamos de contra partida da iniciativa privada.

O que me surpreendeu, e até assustou, é que ao propor exclusão da lei, Ceará tira uma das possibilidades do Município de ter recursos para novos projetos, indo em desencontro com a própria origem do vereador, que foi um sem casa.

O mesmo também foi loteador e sabe da necessidade de buscar aumentar a oferta de moradias, para assim combater o déficit que cresce muito. Os argumentos de que a cota carece o imóvel, não procede. Caso isto ocorra, cabe à Prefeitura e à sociedade civil denunciar o empreendedor que faça isto.

A outra justificativa é que a lei não trouxe benefícios para a cidade. Porém, Ceará não sabe explicar sua própria afirmação, como demonstra em matéria do DJ. Penso que o nobre vereador deveria retirar sua propositura, pois ela vai na contramão da tendência mundial em tempos de pandemia e pós-vírus: a solidariedade.

Abaixo link da reportagem do DJ, citada no texto:

https://diariodejustica.com.br/ceara-propoe-excluir-exigencia-de-cota-solidariedade-em-loteamentos-de-limeira

João Geraldo Lopes Gonçalves, o Janjão, é escritor, consultor político e cultural

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