Por Carlos Gideon Portes e Felipe Zalaf

Nesta semana, foi encerrado o julgamento do RE nº 574.706/PR, cujo resultado, e por maioria de 8 votos, houve por bem ao Supremo Tribunal Federal modular os efeitos do julgamento que determinou, acertadamente, que o ICMS destacado nas notas fiscais não compõe o faturamento e, portanto, não integra as bases de cálculo das contribuições ao PIS e à COFINS.

A resposta à pergunta que propusemos num momento anterior acabou sendo dada, massacrando o princípio da segurança jurídica, e impossibilitando que os pagadores de tributos que ajuizaram ações com vistas a recuperar uma parte do dinheiro indevidamente recolhido em favor da União em data posterior ao julgamento do mérito do RE nº 574.706/PR, ocorrido em 15/março/2017, tenham o direito de retroagir o cálculo dos créditos aos 5 anos anteriores à data do ajuizamento.

O que a pandemia tem a ver com isso? Se pensarmos na pandemia com a qual convivemos ultimamente e na quase impossível possibilidade de confirmação do ‘lastimável’ estado financeiro dos cofres públicos, que não tem dinheiro para dar cumprimento às necessidades básicas da sociedade brasileira, mas tem recursos para custear toda a administração, com todos os benefícios (e são muitos), continuaremos sem resposta.

Se pensarmos, contudo, na pandemia jurídica que inoculou um vírus no princípio da segurança jurídica, temos a possibilidade de entender o que o STF fez ao concluir o julgamento.

De uma maneira bem simples, já em março/2017, o STF delimitou o conceito de faturamento dizendo para a União que o ICMS não poderia ser incluído nesse montante, pois se a Constituição não concedeu essa permissão, a lei não poderia fazê-lo.

Ao contaminar o princípio da segurança jurídica e modular os efeitos da decisão, restringindo sua aplicação a todos aqueles que buscaram a proteção do Poder Judiciário, mesmo com a limitação retroativa de 5 anos, o STF premiou a União, que se enriqueceu indevidamente e não será obrigada a devolver o valor recebido, ou a permitir, mediante a fiscalização da Receita Federal, a compensação dos créditos.

O resultado interno é avassalador, principalmente nesse momento de tentativa de recuperação da economia, mas o resultado externo não pode ser desprezado, por reduzir a credibilidade do país frente ao interesse de investidores internacionais.

Como é possível crer num país cujo Poder Judiciário reconhece que houve a cobrança indevida de um tributo, mas não condena a União a devolver esse valor integralmente?

Como advogados, empresários, empreendedores individuais e pessoas físicas, lutamos, há anos, contra injustiças do sistema tributário pátrio.

O governo edita leis e mais leis que dão nomes diferentes ao suado dinheiro que entram nos cofres das empresas (faturamento, folha de pagamento, lucro etc.) e, sobre cada fatia, derivada de um mesmo montante, institui uma pesada tributação.

Legal? Aparentemente sim, dependendo do entendimento do Poder Judiciário mediante provocação do particular?

Moral? Paira a dúvida!

Bertolt Brecht escreveu:

“Há homens que lutam um dia e são bons.
Há outros que lutam um ano e são melhores.
Há aqueles que lutam muitos anos e são muito bons.
Mas há os que lutam toda a vida: esses são os imprescindíveis.”

Sempre lutaremos, contra as pandemias que queiram minar nossa saúde física e mental, mas devemos ser imprescindíveis na batalha quando essas pandemias minam estruturas que afetam a justiça que deve ser distribuída de modo igual, ao Estado e ao particular.

A legalidade tem de ser barrada pela moralidade. O que nasceu inconstitucional não pode ter efeitos preservados.

O que não é certo, não é certo. É isso o que os pais ensinam aos filhos. É isso que o país espera de nós: que façamos o que é certo. Simples assim!

Continuamos esperando pela cura da pandemia!

Carlos Gideon Portes (carlos.gideon@zalaflimeira.com.br) é coordenador da área tributária e Felipe Zalaf (felipe@claudiozalaf.com.br) é sócio no escritório Cláudio Zalaf Advogados Associados.

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