Pílulas

Por João Geraldo Lopes Gonçalves

A tragédia anunciada feito um tango

O tango, um dos ritmos mais famosos do mundo, tem sua origem no final do século XIX, nas cidades de Buenos Aires na Argentina e Montevidéu no Uruguai. Nasce às margens do Rio de Prata e, dizem a lenda, em prostíbulos ali localizados. Sua característica trazia uma dança, onde o par ficava colado ao corpo do outro, exceto o rosto, pois até 1910 só aos homens era permitido praticar o tango, e aí justifica a atitude.

Na melodia, trazia um arranjo regional do Uruguai, em que a tristeza e o desespero tomavam conta, unindo a uma letra trágica, onde as histórias de amor sempre terminam mal. A dança, embora sensual, nos parece uma batalha entre os parceiros, uma luta, uma guerra, que tem um final maléfico.

Na Argentina, o tango se populariza. Primeiro nos subúrbios e casa de divertimentos para adultos. Depois as elites enxergam o ritmo, status e dinheiro, e aí o salão governamental e endinheirado recebe a tragédia em forma de arte.

O tango se parece muito com Javier Milei, próximo presidente dos hermanos argentinos. Milei é economista e se define como ultraliberal, daqueles que não se importa em privatizar tudo, desregular as finanças do País, e dolarizar sem ter dólar.

Na outra ponta, é um adepto ao fundamentalismo radical, detonando sua veia, misoginia, racista e por aí vai. Mas MiIei, como sua versão no Brasil do mandato passado, gosta de aparecer como um diferenciado.

Nosso Messias se achava ser o próprio dos evangelhos, ungido para mudar o Brasil, caçar gays, colocar mulheres na boca do fogão, negros na senzala, negar tudo que lhe convém, como as vacinas, a terra é redonda e por aí vai.

Milei é chucro e grosso feito seu afeto em terras brasileiras e tem a capacidade de ressuscitar seu cachorro, o clonando quatro vezes e os tratando melhor que um ser humano. No Brasil, o último ditador João Baptista Figueiredo dizia que preferia cheiro de cavalos a pessoa humana.

Javier prefere cães e, em 2017, chorou a morte de Conan, o qual com seu DNA clonou os 4 filhos de quatro patas, como ele chama os pets. Os animais têm nomes de economistas famosos, defensores da Anarcoeconomia.

Milei apresenta um tango com uma tragédia de proporções inimagináveis, como a já citada aqui dolarização da economia e a comercialização de órgãos humanos e, claro, o fechamento do Banco Central.

Daqui alguns dias a ultradireita extrema toma posse em um País que tem uma inflação batendo a porta dos 130% ao ano, mergulhado em uma crise econômica sem precedentes.

A incerteza está no ar.

Tarcísio, o privatizante

Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, pode não ser um bolsonaristas raiz, sobretudo na área de costumes. Mas no que tange a economia, ele se assemelha a Javier Milei da Argentina. Sua sanha em vender o patrimônio público assusta o mais liberal dos liberais.

Durante a campanha eleitoral, sustentou o tempo todo que São Paulo cresceria ainda mais, se tudo fosse privatizado. E no trono do mandato, o amigo do inelegível coloca em prática, tendo a Sabesp, nosso sistema de água esgoto de maior eficiência e faturamento, como seu primeiro alvo.

Recentemente o portal UOL publicou matéria, dizendo que a rede Metrô privatizada rende monetariamente quatro vezes mais que a rede pública. No entanto, quem tem o maior público é o Metrô Estatal. Como isto ocorre?

É simples, o preço da tarifa mais barata no público e um serviço de excelência. Na primeira greve dos metroviários contra as privatizações, o sistema privado não conseguiu absolver a demanda de passageiros, travando as linhas. Só para ilustrar o tema, no Rio de Janeiro toda rede de metrôs é da iniciativa privada, e a tarifa é a maior do Brasil

Esta sanha desvairada de Tarcísio e seus asseclas nos fazem perguntar: a quem interessa a privatização, se na prática ela encarece o serviço, e não faz investimentos capazes de mostrar a tal de eficiência pregada pelo governo?

As últimas chuvas de verão mostram, infelizmente, como nosso sistema elétrico privatizado está sucateado, onde milhões ficaram sem energia por dias. Chegou a hora da sociedade entrar neste debate entre Estatizar e Privatizar.

Congresso, STF e Flávio Dino

Até a Constituição de 1988, o Supremo Tribunal Federal estava longe de ser conhecido pela população. Na ditadura, os militares mudam o sistema jurídico. Não era mais a Constituição que regia o País, e sim os Atos Institucionais, decretos, e atitudes nada republicanas.

O papel do STF de interpretar a Constituição e garantir que ela fosse cumprida foi jogado ao léu. Os ministros da corte maior eram meros homologadores das decisões dos militares, onde o Tribunal Militar é quem julgava e decidia.

Em 88, com a Constituição Democrática e Cidadã, o STF volta a ter a autonomia e a independência que deve ter com um poder da República. Mas a partir dos anos 2000 com o processo do mensalão, a corte passa a utilizar de métodos que confundem com o Legislativo e o Executivo. Em especial decisões monocráticas, que para alguns consistem em uma interferência nas funções de outros poderes.

Rodrigo Pacheco, presidente do Senado Federal, liderou uma ação no Senado de uma PEC para regulamentar a Suprema Corte, no quesito de limitar decisões monocráticas. A aprovação da PEC abre um debate acirrado entre Senado e os ministros do STF, radicalmente contrários a medida, que tem que ser aprovada pela Câmara dos Deputados.

No entanto, nos anos de um miliciano genocida no poder, foi a Suprema Corte que evitou a derrocada do Estado Democrático, enterrando as tentativas de golpe. Por outro lado, decisões tomadas se confundem, como já dissemos, com os demais poderes.

Penso que quando um poder não funciona, o outro precisa reagir.

Mais um debate aberto.

Um capítulo que adiciona a este assunto é a indicação do atual ministro da Justiça Flávio Dino. A oposição e outros sustentam a ideia da partidarização do STF.

Dino, em entrevistas diz que, como ministro da corte maior vestirá a roupa da independência quanto a partidos. Será?

O caciquismo ainda sobrevive no futebol

Nos últimos anos, temos nos acostumados com a palavra SAF (Sociedade Anônima de Futebol), que invade noticiários e as resenhas de torcedores.

As SAFs são grupos econômicos, ou um investidor, como é no Cruzeiro e no Botafogo, que compram o futebol de clube e fazem sua gestão. A parte associativa continua com a diretoria original do clube.

A moda pegou que até times do interior, como a nossa Inter, querem aderir às SAFs.

Se do ponto de vista das finanças ela resolve, do outro ponto de vista, o do futebol, elas ainda não mostraram eficiência, exemplo disso é o Vasco e o Cruzeiro, ameaçados do rebaixamento no Brasileiro.

Mas o modelo com certeza enterra o cacique, o dono do clube, o todo poderoso.

A administração amadora e controlada a mão de ferro trouxe resultados como corrupção, falência financeira e bagunça na gerência do futebol.

Eurico Miranda é um exemplo da figura que centralizava decisões com autoritarismo e arrogância na presidência do Vasco da Gama. Fica a sugestão para o internauta assistir a série documental em cinco episódios “A mão do Eurico”, na Globoplay.

Se alguém acha que o caciquismo acabou, é só olhar que no Corinthians Andrés Sanchez comandou por quase duas décadas, e no Atlético Paranaense, Mario Cesar Petraglia continua há três décadas à frente do Furacão.

Ainda é cedo para afirmar que o futebol-empresa dará certo, mas que as gestões monocráticas e familiares mostraram que já estão superadas, isto é um fato. Que venha dezembro.

A todas e a todos, um feliz bom final de semana.

João Geraldo Lopes Gonçalves, o Janjão, é escritor e consultor político e cultural.

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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