Justiça vê violação de domicílio e absolve réu em Limeira

A Justiça de Limeira analisou nesta segunda-feira (22/4) uma ação penal contra um réu por tráfico de drogas e posse ilegal de arma de fogo. Para o juiz Rafael da Cruz Gouveia Linardi houve violação de domicílio na ação policial e, por isso, as provas foram consideradas ilegais. O acusado foi absolvido.

Os policiais que participaram do flagrante informaram em juízo que receberam informações anônimas sobre armas e tráfico de drogas no endereço do réu, apontando ainda que o réu pertenceria à “alta cúpula” da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). Quando se aproximaram da casa do acusado, encontraram ele na via pública e havia um volume estranho na cintura dele, mas nada de ilícito foi localizado.

Ele teria autorizado a entrada na residência, gravou a permissão e, no imóvel, foram localizadas duas armas de fogo, uma delas com a numeração apagada e a outra intacta. Munições também foram encontradas. Em continuidade às buscas, os policiais apreenderam 105 porções de maconha escondidas em um buraco de esgoto, embaladas individualmente. Eles disseram que o réu confessou o tráfico de drogas. O Ministério Público (MP) pediu a condenação.

DEFESA
A defesa sustentou, inicialmente, ilicitude na busca pessoal e ausência de autorização para ingresso no imóvel. No mérito, pediu absolvição por insuficiência de provas.

O réu depôs em juízo, negou a posse das armas e das drogas encontradas em sua casa. Confirmou que foi abordado na via pública, mas não estava em atividade de tráfico ou em atitude suspeita. Sobre o vídeo que gravou permitindo a entrada dos policiais em sua casa, afirmou que foi coagido.

JULGAMENTO
Ao analisar as duas versões, o magistrado levou em consideração a abordagem feita em via pública e chegou à conclusão que não apresentou razões que permitissem, em seguida, o ingresso na residência do réu. “A situação de flagrante deve ser indicada ou deduzida pelas circunstâncias fáticas antes de qualquer ingresso em domicílio, sob pena de se admitir que invasões arbitrárias possam ser tomadas, sacrificando-se a garantia constitucional. Exige-se que os elementos fáticos anteriores ao ingresso no domicílio permitam inferir, com o mínimo de razoabilidade, a situação de flagrante a excepcionar a exigência de prévia ordem judicial. […] Ainda que tal denúncia anônima pudesse justificar a abordagem, é certo que nada foi encontrado com o réu, e o suposto ‘volume’ que mantinha nas calças era apenas seu aparelho de telefonia celular. Por tal razão, ou seja, pelo fato de nenhuma situação de flagrante ter sido verificada por ocasião da abordagem na rua, mostra-se intrigante a suposta autorização do acusado para que os policiais militares ingressassem em sua residência. Ora, tratando-se de réu que ostenta condenações criminais e a condição de ex-detento, é da experiência comum tratar-se de pessoa conhecedora dos direitos relacionados às abordagens policiais, e, diante de tal circunstância, não há qualquer lógica em se acreditar que iria, em plena madrugada, autorizar a entrada de policiais em sua casa para vasculhar e procurar drogas e armas, especialmente porque em assim fazendo, encontrariam produto de crime (que realmente existe), o que significaria, de forma inexorável, autoincriminação gratuita”, mencionou o juiz na sentença.

Linardi descreveu também que, como houve violação do domicílio, as provas ficam prejudicadas. “De notar-se o Poder Judiciário não é órgão de segurança pública, que deve simplesmente avalizar as ações de combate ao crime, tratando-se de instituição responsável pelo resguardo da ordem jurídica e da Constituição, e ainda que o réu se trate de mau elemento, não há como se excepcionar em seu desfavor uma situação de ilegalidade, sob pena de se abrir as portas da prepotência estatal em desfavor dos cidadãos de bem. Portanto, o que se conclui, pelas circunstâncias da ação policial, é houve ingresso indevido no domicílio, dado que o fundamento exclusivo utilizado pelos policiais foi o fato do acusado ser tido como integrante do PCC, e portanto, pessoa suspeita. Mas note-se que a exceção constitucional à inviolabilidade domiciliar não apresenta qualquer requisito, ou seja, não traz qualquer permissivo no sentido de que pessoas suspeitas possam ter o domicílio violado a qualquer momento, ainda que sem mandado judicial. O requisito é objetivo, qual seja, situação de flagrante devidamente evidenciada, não bastando para tanto o argumento de que a posse de drogas e armas seria crime permanente, já que os indícios de flagrante devem ser anteriores ao ingresso, não sendo possível a simples corroboração ‘a posteriori’. Desta feita, ante a nulidade da ação que permitiu a apreensão das drogas na casa do réu, não havendo quaisquer outras provas que permitam a condenação, impõe-se ao caso a absolvição por insuficiência probatória”, concluiu.

O MP pode recorrer ao Tribunal de Justiça de São Paulo contra a sentença de absolvição.

Foto: Pixabay

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