Gestão do SUS: Iracemápolis contesta valores pagos à empresa e quer devolução

A Vara da Fazenda Pública de Limeira acolheu, no dia 24, o pedido de Iracemápolis para que uma empresa que fez a gestão da saúde no Município apresente contas. O Executivo, que ingressou com a ação em 2020, alegou ter feito pagamentos, mas que não houve efetiva comprovação de prestação dos serviços e do fornecimento de produtos, além de eventuais irregularidades relacionadas a contratações de pessoas físicas e jurídicas. O Executivo cobra devolução de valores.

A empresa, mediante chamamento público, firmou contrato com Iracemápolis em 2014 para gestão de serviços da saúde, como do pronto-atendimento, do Samu, Caps, unidade de Saúde da Família e Programa Melhor em Casa.

O prazo inicial dos serviços era de 12 meses pelo valor global de R$ 9,2 milhões. O acordo chegou a ser prorrogado por mais de uma vez, por meio de termos aditivos, e encerrou em 2018, sendo repassados à empresa R$ 11 milhões.

Na inicial, Iracemápolis menciona que instaurou sindicância para apuração de eventuais irregularidades e responsabilidades de agentes públicos na execução do contrato. A apuração foi baseada, também, em inquérito civil instaurado pela Promotoria de Justiça do Patrimônio Público de Limeira e de processos no Tribunal de Contas do Estado (TCE). Em seu relatório final, a sindicância apontou “existir presença de forte controvérsia jurídica quanto ao tema da possibilidade de terceirização da Saúde Básica Municipal”. Quanto à ocorrência de falta funcional de servidores públicos, objeto da sindicância, sugeriu pela não ocorrência, mas pelo cabimento de ação judicial e razão do descumprimento do dever contratual de prestação de contas.

AÇÃO
O Executivo contesta na ação a contratação, pela empresa, de duas pessoas a quem foram repassados, respectivamente, R$ 105.971,03 e R$ 98.874,19 dos cofres públicos. “Restou apurado em sede de sindicância administrativa inúmeras divergências e questionamento lançados em relação às contratações levadas a cabo pela requerida, como a que envolve uma clínica médica, que mais recebeu valores da ré durante a vigência do contrato de gestão, e foi contratada para realização de um serviço de Coordenação Médica, enquanto a municipalidade mantinha médicos concursados realizando o mesmo trabalho”, menciona o Município.

Iracemápolis apontou ainda que já houve questionamentos à empresa sobre a exatidão das contas relacionadas com a clínica contratada pela ré, “pois não prevalecem quando confrontadas com os números de plantões realizados pelos médicos concursados do Município, existindo, em junho de 2015, uma diferença a ser restituída pela empresa no importe de R$ 54.750, o que, a se confirmar, multiplicado pelo número de meses em que teria ocorrido ou não tais serviços [32 meses], resultaria na expressiva importância de aproximadamente R$ 1,752 milhão a ser objeto de ressarcimento”, mencionou.

O Município ainda aponta que não há documentos que comprovem a exatidão de valores entre os exercícios, o que resultaria em diferenças a favor do municipalidade de R$ 159.189,80 em 2014, R$ 16.652,24 em 2015, R$ 190.845,15 em 2016, ou seja, um total de R$ 366.687,19.

À Justiça, Iracemápolis requereu a condenação da empresa para prestar contas e, ainda, ao dever de restituir os valores que forem devidos ao Município.

O OUTRO LADO
Citada, a empresa contestou a ação e alegou prescrição, pois foi citada em outubro de 2021. Estão irremediavelmente prescritos todos os direitos e pretensões que transcendem ao quinquênio que antecedeu sua propositura, quais sejam, todas e quaisquer pretensões que tenham por fundamento pretensos direitos havidos anteriormente a 10 de outubro de 2016”, defendeu-se.

No mérito, declarou que diversos dos apontamentos feitos pelo Município não refletem a necessidade de apresentação de qualquer documento e são apenas referências à entendimento do órgão oficiante acerca da regularidade, necessidade e oportunidade de algumas contratações. “Toda a gestão realizada pela requerida, conforme apurado pela comissão instituída pela autora, inclusive pagamentos pela mesma realizados, eram trimestralmente aprovados pela comissão de fiscalização da gestão e anualmente submetidos à verificação da administração pública, submetendo-se, assim, à dúplice fiscalização, além da autora também ter se resguardado sobre a possibilidade de fiscalização do contrato à qualquer tempo, a seu alvedrio, e todas as informações adicionais solicitadas foram imediatamente respondidas, mediante formal protocolo, com comprovante de sua recepção pela autora”, completou.

Mencionou também não ser responsável para ter de suprir eventual omissão do Município quanto aos documentos que já entregues, “devendo a requerida exigir de seus serviçais a localização dos documentos comprovadamente e confessadamente já lhe apresentados, de maneira que a pretensão formulada é de todo improcedente”.

A empresa negou a existência de “sobras” entre os exercícios e que, em 2016, as partes estabeleceram um plano de recuperação financeira para o Município com relação à gestão da saúde pública, ocorrendo a redução gradativa do quadro de prestadores até o encerramento definitivo do contrato, “de forma à atender as necessidades do município parceiro e os valores recebidos eram, no que respeita à totalização dos recebimentos anuais, auditado por auditoria externa da requerida, em cumprimento à previsão da Lei nº 9.637/98, também o eram pela Administração Pública nas oportunidades de prestação de contas anual e, trimestralmente, pela comissão de gestão constituída pela própria autora”, apontou.

Quanto a contratação de pessoas, afirmou que as duas não eram terceirizadas, mais funcionárias. Quanto à clínica, afirmou que as atividades exercidas correspondiam às atribuições de diretoria técnica, “atribuições estas diferentes das exercidas pela diretoria clínica exercida pelo médico diretor clínico concursado, já o município não possuía qualquer profissional a exercer referidas atividades e as mesmas, efetivamente, jamais foram exercidas pelo médico da autora que, na verdade, exercia função de médico diretor clínico. Informa que a autora mantinha e remunerava a diretoria clínica e a requerida mantinha e remunerava a diretoria técnica”, finalizou.

JULGAMENTO
A ação foi analisada pelo juiz auxiliar Ricardo Truite Alves e nesse tipo de ação há duas sentenças: a primeira delas para determinar a existência ou inexistência do dever de prestar contas e a segunda é para eventual execução do saldo devedor apurado. “Não se olvida que o caso vertente encontra-se na primeira fase, cingindo, portanto, a apreciação ao direito de serem exigidas as contas pelo autor em face da ré”, mencionou Alves.

O juiz entendeu que a empresa, nesse momento, deve apresentar contas. “Como a ré foi contratada para gerir e executar programa municipal, fica evidente a existência da obrigação de prestar contas, considerando que aquelas prestadas no âmbito administrativo se revelaram insuficientes”.

O magistrado deu prazo de 15 dias para que a ré apresente, de forma contábil, com a juntada de documentos e justificativas pertinentes, as contas sob pena de não lhe ser lícito questionar as apresentadas pelo Município. Cabe recurso.

Foto: Denis Martins/Diário de Justiça

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