Estamos na pré-campanha: o que pode e não pode?

por Amilton Augusto
O tempo passa rapidamente e nos aproximamos de mais uma eleição; como tenho repetido, a mais polarizada da história desse país, unindo diversas preocupações, especialmente com o desdobramento do processo eleitoral num cenário de intensa utilização das novas tecnologias, especialmente as redes sociais e grupos de whatsapp e Telegram, cujas narrativas tornam um vulto ainda maior, ameaçando, por certo, a lisura e moralidade do pleito.

Nesse cenário, cabe-nos analisar o que pode e o que não pode nesse período que antecede o início da campanha eleitoral, que ficou conhecido como pré-campanha, período em que quase tudo é permitido no que tange a aproximação entre pretensos candidatos e futuros eleitores, desde que haja um mínimo de respeito a legislação eleitoral e a proibição total do pedido explícito do voto.

Como é cediço, a propaganda eleitoral é aquela onde o candidato busca diretamente conquistar o voto do eleitor e tem início a partir de meados de agosto do ano eleitoral, ocasião em que o candidato sai às ruas com a finalidade de cooptar licitamente a vontade do eleitor na busca do poder, podendo ser praticada, até o dia das eleições, guardadas as devidas proporções, através dos meios de comunicação, da imprensa escrita, da internet e do corpo-a-corpo, com a realização de comícios, reuniões, passeatas, carreatas, etc.

Então, com as alterações trazidas pela Reforma Eleitoral de 2017 veio o conceito de pré-campanha, como forma de ampliação, fora do período de campanha, às restrições impostas à propaganda eleitoral, trazendo o artigo 36-A da Lei das Eleições a autorização dos seguintes atos, desde que não haja pedido explícito de votos:

Autorização para o pré-candidato expor sua futura candidatura;
A exaltação das qualidades pessoais;
A participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na TV e na Internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, garantida a isonomia;
A realização de encontros, seminários ou congressos, em ambiente fechado e às custas dos partidos, para tratar da organização dos processos eleitorais, discussão de políticas públicas, planos de governo ou alianças partidárias para às eleições;
A realização de prévias partidárias e distribuição de material informativo, a divulgação dos nomes dos filiados que participarão e a realização de debates entre os pré-candidatos;
A divulgação de atos de parlamentares e debates legislativos;
A divulgação de posicionamento pessoal sobre questões políticas, inclusive nas redes sociais;
A realização, às custas do partido, de reuniões de iniciativa da sociedade, de veículo ou meio de comunicação ou do próprio partido, em qualquer localidade, para divulgar ideias, objetivos e propostas partidárias;
Arrecadação prévia de recursos, através de financiamento coletivo (crowdfunding ou vaquinha virtual).

Entre as novidades trazidas e já aplicadas a partir das eleições de 2018 está a possibilidade de arrecadação prévia de recursos pelo crowdfunding, que poderá ser feita, a partir de março, através das entidades cadastradas no TSE. Nesse sistema, a liberação dos valores arrecadados fica condicionada a apresentação do registro de candidatura, caso em que havendo desistência da candidatura por qualquer motivo, a entidade arrecadadora deverá devolver aos doadores os valores arrecadados.

As entidades arrecadadoras são responsáveis, em solidariedade com o candidato e o partido, pela verificação das doações e suas origens, uma vez que um dos requisitos para a adoção do sistema de crowdfunding é a não incidência em quaisquer das hipóteses de vedação listadas na legislação eleitoral, que são: a) pessoa jurídica; b) origem estrangeira; e c) permissionário de serviço público.

Verifica-se que a pré-campanha é a possibilidade que o pré-candidato tem de colocar seu nome em evidência e trabalhar sua futura candidatura de forma a ganhar visibilidade, fugindo das restrições colocadas à propaganda eleitoral, que fez com que a festa da Democracia se tornasse algo tão distante do seu principal destinatário: o eleitor.

Desse modo, o TSE, no julgamento do AgR-AI nº 9-26/SP, durante análise das regras das Eleições de 2018, definiu para caracterização da propaganda eleitoral antecipada, os seguintes parâmetros: Existência de pedido explícito de votos, independente da forma ou da existência de gastos de recursos; e atos publicitados notadamente eleitorais com uso de recursos financeiros de modo desmoderado ou através de instrumentos vedados no período de campanha, mesmo que sem pedido explícito de votos.

Definiu-se, assim, como caracterização dos denominados atos de pré-campanha, autorizadores de atos que não configuram propaganda eleitoral antecipada: atos publicitários não eleitorais, cujo conteúdo não se relacionam com a disputa eleitoral, com vistas a promoção pessoal, que podem ser realizados em qualquer forma e com utilização de recursos financeiros, denominados “indiferentes eleitorais”; e atos publicitários notadamente eleitorais, cujos gastos realizados sejam moderados e sua forma de publicidade seja pelos instrumentos permitidos no período de campanha, desde que não haja pedido explícito de voto.

Em conclusão, diante de todo contexto da propaganda eleitoral que, a cada dia se torna mais virtual e, com a ampliação do período pela previsão do artigo 26-A, da Lei das Eleições, que nenhum alteração sofreu nos anos subsequentes, ganha o pré-candidato e o eleitor, pois aquele poderá melhor divulgar seu trabalho e suas intenções, voltando-se para a sua futura candidatura de modo explícito, ainda que sem a possibilidade de pedir voto antes de 16 de agosto, bem como este último terá mais oportunidades de saber quem são os candidatos e as propostas de cada um, muito antes do início da campanha eleitoral de fato. De certa forma, mesmo que de modo não convencional e ainda num cenário de grande restrição a propaganda eleitoral tradicional, ganha a Democracia!


Amilton Augusto é advogado especialista em Direito Eleitoral e Administrativo. Vice-Presidente da Comissão de Relacionamento com a ALESP da OAB/SP (Gestão 2019-2021). Membro julgador do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/RJ. Membro fundador da ABRADEP – Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (2015). Membro fundador e Diretor Jurídico do Instituto Política Viva. Membro do Conselho Consultivo das Escolas SESI e SENAI (CIESP/FIESP). Coautor da obra coletiva Direito Eleitoral: Temas relevantes – org. Luiz Fux e outros (Juruá,2018). Autor da obra Guia Simplificado Eleições 2020 (CD.G, 2020). Coautor da obra Dicionário Simplificado de Direito Municipal e Eleitoral (Impetus, 2020). Palestrante e consultor. Contato: https://linktr.ee/dr.amilton

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