Sem anistia: chega de golpes

Por João Geraldo Lopes Gonçalves

Decisão infeliz

Na noite de segunda-feira, dia 31 de março, a Câmara Municipal de Limeira decidiu por um retrocesso. No dia em que o Golpe Militar de 1964 completava 61 anos, uma moção pedindo anistia a golpista dos tempos atuais foi aprovada.

Uma das dúvidas deste escrevinhador é o que levou o jovem vereador Guilherme Guido (PL) a apresentar um texto que faz decoro com o Estado Democrático de Direito.

Não é a jovialidade do nobre causídico que seja justificativa para tal ação. Não é possível que o parlamentar não conheça a História do Brasil e em especial o golpe de 64. Se não sabe, vamos lhe informar, embora exista uma farta bibliografia sobre o assunto.

E não é difícil de achar. A nossa Biblioteca Municipal está repleta de volumes sobre o assunto.

O Golpe Militar de 1964 foi gestado nas Forças Armadas, empresários, a CIA e o governo americano desde os anos 50 do século passado. A justificativa era a ameaça comunista, algo que nunca ocorreu nem ontem, nem hoje. Tanto o Governo Lula quanto o de João Goulart não são comunistas.

Na real, os interesses em jogo eram econômicos e de domínio imperialista americano sobre os países do chamado terceiro mundo.

O golpe destituiu um governo legitimamente eleito nos ditames Constitucionais e instalou uma ditadura que durou 21 anos. Um regime de violência, que matou e desapareceu com mais de 10 mil brasileiras e brasileiros que lutavam por liberdades democráticas. Um sistema que economicamente atrelou o Brasil ao Fundo Monetário Internacional e criou bolsões de miséria os quais tentamos diminuir até hoje.

As torturas da Operação Bandeirantes dos Doi-Codis e outros aparelhos do governo foram responsáveis por desestruturar centenas de famílias. Vamos pensar o que é você não poder fazer o luto e enterrar seus entes queridos. Isto ocorreu.

Como sugestão, assistam o filme Ainda Estou Aqui nos cinemas da cidade. Portanto, foram 21 anos de cerceamento do ir e vir, de mortes e muita tristeza.

E não me venham com argumentos fracos e chulos. Por exemplo, de que a ditadura foi ruim para baderneiros comunistas e que não queriam trabalhar. Parem de repetir a cantilena de Bolsonaro, figura nefasta à nossa cultura e memória histórica. Os algozes, comandantes, torturadores da ditadura foram todos anistiados, ninguém foi para o xilindró.

Um erro com o País, algo que nossos irmãos argentinos não permitiram que ocorresse. Lá, foram sete anos de ditadura com mais de 30 mil mortos e desaparecidos. O primeiro governo democrático, assim que assumiu em 1983, julgou e prendeu a Junta Militar que governou o país durante o Golpe. Aqui tem torturador que passeia livremente por Copacabana.

Por isto, voltando aos dias atuais, bater na tecla que o dia 8 de janeiro de 2023 não foi uma tentativa de golpe é brincar como em um conto de fadas. Não foi um passeio de senhoras com Bíblias na mão. Muito menos um protesto pacífico.

A quebradeira na praça dos três poderes aos prédios públicos foi transmitida na TV e nas outras mídias em tempo real ao vivo e a cores.

A ideia era criar uma instabilidade nacional com ações e atos que pedissem a deposição de Lula e fechamento do STF e do Congresso Nacional. E de quebra recolocar Jair, o inelegível, imperador do Brasil.

Estão claras e provadas as intenções daquela intentona da extrema direita. A própria defesa da Anistia aos processados e condenados pela Justiça pelo crime de golpe de Estado já é confissão da culpa. Ora se você pede anistia, reconhece o erro, o crime. Por isto a moção do jovem Guilherme Guido e aprovada por 15 votos não tem sentido.

É, repito, um atentado ao Estado de Direito não responsabilizar quem tentou contra a Democracia. Quero, para terminar, parabenizar três Mulheres da Câmara que votaram contra a missiva sem sentido e absurda.

Isabely Carvalho (PT), Mariana Calça (MDB) e Tatiane Lopes (Avante), vocês foram guerreiras e coerentes. Pena que nem todas as mulheres da Casa de Leis seguiram o exemplo de vocês.

Um soco no estômago

Às vezes nós, adultos, somos surpreendidos por “novidades” que acontecem a nossa volta. Estamos no século XXI e às vezes parece que ainda estamos no século dezenove. Parece que as novas tecnologias são estranhas ainda e não afeta os que nasceram no século passado.

E penso que ignoramos mudanças de comportamento de nossos adolescentes, inclusive dentro de casa. Uma cena recorrente que ocorre em vários lares brasileiros e do mundo é significativa deste quadro.

Crianças entre oito e dezesseis anos vivem trancados em seus quartos, saindo do cômodo só para se alimentar (às vezes nem isto) e ir à escola. Muitos familiares são alheios ao que acontece com seus filhos. Muito por falta de informação deste mundo digital e informatizado.

A quantidade de aparelhos tecnológicos a disposição no mercado é imensa. Cada vez mais voltado a um público jovem. Claro que os adultos são alvo. Mas a publicidade utiliza linguagens próprias para as novas gerações. E aí você presenteia seu filho, seu sobrinho, o filho da sua amiga e por adiante com o Iphone de última geração, o videogame que quase ninguém tem.

Esta febre pelo mundo virtual e seus brinquedinhos não tem êxito só com classes ricas e abastadas. Todas as classes A a E, se deslumbram com estas maquininhas de “sonhos” aparentemente. Sim, sonhos, pois elas apresentam uma realidade que não é da maioria de nossas crianças e jovens.

Primeiro, no aspecto econômico, onde uma máquina de game é o preço de um salário mínimo. Segundo aspecto é o modismo, a linguagem que influencia comportamentos.

Então Janjão você é contra as novas tecnologias? Não, é claro. Elas vieram e assim as defendo para melhorar nossas condições de vida e trabalho. Karl Marx defendia a implementação delas para que o trabalhador pudesse ter o ócio criativo. Tempo para o lazer e para o uso da criatividade livre e sem pressão.

No entanto, nos parece que os detentores do poder econômico estão longe de pensar isto. A decisão das Big Techs (Zap, Facebook, X e outras) é liberar geral em suas redes sociais. Sem limites e aceitando tudo o que aparece. Não haverá moderação. Se eu quiser criar um grupo de extermínio de negros e LGBTs, está na boa, posso fazer.

Se governos e a sociedade civil não barrarem estes descalabros, estamos perdidos. O Brasil, com o Governo Lula e o STF, mantém firme na posição de não permitir este vale tudo. É este vale tudo que fez surgir o Trumpismo nos Estados Unidos e o Bolsonarismo no Brasil.

Uma minissérie da Netflix ilustra o que estamos tratando aqui. “Adolescência” é um verdadeiro soco no estômago que me refiro no título. Em quatro capítulos de 50 minutos em média, nos deixa tensos e zonzos o tempo todo. A película quase não tem efeitos e trilha sonora. Isto e seu roteiro nos colocam em uma realidade que não vemos ou que não damos a mínima.

Um garoto de treze anos, filho de pais de classe média, é acusado de assassinar uma garota da mesma idade de seu colégio. As investigações da polícia começam por generalizar o fato, condenar e pronto. Há uma resistência dos órgãos de segurança e justiça em entender o que se passava no mundo adolescente. Coube ao filho de um policial abrir os olhos para o que realmente acontecia.

As tecnologias e um mundo a parte eram mais importantes que convivência real. Os grupos virtuais se tornavam amigas (e se tornam) de nossas crianças. Um novo cenário é traçado nestes grupos de relacionamentos. Questões que fazem parte da fase de crescimento de uma criança como o desenvolvimento do corpo, valores humanos, sexo e outros, são atropeladas por medo e violência.

Tudo isto feito nas redes sociais. Uma linguagem de códigos, de interpretação errônea de filmes e jogos. Expressões como Incel, classificações como pílulas azul, vermelha e outras para definir um garoto, uma garota, uma amizade, relacionamento.

O celular substitui o pai, a mãe, o professor, o adulto. É hora de começarmos a prestar atenção.

Sugiro assistirem o quanto antes esta serie fantástica.

Um bom fim de semana a todas, todos e todes.

João Geraldo Lopes Gonçalves, o Janjão, é escritor e consultor político e cultural

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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