O caminho do meio

Por Leandro Consentino

Na semana passada, Emmanuel Macron foi reeleito presidente da França em uma vitória maiúscula sobre sua adversária Marine Le Pen. O triunfo de Macron vai muito além de uma mera eleição presidencial e invoca uma série de significados importantes para a República Francesa, para o continente europeu (especialmente, em seu projeto de integração) e para os países democráticos ao redor do mundo.

Cumpre pontuar, antes de mais nada, que, embora houvesse muitos temores em torno de uma eventual vitória de Le Pen, a presença de um candidato de centro como Macron no segundo turno indicava que as chances do triunfo de um radical de esquerda ou de direita para o Palácio do Eliseu seriam mínimas.

Joe Biden já havia indicado esse caminho nos Estados Unidos derrotando internamente o radical de esquerda Bernie Sanders e, em seguida, vencendo o populista de direita Donald Trump, nas eleições presidenciais de 2020. Agora, Macron reafirma que o melhor caminho para vencer o populismo passa necessariamente pelo fortalecimento do centro democrático que não se confunde com o oportunismo ou o vazio de ideias, mas que consiste na composição daquilo que Giddens, nos já distantes anos 1990, classificava como terceira via.

Esse fortalecimento, contudo, não pode ser lido como prepotência. Macron precisou de votos da esquerda – sobretudo aquela liderada por Melenchon – para vencer o segundo turno neste domingo e deve, nesse sentido, reconhecer a legitimidade desses votos para o desenho de políticas públicas em seu segundo mandato, inclusive aquelas voltadas ao fortalecimento do projeto europeu.

Da mesma forma, o presidente francês reeleito fez um discurso conciliador, impedindo as vaias a sua rival nas urnas, afirmando que é presidente também daqueles que não o (re)elegeram. Parece pouco, mas nos tempos de hoje, demonstra uma postura republicana quase que em extinção.

Le Pen, é bom que se diga, atingiu mais de 40% dos votos, indicando que os votos de nacionalistas mais radicalizados vieram para ficar e ainda poderão fazer muito barulho na política francesa e de outros países em que sua presença vem se fazendo sentir nos últimos anos. Contudo, é importante registrar que, com todos seus imensos problemas, Marine Le Pen não é Jair Bolsonaro e ligou rapidamente para cumprimentar Macron diante do anúncio da reeleição.

Enquanto isso, por aqui, Bolsonaro e seus seguidores continuam a desacreditar as urnas e atacar o Poder Judiciário. Já Lula e seus apoiadores continuam a insistir na tese do impeachment como “golpe”, levando alguns a crerem que o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal avalizaram uma medida fora da Constituição, ou seja, atacando veladamente o Legislativo e o Judiciário.

Será que o atual presidente brasileiro, em caso de derrota, cumprimentaria seu adversário? Será que o ex-presidente conciliaria os adversários e impediria vaias a seu rival? Um telefone de felicitações entre ambos, então, parece ser algo impensável nos dias que correm. Nesse sentido, a receita está dada: o caminho pelo meio é a forma mais efetiva de vencer os radicalismos de esquerda e de direita que assombram as democracias liberais atuais. Os Estados Unidos e a França já perceberam.

Ao vermos a terceira via inviabilizada por interesses pessoais e cooptações à esquerda e à direita, descobrimos que o Brasil ainda não se deu conta. Azar o nosso.

Leandro Consentino é bacharel em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo (USP), mestre e doutor em Ciência Política pela mesma instituição. Atualmente, é professor de graduação no Insper e de pós-graduação na FESP-SP.

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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