A 4ª Vara Cível de Votuporanga condenou um supermercado a indenizar por danos morais uma mulher negra que foi vítima de abordagem vexatória por segurança do estabelecimento. A reparação foi fixada em R$ 7 mil.
De acordo com os autos, a autora da ação aguardava seu pai no estacionamento do mercado quando foi interpelada pelo segurança. Ele afirmava que ela estaria pedindo esmola e exigia que se retirasse do local. A mulher tentou explicar que aguardava a carona, mas, diante da insistência do preposto, deixou o estacionamento e foi para a rua.
Em sua decisão, o juiz Sergio Martins Barbatto Júnior nota que não houve uma atitude da autora que tenha ensejado a abordagem — ou então o fato teria sido gravado pelas câmeras de segurança. “A atuação do preposto do mercado se deu como antecipação de um possível problema. Nesse sentido, a grande questão deste caso em concreto é: por que o funcionário teria desconfiado da autora?”, escreveu ele. “O juízo que o funcionário fez da requerente e que o leva a antecipar um problema inexistente, reflete, neste particular, um preconceito profundamente enraizado na sociedade brasileira, histórico, autofágico, construído da escravidão em diante”, ponderou.
O magistrado escreve que o funcionário não foi agressivo ou usou de violência, mas agiu “achando que estava fazendo o correto ao zelar pelos consumidores e clientes do local”. “O que sequer ele percebeu é que dava vazão a um preconceito social tão enraizado e esperado, tão reiterado, que tornou-o, uma pessoa que certamente seria vítima em outras situações, também em agressor”, completou o magistrado.
Sergio Martins Barbatto Júnior lembra que é dever do estabelecimento zelar pelos clientes, mas que, no caso em questão, a ação da segurança se inseriu no conceito de racismo estrutural, “que parte da compreensão de que o racismo seria elemento constituinte da política e da economia dos Estados, uma forma de discriminação sistemática, não se tratando de atos isolados mas de um fator estrutural que organiza as relações sociais, econômicas e políticas”.
“Trata-se de reconhecer-se, na estrutura do mercado, um específico viés que, em concreto, neste caso, pelas circunstâncias apuradas, reforça estereótipos e agrava uma diferenciação indevida. Toda abordagem deve ser feita com base em circunstâncias tais, objetivas, que não se vinculem a preconceitos e estereótipos sociais, de forma inclusive a quebra-los, a reverte-los. Neste caso em concreto, por ter sido a autora confundida com alguém pedindo esmolas, sem qualquer indício de que o fazia, e sem que tenha tomado qualquer atitude suspeita de importunação aos outros clientes a justificar a abordagem, tenho que é cabível dano moral”, concluiu o juiz.
Cabe recurso da decisão.
Fonte: TJ
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