Desafios da Franquia

Por Mariana Feijon

Em tempos de instabilidade econômica, consumir e aplicar dinheiro são atividades que se tornam mais planejadas. Se hoje o poder financeiro do brasileiro não está em seu melhor nível, seria de se esperar um menor desenvolvimento do mercado. Porém, o “franchising” é um mercado que tem se mostrado flexível e resistente, mantendo seu crescimento e faturamento mesmo durante a crise financeira que o Brasil vive.

Embora muitos perfis conservadores considerem perigoso investir em um negócio próprio no momento, as franquias surgem como alternativa mais acessível e segura de investimento e cada vez mais conquistam seu espaço no imaginário do empreendedor.

Dados da Associação Brasileira de Franchising (ABF) apontam que mesmo após uma pandemia crítica e um longo período de instabilidade no cenário financeiro do país, o “franchising” continua sendo uma opção segura para quem deseja empreender.

No entanto, se engana aquele que acredita que gerir uma unidade de franquia seja mais fácil do que administrar um negócio próprio. Para se ter sucesso, quando a decisão de empreender no “franchising” é tomada, os dois personagens principais (franqueador e franqueado), precisam assumir uma série de responsabilidades.

Inicialmente rememoramos o fato de que a nova Lei de Franquias (Lei 13.996/19), sancionada pela Presidência da República em dezembro de 2019, entrou em vigor em 26 de março de 2020, revogando as regras anteriores, válidas desde 1994, instituindo normas mais severas quando se trata da elaboração do principal documento que regerá a relação comercial entre as partes, a Circular de Oferta de Franquia – COF.

O artigo 3° da Lei traz as informações que, obrigatoriamente, deverão constar na COF. Invariavelmente, os franqueadores cumprem o referido dispositivo, trazendo o previsto em lei, e até mais um pouco. Não são raros também os avisos na COF de que o sistema de franquia empresarial não possui garantia de sucesso, e ao fazer o investimento, está o franqueado assumindo um risco.

Quando os negócios vão bem, são raros os desentendimentos entre as partes. No entanto, basta o franqueado não performar, ou mesmo encerrar suas atividades, para que a discussão acerca de quem é a responsabilidade pelo insucesso venha à tona.

Vale ressaltar que a Justiça tem admitido, em alguns casos, a responsabilidade do franqueador quando esse não presta a assistência a que se propôs, ou não transmite as informações necessárias para que o franqueado tome as suas decisões de investimento.

Desse modo, não basta uma COF cumprindo minimamente a lei, trazendo de forma superficial as informações ali determinadas. A COF deve ter amplitude e dar realmente o que o franqueado precisa para tomar a decisão.

Podemos pontuar, como exemplos de informações necessárias ao conhecimento do futuro franqueado, a ocultação de insucessos anteriores no mesmo local, a escolha de um ponto nitidamente desfavorável para aquele tipo de comércio, a elaboração de previsões irreais de faturamento, o erro na indicação do investimento necessário, dentre outros fatores.

Com o intuito de ilustrar a importância atribuída a tal documento, no mês de abril foi proferida uma decisão pela 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, nos autos nº 1008026-65.2018.8.26.0704, que reconheceu a culpa concorrente da franqueadora por dados irreais de projeções de faturamento. Com base nas provas, o Órgão Colegiado também determinou a não incidência de multas rescisórias, bem como a restituição da taxa de franquia referente ao período não efetivado do contrato firmado.

Para o relator do recurso, desembargador Cesar Ciampolini, as partes foram reciprocamente culpadas pelo sucedido. No caso da discrepância entre as projeções e a realidade de faturamento, ele destacou que “várias circunstâncias, diversas delas alheias à franqueadora, podem interferir na lucratividade do negócio”. No entanto, a requerida não apresentou documentos contábeis de outras unidades para comprovar a razoabilidade da rentabilidade indicada:

“Muito embora não se possa exigir grande precisão no valor indicado pela franqueadora como de provável faturamento, tratando-se de estimativa, no caso, a discrepância foi muito grande entre o faturamento real, de R$ 16 mil, e aquele que consta do plano de negócio, da ordem de R$ 95 mil”.

Diante deste cenário, podemos concluir que todos os atos de boa-fé ajudarão a elidir as responsabilidades em caso de insucesso discutido judicialmente. E o mais importante: quanto mais informações são trocadas, maiores as chances de sucesso do franqueado, objetivo maior de todas as partes envolvidas no contrato.

Embora o “franchising” seja um porto seguro para investidores iniciantes, ainda é preciso certo conhecimento sobre o mercado e finanças para que a administração da unidade se dê da melhor forma.

O bom relacionamento entre franqueador e franqueado é desenvolvido desde o início dessa relação profissional. Do processo seletivo, ao treinamento e instalação da unidade: é durante o processo que uma equipe unida é formada. O investidor, com seu interesse; o franqueador, com sua disposição, e contar com canais eficientes e honestos de comunicação, se mostra como o meio mais adequado para que o contato entre as partes seja fluido, possibilitando que o gestor de uma franquia exerça seu trabalho com mais facilidade.

Mariana Feijon é advogada no escritório Cláudio Zalaf Advogados Associados

Os artigos assinados representam a opinião do(a) autor(a) e não o pensamento do DJ, que pode deles discordar

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