A polêmica que envolve a atriz global Dani Calabresa contra o também ator e humorista Marcius Melhem, que foi superior dela, levantou a discussão sobre assédio sexual e moral nos ambientes de trabalho. O DJ conversou com a advogada trabalhista em Limeira e região, Yoko Taira. E, para começar, ela foi taxativa.
O assédio sexual é crime e está previsto no Código Penal (artigo 216-A), que diz: constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. § 2o A pena é aumentada em até um terço se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos.
Quais situações caracterizam o assédio sexual?
O que caracteriza esse tipo penal é a condição do agente causador (chefe em relação ao seu subordinado; professor em relação ao seu aluno; médico em relação ao seu estagiário; advogado em relação ao seu estagiário, etc. É o ‘estar’ em uma posição de superioridade (profissional/ social), sobre a vítima, assediada.
Quais situações caracterizam o assédio moral?
O assédio sexual sempre existiu e, infelizmente, por muito tempo e até hoje, muitos assediadores e assediados ainda encaram isso com “normalidade”. O que ocorre é que contemporaneamente, com todos esses movimentos feministas, pró humanização dos seres humanos e sobretudo com a facilidade de acesso à mídia, a divulgação do assédio sexual toma proporções inimagináveis, fazendo com o que os assediadores sejam “mais discretos”, e os assediados mais esclarecidos sobre seus direitos, inclusive direito em dizer ‘não’ e principalmente de ‘denunciar’.
Nas relações de trabalho/emprego, quando se comprova a prática do assédio sexual, além da penalização criminal (processo crime, prisão, nome registrado nos sites dos Tribunais), também há o dever de indenização pecuniária pelo dano moral sofrido em razão do assédio sexual.
Onde fica o limite entre a mera brincadeira entre colegas de trabalho e o assédio sexual?
Esse limite é muito tênue, perigoso e subjetivo, pois o que pode ser encarado por uma pessoa (o assediado), como mera brincadeira, pode constranger outra pessoa. Cada um de nós viemos de lares, criações, educações, e crenças completamente diferentes. Em razão disso, o correto é manter um ambiente leve, alegre, mas sem qualquer brincadeira de cunho sexual, intimidatório.
Uma simples brincadeira muitas vezes verdadeiramente inocente, sem maldade, pode trazer um problemão para uma empresa, por exemplo.
Quais situações que caracterizam o assédio sexual?
Resposta está no caput do artigo 216-A do CP (Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função). A grosso modo: toda e qualquer atitude, gesto, fala, que possa demonstrar interesse num ‘relacionar-se sexualmente’.
Quais situações caracterizam o assédio moral?
Primeiramente, temos que o assédio moral pode acontecer em quaisquer relações, e não apenas na relação capital x trabalho x emprego. Nas relações de emprego, ele ocorre de várias maneiras, podendo ser praticado por vários agentes.
Exemplo de assediadores: o proprietário da empresa; o chefe, superior hierárquico, colega de trabalho. Essas pessoas físicas são, em termos jurídicos, prepostos da empresa (pessoa jurídica), e essa pessoa jurídica responde pelos atos praticados pelas pessoas físicas.
Assédios praticados: expor o assediado a situações humilhantes, degradantes, constrangedoras, xingamentos, repetitivamente.
Quais devem ser as primeiras atitudes do trabalhador que se ver nesta situação?
Comunicar imediatamente o superior hierárquico do assediador e, se possível, com alguma prova (mensagens de celulares, e-mail).
Se o assediador ocupar o maior cargo hierárquico, comunicar alguma outra pessoa equiparada, a assistente social, responsável pelo RH, ao seu sindicato. E se nada resolver, propositura de uma ação judicial mesmo.
Em juízo e em regra, ‘aquele que alega é o detentor do ônus da prova’ (tem que provar o que está alegando). O assediador sexual, normalmente, age longe da presença de testemunhas e, por essa razão, que a jurisprudência/ doutrina contemporâneas têm admitido indícios de provas (Exemplo: a testemunha tem conhecimento de que, toda vez que a vítima vai até o estoque, o chefe vai atrás dela); gravações; mensagens; e-mails; etc.
Acredita que muitos casos deixam de ser relatados por medo de perder o emprego? E, diante disso, quais garantias a legislação brasileira dá ao trabalhador que tomar providências?
Sem dúvida alguma, a maioria dos casos deixa de ser relatada por medo da perda do emprego, e não só por isso, mas porque, infelizmente, ainda por medo, vergonha de que o marido, o pai, o namorado, a esposa, os colegas de trabalho, a vizinha possam achar que o assediado “deu motivo”, “deu liberdade”, “deu bola”. E isso, infelizmente, é muito comum.
Infelizmente, a cultura brasileira, machista que é, antes de julgar o assediador, julga o assediado, e infelizmente ainda mais se esse assediado for do sexo feminino e estiver ‘dentro dos padrões de beleza impostos pela fragilidade cultural em que vivemos’.
A legislação brasileira, sobretudo a jurisprudência brasileira atual, tem amparado, e muito, os empregados nestas situações. Quando o juízo se convence de que realmente o crime foi praticado (assédio moral e/ou assédio sexual), nós temos direito à rescisão indireta do contrato de trabalho; indenizações por danos morais e materiais; indenização pela perda de uma chance, dentre outras.
Na sua experiência como advogada trabalhista, são comuns estas situações?
Eu, efetivamente, ajuizei três ações trabalhistas por assédio sexual e, corriqueiramente, ajuízo ações por assédio moral. Mas também temos situações em que fazemos reuniões com as empresas, por onde conseguimos resolver a situação, sem a necessidade de propositura de ações judiciais.
As ações de assédio moral, infelizmente, são corriqueiras na Justiça do Trabalho porque, como vemos diariamente nas mídias (e ainda bem que tudo isso tem sido muito divulgado), não raras são as vezes em que, no ambiente de trabalho, empregados são constrangidos, xingados, humilhados, menosprezados. Já as ações por assédio sexual, embora tenha aumentado consideravelmente, ainda são um número muito pequeno se comparado às efetivas práticas desse tipo de assédio. É que se o assédio sexual constrange para muitos assediados, o ‘ir em busca de seus direitos’ constrange muito mais. Além de, infelizmente, ser julgado pela sociedade, o próprio assediado se culpa, se questiona ‘o que foi que eu fiz para isso acontecer?’.
Quais suas orientações aos trabalhadores?
Que denunciem! Parece fácil estar de fora e dizer ‘denunciem’, quando temos mais de 13 milhões de brasileiros implorando por um emprego. Porém, é só denunciando que estes criminosos se verão enfraquecidos e pensarão 2 ou 3 vezes antes de praticar o crime, porque também correrão o risco de perderem seus empregos, suas famílias, além do processo criminal.
E aqui quero deixar uma coisa muito clara: numa situação trabalhista de assédio moral ou sexual, por mais difícil que possa ser para a vítima, quem mais perde será o criminoso, o assediador.
E como acredita que as empresas podem tomar cautelas no sentido de proteger suas trabalhadoras?
Trabalhadoras e trabalhadores também, porque embora seja mais comum a vítima do assédio sexual ser do sexo feminino, não tem sido incomum termos vítimas do sexo masculino também.
Eu acredito que a melhor maneira da empresa se resguardar é pela via da comunicação, da educação no ambiente de trabalho, de forma clara, franca, leve e firme ao mesmo tempo. Explicar abertamente (palestras, panfletos), qualificar seus profissionais que ocupam cargos com subordinados, inclusive. Exigir posturas respeitosas, educadas e firmes. E punir quando houver excessos. Manter um canal aberto entre os empregados e uma profissional de assistência social, psicóloga, por exemplo. Estimular as denúncias, oferendo confiança e confiabilidade para quem for denunciar.
Foto: Arquivo Pessoal
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